Por: Antonio Jorge Soares
Há uma tendência generalizada de confundir o jumento com o burro. O burro é um animal produto do cruzamento do jumento com a égua ou de um cavalo com uma jumenta. Por ser oriundo de duas espécies, o burro é estéril. Mas burro é também o sujeito que só dá mancada. É o menino que não consegue aprender.
Mas aprender o quê e por quê? O aprender do burro é correr nos campos ou nas pradarias; é se deslocar em buscar de bons pastos ou de boas fontes de água; é ficar forte e andar em grupos para fugir dos predadores ou dificultar a ação aterradora destes.
Não é isto, porém, o que os humanos tentam ensinar ao burro. Pelo contrário, tentam pôr o burro para executar tarefas que os próprios humanos inventaram para martírio deles mesmos. Aliás, se lembrarmos a origem da palavra “trabalho”, iremos compreender isto. Com efeito, “trabalho” significa “martírio”, “tortura”, “ação ou lugar de suplícios e de perversidade”, tanto quando se defende que vem do latim “tripaliare”, torturar com o “tripalium”, aparelho de três paus usado para ferrar animais; quando se defende que vem de “trabaculum”, ação de usar travas (trabs) para ferrar animais.
Ora, quem é submetido a este tipo de coisa cria um grande ódio dentro de si e, na primeira oportunidade, vai à forra. A resposta à forra costuma vir em forma de sovas. Sovas desmedidas, porquanto aplicadas com ódio. Às vezes até criminosas.
Resta ao escravo, então, fingir que trabalha. Mas o fingir tem duração curta. Logo toma lugar a revolta. Esta é interpretada como indícios de burrice, porque novas sovas advirão. Mas será mesmo burrice? Será burro aquele que não se dobra a aprender aquilo que não deve ser aprendido porquanto nada dizer a respeito de sua própria vida? Será sábio, em contrapartida, aquele que se submete a aprender o que não é útil à vida como fazem os humanos, notadamente os jovens que vivem de modismos e de consumismos estereotipados?
Parece que há uma sabedoria na teimosia do burro que o humano tende a não admitir. É que o burro, diferentemente do cão, não se submete ao humano. Não o vê, tal como o faz o cão, como alguém que lhe é superior, mas como alguém que está no mesmo nível que ele e, nesta condição, não tem o direito de escravizá-lo. Talvez seja por isto que o burro se revolta, apanha, mas se nega a aprender. É porque este aprender está carregado de opressão e de injustiça.
(*) Graduado em Filosofia,
Especialização em Lógica, Filosofia e Metodologia da Ciência, Mestrado e
Doutorado em Filosofia da Educação. Professor da UFERSA
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