Por Manoel Severo
O Cariri
Cangaço é o resultado de um grande sonho. Em março de 2009 quando retornava da
primeira edição do Seminário de Maria Bonita em Paulo Afonso aflorou em minha
cabeça a ideia de tentar realizar em nosso estado do Ceará, mais precisamente
na região do Cariri, um seminário onde pudéssemos resgatar um pouco da
historiografia cangaceira na região, tão pouco conhecida pela grande maioria
das pessoas. Num primeiro momento ouvia muitas indagações e provocações:
"Cangaço no cariri? ...Está ficando louco? ...Como realizar um negócio
desses aqui, sem nenhuma tradição com o tema? ...Evento para endeusar
bandido?" ... Foi aí que alguns ingredientes acabaram se somando e o sonho
acabou se tornando realidade: Determinação, perseverança, dedicação e amigos;
muitos amigos, inúmeros amigos, de todos os lados e lugares, alguns antigos e
outros novos, todos juntos começaram a acreditar que poderíamos fazer...e
fizemos.
Mas não
poderíamos continuar nossa conversa sem fazer o devido e responsável
esclarecimento; explico: Apesar do fascínio que o cangaço exerce até hoje, o
Cariri Cangaço , não nasceu com o sentimento de fazer apologia ao Cangaço,
cangaceiros, violência, enfim; não "mitifica" e nem procura elementos
para "endeusar" Virgulino Lampião nem nenhum outro personagem dessa
saga sertaneja tão penosa e cheia de dor. O verdadeiro sentimento que moveu a
todos nós foi o de proporcionar um ambiente ainda mais propício para o debate e
aprofundamento dessa temática que é tão marcante em nossa terra e em nossa
gente. O incrível acontece; Lampião e o Cangaço que tanto sofrimento trouxe
para o ordeiro povo do sertão, hoje promove o encontro, a união e a harmonia na
direção da busca da verdade histórica.
Nada se constrói
sozinho! Poucos do universo da pesquisa e estudo do cangaço nos conheciam; foi
um "tiro no escuro" convidar os muitos confrades para virem ao cariri
ver o que estávamos querendo fazer. A SBEC - Sociedade Brasileira de Estudos do
Cangaço, foi de fundamental importância quando resolveu abraçar o evento
através de todas as suas diretorias; Paulo Gastão, Kydelmir Dantas, Ângelo
Osmiro, Napoleão Tavares Neves, Leandro Cardoso, Lemuel Rodrigues, Aderbal
Nogueira, João de Sousa Lima, Honório de Medeiros, Professor Pereira e tantos
outros, foram fundamentais na consolidação desse primeiro momento.
Criamos um
Empresa para realizar o evento, a Cariri do Brasil; que mais recentemente se
tornou o Instituto Cariri do Brasil e a esse instituto se somaram entidades e
academias culturais, organizações não governamentais, entes de promoção
cultural, imprensa e formadores de opinião; a semente estava plantada e no
trabalho de formiguinha tivemos três meses para regá-la e ver os frutos
nascerem. Ali contávamos com o apoio de quatro municípios: Crato, Juazeiro do
Norte, Barbalha e Missão Velha.
De início
tínhamos o desafio de estabelecer o formato do evento, a data, os
conferencistas, tudo por tudo. Minha primeira preocupação foi fortalecer o
conceito verdadeiro do evento. Era nosso desejo criar um Seminário, mesmo
pequeno, onde pudéssemos de forma responsável, lucida e competente, trazer para
nossos convidados e anfitriões, o resgate deste recorte da história do cangaço
que poucos conheciam. O cariri cearense era sim um cenário privilegiado do
cangaço, notadamente de Virgulino Ferreira. Como desconhecer a ação e episódios
como a visita de Lampião a Juazeiro em 1926, a patente de capitão, sua suposta
ligação com Padre Cícero; o fogo da Piçarra, a morte de Sabino, a amizade com
Seu Tôim da Piçarra; como esquecer os marcantes momentos de Lampião em Aurora,
Izaias Arruda, traição, fogo; e personagens como Major Zé Inácio, Sinhô
Pereira, Chico Chicote, Irmãos Marcelinos, Coronel Santana, enfim. O cariri
tinha sim, muito a contar e ser contado.
O Cariri
Cangaço nasceu com esse sentimento; lúcido e responsável; em trazer para o sul
do Ceará esse fórum qualificado que pudesse de forma clara; não fazendo
apologia ao banditismos ou endeusando cangaceiros; num primeiro momento
discutir esse fenômeno tão rico e intrigante que foi o cangaço, e que se
tornasse uma ambiente plural e cheio de capilaridade para também discutir
outras temáticas ligados ao nosso nordeste, às nossas raízes, à nossa
história... e memória, e aí vamos encontrar o cordel, a música, a estética, os
beatos, o messianismo, os coronéis, a culinária, a medicina, enfim. E na noite
de 22 de setembro de 2009, estávamos realizando a abertura do 1º Cariri
Cangaço, na cidade de Crato. Com mais de 70 pesquisadores convidados e um
público de 376 pessoas, 19 conferências e debates e 22 visitas técnicas, em
seus seis dias de realização reunimos mais de 1.500 pessoas no total, começava
ali uma grande caminhada. Assim nasceu o Cariri Cangaço, um evento construído
para todos aqueles que acreditam que nosso futuro tem estreitas ligações com
nosso passado, nossas tradições e nossa história...
Estamos às
vésperas de comemorar seis anos de existência, rompemos as barreiras do Ceará e
o Cariri Cangaço se consolida como o mais respeitado e qualificado fórum sobre
a temática; presente em 5 estados da federação: Ceará, Paraíba, Pernambuco,
Alagoas e Sergipe, já realizou 83 Conferências, reuniu mais de 500
pesquisadores e mais de 13 mil pessoas em todas as suas edições; possui 16
sedes oficiais: Crato, Juazeiro do Norte, Barbalha, Missão Velha, Aurora,
Porteiras, Barro, Lavras da Mangabeira; no Ceará, Piranhas em Alagoas; Poço
Redondo em Sergipe; Sousa, Nazarezinho, Lastro, Princesa Isabel, São José de
Princesa em Pernambuco; e Floresta em Pernambuco; configurando-se numa das mais
autenticas Festas da Alma Verdadeiramente Nordestina.
Manoel Severo
Curador do
Cariri Cangaço
http://cariricangaco.blogspot.com.br/
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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