Por: Rangel Alves
da Costa(*)
Depois do
marco histórico do dia 20/06, quando mais de 30 mil pessoas tomaram as ruas e
avenidas de Aracaju para mostrar suas indignações contra o aumento da tarifa do
transporte e outras pautas populares, novamente o povo se reuniu na capital
sergipana. E dessa vez para deixar bem claro que não vai mais tolerar calado os
descalabros das administrações em todas suas esferas.
Tendo como
mote principal a revogação da tarifa de ônibus, o que se viu foi uma avalanche
de reivindicações, provando o descontentamento do povo com a ineficácia dos
serviços públicos e a omissão deliberada dos governantes e seus agentes. As
faixas e cartazes deixavam induvidosas as cobranças da população.
Como já era
esperado, a classe política em geral se transformou em alvo preferencial da
repulsa das ruas. Os médicos também se fizeram presentes em protesto contra as
medidas de importação de profissionais anunciadas emergencialmente pelo governo
federal. Outras classes profissionais e estudantes de cursos específicos
igualmente apresentaram suas reivindicações.
Contudo, o
número de manifestantes foi bem inferior ao avistado no primeiro ato. Em nenhum
momento a Praça Fausto Cardoso, local da concentração, foi tomada pelos
revoltosos. Um grupo maior circundou o coreto, onde permaneceu tocando
instrumentos, gritando palavras de ordem e entoando motes de protesto, tendo
outras pequenas aglomerações espalhadas pelos arredores. Bem diferente da
multidão compacta do último dia 20.
Diante do
ocorrido no primeiro ato, quando os manifestantes rejeitaram a presença de
bandeiras partidárias e de centrais sindicais, dessa vez estes grupos decidiram
não participar. Daí não haver qualquer carro de som nem discursos inflamados.
Talvez por isso que a multidão de hoje estava mais silenciosa, mais arredia e
menos encorajada. Já não havia aquelas feições predispostas, aqueles olhares
efervescentes, aqueles gestos de descontentamento.
Por volta das
cinco horas a caminhada teve início. Mas sem a organização devida, as pessoas
não seguiam conjuntamente. Enquanto um grupo seguia na frente, muitas outras
pessoas ainda continuavam pela praça. E assim prosseguiu, com alguns vazios,
até a esquina da Av. Barão de Maruim. Neste momento, os manifestantes da
dianteira tiveram de parar para esperar que as pessoas se pusessem em caminhada
num só bloco.
Após isso, e
já pela Barão de Maruim, então a multidão começou realmente a mostrar sua
força, tomando completamente as duas pistas e calçadas, numa extensão que
talvez chegasse a cinco quarteirões num só passo. Batucadas, palavras de ordem,
cantorias, tudo isso efervescendo a caminhada sempre aplaudida pelos moradores
dos edifícios ao redor.
Profissionais
saíam de seus escritórios para aplaudir a manifestação, dos edifícios surgiam
gestos de apoio, nos veículos parados o contentamento dos motoristas e
passageiros. E assim a multidão, mesmo menos numerosa que a anterior, foi
mostrando sua força e sua capacidade de união diante dos males que tanto
corroem Sergipe e o Brasil.
Novamente
helicópteros vigiaram do alto. Policiais novamente estavam infiltrados em meio
à multidão, mas certamente não conseguiram avistar uma só ação de vandalismo,
depredação ou exaltação mais exacerbada. Mas só até a multidão chegar ao Centro
Administrativo Municipal.
Ao chegar ao
local programado para a finalização do ato, um grupo mais exaltado logo
procurou macular a imagem da multidão pacífica e ordeira. Verdadeiros vândalos
começaram a depredar o patrimônio público e ameaçar invadir a sede do governo
municipal. E em casos tais é preciso o uso da força para inibir a ação daqueles
que traíram a legitimidade da ação da grande maioria. E o povo não marchou com
essa bárbara finalidade.
É por essas e
outras que o encanto, repentinamente, se torna em desencanto. E, em decorrência
de tais atos, dificilmente haverá outra manifestação vitoriosa pelas ruas da
capital. Pena que tenha acontecido assim. Mas eis as feras escondidas nos
labirintos da multidão.
(*)
Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco,
no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado
inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei
também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a
concluir. Sou autor dos seguintes livros: romances em "Ilha das
Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em
"Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes";
contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e
outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia
Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel -
prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no
Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio
do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do
autor: Av. Carlos Burlamaqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.
Poeta
e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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você gosta de ler histórias sobre "Cangaço" clique no link abaixo:
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