Uma
das vítimas da Grande Seca, Ceará, 1877. Foto de Joaquim Antônio Correia,
“Vítimas da Grande Seca”, Albúmen - Acervo da Fundação Biblioteca Nacional –
Brasil.
A última
grande seca ocorrida nas chamadas 'Províncias do Norte' tinha ocorrido há mais
de 30 anos, entre 1844 e 1845. Nessa época, nada pôde ser feito para
amenizar suas consequências, o Nordeste era uma região muito pobre em
engenharia e recursos.
Na seca de
1877, até as famílias mais abastadas partiram em busca de refúgio junto a
parentes que habitavam as serras e o litoral. Os adultos iam montados nos
cavalos seguidos pelos carros e bois cheios de mulheres, crianças e bagagens,
tendo na retaguarda os vaqueiros e os ajudantes conduzindo o que restara do
gado. Os pobres seguiam a pé, na poeira das estradas, os adultos levando as
crianças menores, puxando o que restava do rebanho de cabras ou vacas e
geralmente o cachorro de estimação ia atrás. Esses eram os retirantes, que eram
perseguidos e expulsos quando estacionavam nas vizinhanças de um povoado.
Flagelados
da seca de 1877, na estação ferroviária do município de Iguatu, aguardando o
trem para Fortaleza.
Os moradores
temiam os saques nos comércios e armazéns, como rotineiramente acontecia. As
cidades, além dos vales férteis, ficavam apinhadas de flagelados. Aracati, que
contava com cinco mil habitantes, passou a abrigar mais de 60 mil pessoas.
Fortaleza converteu-se na capital do desespero: de 21 mil habitantes pelo censo
de 1872, passou a ter 130 mil. Muitos dos retirantes morriam nas veredas e
estradas. Os que alcançavam os centros urbanos chegavam à beira do colapso e
impressionavam pela desnutrição.
A economia
provincial, já abalada pela crise do algodão, quase acabou de vez. Os escravos
eram vendidos para o sudeste; os rebanhos, salvo algumas cabeças conduzidas
pelos retirantes, eram dizimados pela ação das zoonoses, furtos, extravios,
fome e sede. A flora e fauna praticamente desaparecem; as lavouras
exterminadas. Para agravar o quadro de tragédia, um surto de varíola dizima
milhares de pessoas. Mulheres se prostituem em troca de comida, multiplicam-se
os casos de roubo, furto e estupros.
Na seca de
1877, o Ceará foi a região mais afetada das províncias do Norte e perdeu o
equivalente a um terço de sua população. Estima-se que 200 mil pessoas morreram
e outras migraram para outras regiões.
A peste e a
fome matavam mais de quatrocentos por dia. O escritor Rodolfo Teófilo escreveu,
horrorizado com o que assistia; parado numa esquina, que em pouco tempo viu
passarem vinte cadáveres. “E as crianças que morrem nos abarracamentos, como
são conduzidas! Pela manhã os encarregados de sepultá-las vão recolhendo-as em
um grande saco: e, ensacados os cadáveres, é atado aquele sudário de grossa
estopa a um pau e conduzido para a sepultura”. As notícias incomodavam a Corte,
onde o imperador chegou a dizer: “Não restará uma joia da Coroa, mas nenhum
nordestino morrerá de fome”.
Em razão da
situação calamitosa do Nordeste o governo imperial enviou, no período 1877 a
1879, uma comissão de engenheiros que determinaram a perfuração de poços, a
construção de estradas de ferro e de rodagem e o armazenamento de água. Os
resultados dos estudos na região ainda indicaram a construção de barragens ou
açudes. O Açude do Cedro foi umas das primeiras grandes obras de combate à seca
realizadas pelo Governo Imperial. A ordem de construção foi dada pelo imperador
D. Pedro II em decorrência do grande impacto social provocado pela seca de
1877, porém o início das obras deu-se durante os governos republicanos entre
1890 e 1906.
Hoje calcula-se
que morreram cerca de quinhentas mil pessoas em consequência da seca de 1877. O
engenheiro André Rebouças, abolicionista, negro, respeitado por suas ideias
progressistas, calculava em mais de dois milhões as pessoas atingidas pela
seca, ainda em novembro de 1877. Dos mortos de 1877 a 1879, calcula-se que
150.000 faleceram de inanição e 100.000 de febres e outras doenças, 80.000 de
varíola e 180.000 de fome, alimentação venenosa e sede. Acredita-se que a
Grande Seca que ocorreu de 1877 a 1879 ceifou a vida de mais da metade das
1.754.000 pessoas que residiam na área atingida pela tragédia. Esse foi de
longe a maior catástrofe gerada por fenômenos naturais que ocorreu no país.
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