"Um dia, Antônio Silvino, vendo sua fama
declinar, queixou-se enciumado: ”De uns
tempos desses para cá, só se quer saber de cangaceiro-doutor!” Referia-se ao
Dr. Augusto de Santa Cruz Oliveira, graduado pela Faculdade de Direito do
Recife, em 1895. Moço, esquentado e imbuído dos ideais libertários da Casa de
Tobias, foi nomeado promotor público em Alagoa do Monteiro, sua terra natal.
Naquele tempo, existia a politicagem togada. Juízes e promotores podiam
envolver-se em política e até disputar eleições majoritárias. Numa dessas
disputas calorosas, Augusto se indispõe com seu opositor, juiz José Neves, de
quem descende a clã dos Neves, que até hoje mantém tradição de honradez e
dignidade na vida privada e no mundo jurídico do Recife.
Augusto não demora também a discordar da oligarquia que dominava a Paraíba do Norte, rompendo com o presidente da província, João Lopes Machado. Sentindo-se com suas prerrogativas políticas abolidas e com o direito de defesa cerceado, recruta 120 cabras dos porões do cangaço e, no dia 6 de maio de 1911, invade a cidade de Monteiro, quebra a cadeia pública, solta um protegido seu e os demais presos que se incorporam ao grupo armado. Em seguida, encarcera o destacamento de polícia local, pego de surpresa ainda dormindo, numa madrugada-manhã invernosa e fria.
Depois, os revoltosos avançam contra a cidade, vencem a resistência armada que lhe fizeram as autoridades auxiliadas por alguns cidadãos desafetos do chefe. No final da tarde, a cidade resta dominada e presos o prefeito Pedro Bezerra, o promotor público José Inojosa Varejão, capitão Albino, major Basílio e capitão Victor Antunes, pai do ilustre professor internacionalista da Faculdade de Direito do Recife, Mário Pessoa. No tiroteio, morreram algumas pessoas e, em pavorosa, a população da cidade evade-se, deixando suas casas comerciais e residências abandonadas. Sem condições de resgatar os reféns, o governador João Machado pede ajuda ao governador de Pernambuco, Herculano Bandeira.
Corria o ano
de 1911 e confrontavam-se em acirrada disputa pelo governo de Pernambuco, o
prestigiado político, comendador Rosa e Silva, e o general Dantas Barreto,
herói da Guerra do Paraguai. Em sua mocidade, antes de ir para a guerra, Dantas
Barreto havia morado em Monteiro, onde exercia a profissão de relojoeiro e fez
amizade com a família Santa Cruz. Por esta razão, o general resolve dar apoio
ao bacharel revoltoso. Temendo que durante a disputa política Dantas Barreto
pudesse se socorrer do braço armado das hostes guerreiras do paraibano
rebelado, o governador de Pernambuco, que era rosista, autorizou um batalhão de
240 praças e 10 oficiais, sob o comando do Major Alfredo Duarte, invadir a
Paraíba, munidos de 40 mil cartuchos mauser para guerrear o
bacharel-cangaceiro, como o chamavam seus inimigos.
Ao contingente
de Pernambuco, somaram-se 120 homens da polícia paraibana. No dia 27 de maio de
1911, um século atrás, atacam a Fazenda Areal, onde o bacharel estava
aquartelado e mantinha os reféns prisioneiros. O combate dura uma manhã
inteira. Não conseguindo resistir, Dr. Augusto bate em retirada e vai se
refugiar no Juazeiro, levando consigo os prisioneiros. Ao longo da fatigante
trajetória de muitos dias, vai libertando os reféns um por um, pois não ficaria
bem chegar com prisioneiros no reduto sagrado. Na condição de perseguido
político, entra no Juazeiro e é recebido pelo padre Cícero que o acolhe,
desarma seus homens e arranja-lhes trabalho digno. Naquele mês de junho, o
Juazeiro estava em pé de guerra com o Crato, lutando por sua independência e o
padre precisava mostrar-se forte.
O patriarca
tenta pacificar a Paraíba e não consegue. O conflito se estende até o ano
seguinte e é chamado Guerra de 12. Frustrada em seu intento de resgatar os
reféns, antes de deixar o palco da luta, a polícia destrói e queima a fazenda
Areal e mais algumas propriedades de familiares do bacharel Santa Cruz.Em 1912,
o Dr. Augusto retorna à Paraíba e se junta com o médico-fazendeiro Franklin
Dantas, pai de João Dantas. Igualmente insatisfeitos com o desprestígio
político que suas famílias estavam sofrendo, os dois doutores formam um
exército de 500 homens e saem invadindo as principais cidades do sertão
paraibano, com o propósito de depor o governador João Machado. Não conseguindo
o intento desejado, Augusto refugia-se em Pernambuco, sob a proteção de Dantas
Barreto que havia assumido o governo do Estado. Alguns anos depois, é nomeado
Juiz de |Direito de Afogados da Ingazeira. Correto, exemplar e temido por sua
história de vida, fez justiça e impôs respeito nas comarcas por onde passou.
Morreu na comarca de Limoeiro em 1944. Esse fato histórico está minuciosamente
descrito no livro Gurreiro Togado, do autor desta coluna.
NOTA CARIRI
CANGAÇO: Pedro Nunes Filho e Augusto de Santa Cruz no Cariri Cangaço ? Com a
palavra, o autor de Guerreiro Togado: " Sem nem saber onde será o Cariri
Cangaço , aceito o convite que você formulou, pedindo que me avise a data do
evento com certa antecedência. Forte abraço, Pedro Nunes." Então já
começamos a contagem regressiva...
Manoel Severo Barbosa
www.cariricangaco.com
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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