Por Rangel Alves da Costa*
Nenhuma ação
humana se exaure em si mesma. Tudo, mesmo sem causa ou justificação, possui
consequências. Por isso é preciso muito cuidado em cada passo, em cada ação,
vez que a mais simples das atitudes pode provocar conseq inusitadas.
A flor é bela,
atraente, perfumada, mas o jardim tem dono. Ir além de apreciá-la pode não ser
a melhor atitude. Não apenas pela planta e o jardim que perdem aquela presença,
mas também pelo dono do jardim que vai sentir sua ausência. E assim também
acontece quando ultrapassam o seu muro para dar fim às pequenas flores
cotidianas que você tanta luta para manter.
A resposta
precisa ser dada e não pode ser diferente. O não tem de ser não, o sim tem de
ser sim, sem meio-termos. Contudo, diferentemente da resposta positiva, que
geralmente causa alegria e satisfação, a resposta negativa pode ir muito além
da mera tomada de posicionamento. Ouvir um não pode ser algo tão desagradável
quanto a rejeição do próprio ser. Por isso cuidado ao ter de dizer não. Existem
muitas outras maneiras de negar sem que a palavra seja tida como um punhal
afiado na pele.
Cuidado, não
alimente em si nem perante os outros nada além daquilo que sempre pode provar
que possui. Não adianta o enfeite momentâneo se o adorno será inexistente em
outras situações. Não adianta manter aparências se a realidade se mostra
totalmente diferente. Não adianta pretender ser além do que realmente é, e sob
pena de sempre ser menos do que gostaria de ser. Não adianta oferecer mares,
paraísos e horizontes e se a realidade é terrena e não há asas para fingir que
está voando. Cuidado, muito cuidado.
A não ser por
esforço próprio, pelo suor derramado e pela luta de todo dia, nada será
conquistado de forma fácil nem chegará como que por encanto ou milagre. Tudo é
fruto da busca e do sacrifício, do dar tudo de si para garantir ao menos o
mínimo de sobrevivência. Por isso muito cuidado com as facilidades
inexplicavelmente surgidas e com as graciosidades oferecidas. Nada
simplesmente cai do céu ou surge como dádiva da terra sem que seja com uma
contrapartida embutida, ainda que invisível. E tudo faz compreender que somente
aquilo conquistado pelo próprio ser vem com a garantia de que lhe foi justo
receber.
Confiar em
que, em quem, e até onde? O próprio ser humano está propenso a ser traído pelas
próprias atitudes. Não raro que as promessas íntimas são quebradas pela própria
fragilidade do ser. Por mais que o indivíduo se comprometa a não errar, a não
reincidir numa atitude tomada ou jamais fazer aquilo que no outro é tão
deplorável, ainda assim estará fadado a ser seu próprio algoz. E assim porque
ao homem é difícil demais ponderar cautelosamente entre o erro e o acerto
diante de determinadas situações. Daí ser inevitável o erro humano, mas também
um meio eficaz para experimentar daquilo que não deveria e assim aprender a não
repetir.
A roupa
estendida no varal não demora muito para receber a primeira bolada da meninada
que brinca no descampado ao redor. Não há como evitar que as mangas mais
bonitas do vistoso pomar do quintal tenham sumido ao amanhecer. Não há como
impedir que a criançada tenha seus momentos de diversão, de soltar pipas,
correr pelos campos, jogar bola, passar correndo em cavalo de pau. Cada idade
possui seu sentido e sua razão de ser. Compreender que criança chuta bola no
varal, que leva a fruta do quintal e gosta mesmo de brincar, apresenta-se como
igual compreensão que o adulto possui práticas próprias e não gosta de estas
serem vistas como infundadas ou desregradas.
Por isso
cuidado, tenha muito cuidado. O louco é visto como tal porque é portador de uma
enfermidade mental, e não porque age contrariamente ao que é tido por normalidade
entre os que se imaginam sãos. A pedra dura, silenciosa e inerte, nem sempre
transparece assim para muitos. E, não raro, tardes inteiras são passadas no
convívio amigável e no diálogo fortalecedor com a pedra. Eis que as pedras
ouvem e também falam. Não duvide dessa certeza. Dizem que os botões também são
do mesmo jeito, duros e insensíveis, mas os momentos mais interessantes da vida
são vivenciados conversando com eles.
Por isso
cuidado. Cuidado com o que pensa, com o que vê, com o que faz. Cuidado com
tudo, pois tudo pode ser de forma muito diferente do que se imagina como
verdade única.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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