O fotógrafo e
mascate libanês Benjamin Abrahão Botto teria passado à história como amigo,
secretário e confidente do mítico Padre Cícero Romão Batista (1844-1934), o
Padim Ciço da devoção popular nordestina, se não tivesse investido numa
aventura que por muito pouco lhe custou a vida na década de 1930: enquanto
mascateava e prestava serviços itinerantes como fotógrafo lambe-lambe, Benjamin
Abrahão foi criando coragem para ir ao encontro do lendário Virgulino Ferreira
da Silva (1898-1938), vulgo Lampião, líder do bando de cangaceiros que
espalhava o terror pelo sertão.
A aventura do
mascate acabou rendendo as únicas imagens registradas em filme e fotografias de
Lampião e seu bando. Mas os objetivos de Abrahão, ao que se sabe, não eram dos
mais nobres: a intenção era infiltrar-se entre os cangaceiros para fazer as
imagens e angariar fortuna com a venda do filme e das fotografias para jornais
e revistas do Brasil e de outros países.
O desfecho da aventura foi um golpe da sorte e do acaso, já que a intimidade com Padim Ciço serviu para salvar a vida do mascate no primeiro encontro com o bando de foras-da-lei. Abrahão sobreviveu à fúria do bando graças à sua iniciativa de caso pensado de invocar o nome do religioso: ele sabia que Lampião era devoto do padre e temeroso respeitador de suas crenças e conselhos.
O encontro
de Benjamin Abrahão com o bando do capitão Virgulino Lampião em
1936, em foto tirada pelo cangaceiro Juriti. Da esquerda para a direita: Vila
Nova, não identificado, Luís Pedro, Benjamin Abrahão (à frente), Amoroso,
Lampião, Cacheado (ao fundo), Maria Bonita, não identificado, Quinta-Feira
Em Juazeiro do
Norte, Abrahão havia presenciado o único encontro entre Lampião e Padre Cícero
em 1926, ano em que a Coluna Prestes, liderada pelo militar e político Luis
Carlos Prestes (1898-1990), percorria o interior do Brasil desafiando o Governo
Federal. Na intenção de combater as tropas de Prestes, que seguiam se
embrenhando pelos confins do sertão, Padre Cícero e outros líderes regionais
convocaram a ajuda das forças de Lampião e seu bando, com a promessa de que em
troca todos receberiam anistia por seus crimes e o líder do grupo teria uma
patente de capitão.
A versão mais
conhecida da história aponta que o bando de Virgulino deixou Juazeiro do Norte
sem nunca ter enfrentado a Coluna Prestes. O mascate, na época secretário de
Padre Cícero, fez uma única foto do religioso ao lado do chefe dos cangaceiros
e, desde então, passou a acalentar os planos da ambição de filmar e fotografar Lampião
e seu bando para, de posse das imagens, fazer fama e fortuna.
Comerciante de tecidos, perfumes, bugigangas e miudezas, Abrahão nasceu no Líbano, território na época dominado pelo Império Otomano, em 1890, e havia aportado no Brasil em 1915. Sem dinheiro e sem rumo, primeiro decidiu tentar a sorte em Recife, depois seguiu para Juazeiro, atraído pela oportunidade de ganhar a vida no comércio resultante da frequência dos romeiros que buscavam Padre Cícero.
Comerciante de tecidos, perfumes, bugigangas e miudezas, Abrahão nasceu no Líbano, território na época dominado pelo Império Otomano, em 1890, e havia aportado no Brasil em 1915. Sem dinheiro e sem rumo, primeiro decidiu tentar a sorte em Recife, depois seguiu para Juazeiro, atraído pela oportunidade de ganhar a vida no comércio resultante da frequência dos romeiros que buscavam Padre Cícero.
Padre
Cícero aos 80 anos, em 1924, em foto atribuída a Benjamin Abrahão;
abaixo, Lampião retratado pelo mascate na caatinga, seguido
por Maria Bonita e Dadá
Letrado e
hábil negociante, Abrahão terminou por conseguir, em Juazeiro do Norte, o posto
de secretário de Padre Cícero. Exerceu a função por 10 anos consecutivos.
Depois, com a morte do líder religioso, em 1934, Abrahão partiu para uma
empreitada sem rumo pelo sertão, na tentativa de encontrar o bando. Quando
conseguiu chegar ao acampamento onde estavam os cangaceiros, foi salvo pela fé
em Padre Cícero. Clamando para não ser morto, apelou para a devoção pelo
religioso e conseguiu: teve a vida poupada e recebeu pousada no grupo.
Lampião, vaidoso, ainda permitiu que o mascate registrasse as imagens que imortalizaram
o bando de cangaceiros nas estampas de jornais e revistas durante o Estado
Novo. As fotografias foram disputadas pela imprensa da época e mobilizaram o
público nas principais capitais, enquanto o filme de Abrahão atiçava a
curiosidade popular e chegou a ser exibido em Fortaleza. Mas em maio de 1938 o
mascate acabou assassinado a facadas – um crime nunca esclarecido – e o filme
foi apreendido a mando do presidente Getúlio Vargas.
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