(*) José
Romero Araújo Cardoso
Indubitavelmente
há nítida ênfase em minha subjetividade à topofilia definida pelo geógrafo
Yi-Fu-Tuan quando lembro de assuntos pertinentes ao despertar de identidade com
a geografia humana do município norte-riograndense de Governador Dix-sept
Rosado.
A fixação em
minha memória da preparação dos plantios de alho e cebola às margens do rio
Apodi-Mossoró, onde João Cruz possuía propriedade encravada entre as
supracitadas glebas rurais, é imagem contida em minhas reminiscências de
infância que o tempo não apaga.
O alho teve
importância econômica de destaque em Governador Dix-sept Rosado. Quando das
colheitas, as estruturas do espaço urbano do município transformavam-se
literalmente em locais de exposição de um dos principais produtos cultivados no
lugar. Milhares de tranças de alho e cebola ficavam expostas aguardando
compradores que não tardavam em aparecer.
A Festa do
Alho era bastante concorrida, culminando na coroação de uma rainha. Certamente
nos dias de hoje apenas os mais velhos guardam as recordações de uma época
marcada pelos festejos que assinalavam boas colheitas que resultavam em
interessante poder aquisitivo para àquelas pessoas que se dedicavam ao
artesanal feitio dos terraços com a areia do escoamento fluvial, destinados ao
plantio de alho e cebola, o qual muitas vezes era consorciado com o cultivo de
batata-doce.
O velho trem
que foi sonho de Ulrick Graf transportava alho e cebola para todos os recantos
onde passava a linha férrea. A qualidade dos produtos fazia com que fossem
disputados por exigentes consumidores espalhados pelo país.
Não alcancei o
pleno funcionamento da extração de gipsita nas vossorocas da Espadilha ou
pedreira, como era mais conhecida a região que abrigou a maior mina de gesso da
América Latina, mas guardei na memória as histórias que Severino Cruz Cardoso
me contava sobre o cotidiano da área de extrativismo onde a maioria das pessoas
que lá residiam tratavam-se carinhosamente por primos, tendo em vista a origem
comum destas através de vínculo genealógico com o português Jerônimo Ribeiro
Rosado.
Nessa época,
conforme relato de diversos moradores da pedreira, era comum encontrar-se na
caatinga grande quantidade de emas, bem como porcos-do-mato. Infelizmente essas
espécies estão extintas devido à caça predatória e ao desmatamento intenso.
Recordações
daqueles tempos são profusas na memória de Raimundinho de tio Jerônimo Rosado
Bandeira, pois ele viveu intensamente momentos gloriosos que marcaram
profundamente as vidas dos habitantes da verdadeira comunidade familiar erguida
sob a égide das tradições e dos valores da paraibanidade marcante que permeou a
edificação dos elos de identidade, sobretudo àqueles referentes a Pombal (PB) e
a Catolé do Rocha (PB).
A
caprino-ovinocultura é uma atividade pecuária tradicional em Governador Dix-sept
Rosado. Tenho profunda gratidão a um eminente e respeitado cidadão de nome
Fausto Martins, de saudosa memória, pois certa vez fez questão de separar
diversas cabeças de criação de pequeno porte visando custear no futuro algo que
precisasse em meus estudos.
Nunca esqueci
o sabor das groselhas cultivadas no quintal da residência do casal Nô Rosado
Bandeira-Penha Formiga. A casa de Dona Santa Formiga, nora dos simpáticos
pombalenses, sempre foi referência no que tange às visitas, tendo em vista o
grau de amizade que sempre foi reverenciado, fruto da convivência e da
afinidade do esposo José Formiga com Severino Cruz Cardoso.
Participei de
várias e inesquecíveis Festas de São Sebastião. A residência de Lourenço
Menandro Cruz localizava-se próxima à igreja dedicada ao santo católico
martirizado em razão de sua conversão ao cristianismo. Em sentido diagonal,
estava a morada de outro paraibano conhecido por Pedro do Alecrim, amigo de
longas datas de toda família, onde sempre tive livre trânsito.
No mercado,
parada obrigatória a fim de colocar a conversa em dia, era praxe cumprimentar
Leôncio Carlos, de saudosa memória, bem como Fernando aleijado, pois ambos
foram amigos de longas datas de Severino Cruz Cardoso. A panelada preparada por
Necí tornou o principal espaço de comercialização Dix-septiense uma referência
para todos que cultuam as tradições da culinária sertaneja.
A prosa de
Chico Bacatela, homem de caráter, justo e honesto, sempre foi admirada por
todos que o conhecem, pois em verdade esse grande sertanejo é um verdadeiro
repositório da história do lugar.
Sintetizo a
importância de Governador Dix-sept Rosado em minha vida através da definição de
que o lugar personifica relicário sagrado onde estão contidas lembranças
marcantes de momentos felizes ali vividos dos quais nunca hei de esquecer.
(*) José
Romero Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor-adjunto da UERN.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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