Por: Luiz Carlos Marques Cardoso
O livro do qual faço a resenha já se encontra na 6° Edição, foi escrito pelo pesquisador Oleone Coelho Fontes, esse que acabou por legar a sociedade mundial uma obra riquíssima em detalhes sobre a vida do maior bandido que o Brasil já teve. Em seus estudos entrevistou uma gama de pessoas, gente essa que teve papel singular em algum dado momento da passagem de Virgulino pelas terras da Bahia. O livro trás ainda fotografias dos integrantes do cangaço, e comentários que nos faz pensar num período de trevas aos sertanejos sofridos, tanto pela seca, a pobreza e naquela época, pela violência imputada pelo bando do facínora.
Lampião, ou Capitão Lampião, assim exigia que fosse chamado, por ter ele recebido do Padre Cícero essa titulação. Saía a dizer ser ele o governador dos sertões, na verdade, por mais de dois séculos foi sim de certa forma o Governador das bandas secas do Brasil. Deixou o Estado de Pernambuco ciente da perseguição que os volantes infligiam a seu debilitado bando, precisava de repouso para repor as energias e recrutar novos homens. Fez aquilo que a polícia não imaginava que seria feito, a travessia de uma margem para a outra do Rio São Francisco, aconteceu depois do meio-dia do dia 21 de agosto de 1928.
Já nas terras baianas, gozava de paz, a polícia débil do Estado fazia vista grossa. Ficou a andar por cidades falando que estava na Bahia em paz, que se meteu no Cangaço por imposição da vida e se lhe tivesse condições ele largaria tudo para viver em paz. Sempre coagindo conseguia dos sertanejos o sustento do bando.
Após o grupo de cangaceiros passarem pela vila do Cumbe uma volante cruza em seu encalço. Numa fazendo logo adiante acontece o primeiro embate dos homens de Lampião com a polícia baiana. Na ocasião, o bando saiu vitorioso, matou um sargento e dois soldados. Aquele momento marcou o inicio das atividades perversas do banditismo na Bahia.
De cidade em cidade os cangaceiros iam pilhando, matando, castrando e tomando das mulheres. Teve uma ocasião em que obrigaram cinco moças a dançarem nuas. Corisco, o Diabo Louro, pegou um antigo inimigo, tinha jurado que quando tivesse o homem nas mãos esse sofreria muito antes de morrer. Corisco afirmava que fora o dito homem o responsável pela sua entrada no cangaço. Teve sociedade com ele, porém foi passado para trás. No momento do pagamento pegou a pobre presa e amarou feito bode a ser morto de cabeça para baixo, tirou o couro do homem, esse ainda em vida, sobre muitos gritos.
Em um conflito com os “macacos” (dessa forma os cangaceiros chamavam os policiais) Lampião perde um dos seus homens, esse fato acirrou ainda mais os embates dos volantes com os cangaceiros. Lampião após tomar uma vila prende oito macacos e um sargento. Depois de beberem muito, dançarem; o bando vai a delegacia, local onde se encontrava os soldados presos, tinha soltado os que estavam presos e encarcerados aqueles. Um por um ia sendo levado para fora e com golpes de punhal e tiro na testa tombavam ao chão. Apenas o sargento foi poupado por Lampião, conta que Virgulino fez uma aposta com uma senhora, como essa ganhou, ele pediu que ela exigisse algo, a mesma inquiriu que soltasse o sargento, o rei do cangaço como não ia contra a palavra dada, dessa forma o fez, contrariando seus ideais, pois o lema dele era matar todos os macacos que colocasse as mãos.
O bando de Lampião cresceu tanto que ele se viu obrigado a dividi-lo em vários subgrupos. Corisco chefiava um, fato esse que poupou da morte no encontro da volante com os cangaceiros na Gruta do Angico. Dessa forma ficou mais difícil em exterminar o cangaço. A polícia que parecia com os cangaceiros, tanto em trajes como em perversidade, fatos comprovados e contados no livro. Em cada encontro os bandoleiros obtinha vitória, eles possuíam informantes e fazendeiros a disporem de armas, além de agirem por meio de emboscadas. Conheciam a caatinga como ninguém, além de usarem técnicas para despistar, conseguia farejar macacos de longe.
Em um combate Lampião perde o último irmão que o acompanhara no cangaço, sobrou-se apenas um, por sinal, esse foi o único a não se meter com o cangaço. Depois desse fato, conta-se que Lampião ao ver o irmão sofrendo e sem possibilidade de vida deferiu-se um certeiro na testa, o homem aumentou sua crueldade, matava por matar, castrava. Por vingança ele matou um coronel, mas antes fez despir esse e a mulher e no lombo de animal o homem na frente, a mulher na garupa, foram levados para uma vila próxima para que o ato servisse de exemplo. O coronel foi morto a punhaladas, a esposa foi poupada a pedido dos companheiros de cangaço, todavia essa jamais recobrou a consciência.
Zé Baiano tinha como marca um ferro de ferrar animais, porém o usava para marcar mulheres. “J B” era as letras que continha no instrumento. Quantas não foram as moças ferradas por ele? Ferrava-se no rosto, nas pernas, nas nádegas. Carregar uma marca dessas, além da feiúra levantava muitas indagações, pois o povo sabia de quem era tais iniciais.
Tamanha brutalidade ocorreu com a família Salina, foi uma verdadeira chacina. Lampião manda um bilhete exigindo do chefe da família uma determinada importância. Esse se aconselha na cidade e a autoridade fala para ele não ceder aos bandidos. Assim feito, Lampião ameaça dizendo que quando colocasse as mãos nele poderia considerar um homem morto. A família Salina passa a residir no povoado, porém suas posses iam sumindo, já que ficava sempre ocioso e precisava de recurso para se manter. Dado dia ele foi obrigado a ir a fazenda colher a mandioca e fazer dessa farinha. Reuniu-se com a família e alguns amigos para o trabalho, era fazer a farinha e voltar logo ao povoado. Lampião chega e cerca a propriedade, matam quase todos, deixam apenas duas moças vivas para contar o ocorrido, um rapaz que se encontrava sobre o telhado também consegue fugir. O velho Salina tem os dois olhos furado, orelhas cortadas e é castrado. Lampião coloca o homem ainda vivo no cavalo e leva para a casa de um dos filhos deste, defronte ele mata o velho, abre o peito a golpe de facão e tira o coração. Mata também o filho de Salina que saiu a porta. A brutalidade de Virgulino chegava ao estremo.
Volta-Seca entrou para o cangaço quando ainda era garoto. Por ter muita coragem foi levado por Lampião. Ele na chacina dos soldados chegou após o ocorrido e disse que estava desapontado, pois o chefe só havia deixado sangrar quatro macacos. Certa feita o garoto ameaçou o rei do cangaço dizendo: “Se você bater em mim eu te mato”. Com medo e aconselhado por alguns colegas foge no calar da noite. A namorada vai para a casa dos parentes, ele foge para outro povoado. Retorna para ver a moça, porém a família dela não queria o relacionamento. Volta-Seca fica pelas intermediações, acuado pela polícia os irmãos da moça armam uma emboscada e pega o garoto e o entrega as autoridades. Volta-Seca é conduzido para Salvador, onde após um ano passa a dá entrevistas e conta suas proezas do cangaço.
Maria Déia, popularmente conhecida por Maria Bonita, entrou para o cangaço por desejo próprio, pois odiava a mansidão da vida que levava ao lado do marido sapateiro. Certo dia um Luís Pedro foi ao povoado verificar a situação do local, parou ao escutar uma moça falar do chefe dos cangaceiros, ela dizia que largaria tudo se Lampião a quisesse. O cabra retornou ao esconderijo e falou ao chefe tudo que havia escutado. Virgulino quis conhecer a moça, já que pelas palavras do informante a danada era muito bonita. Chegou e com poucas palavras levou Maria, ao sair ainda disse ao marido sapateiro (José de Neném), que se encontrava de cabeça baixa, “Adeus Zé”. Maria Déia nasceu no povoado de Malhada do Caiçara, município de Santa Brígida. Teve alguns filhos, porém somente um conseguiu vingar, essa logo ao nascer foi entregue a um coiteiro do bando. Expedita ficou sobre guarda de dona Aurora, a esposa do vaqueiro Mamede, na fazenda Inchu. Maria Bonita faleceu ao lado de Lampião na Gruta do Angico.
A morte de Lampião é cercada por muitas controvérsias, um diz que ele foi envenenado, mas o enredo mais aceito é aquele divulgado pela mídia. Lampião e seu bando de cabras foram repousar na Gruta de Angico, na ocasião iria acontecer uma reunião entre os grupos. Certo é que o Rei do Cangaço já não tinha a mesma vitalidade de outrora, com a idade passando dos quarentas e levando uma vida dura: andava muito sob o sol quente do nordeste, comia muito em alguns períodos e nada em outros, sofria com o pânico de ser surpreendido pelos macacos. Pedro de Cândida foi o coiteiro que traiu Lampião, ficou conhecido como Judas de angico, fez por ter sido ameaçado pelos homens de Bezerra. Na madrugada do dia 28 de julho de 1938 quando os volantes atacaram o pouso do Rei do Cangaço e mataram onze pessoas, nove homens e duas mulheres, uma delas Maria Bonita, que segundo consta, foi degolada ainda em vida, começava ali o fim do cangaço que durou mais de duas décadas. Os policiais saquearam todos os pertences dos cangaceiros, uns chegaram a arrancar as mãos dos cadáveres para quando em casa tirarem os anéis de ouro. As cabeças foram levadas para servir de prova que o cangaço havia perdido seu principal homem, Virgulino Ferreira da Silva, vulgo Lampião. Muitos cangaceiros conseguiram fugir, Corisco ainda não tinha chegado ao local.
Corisco ao ver a foto contendo as cabeças chorou copiosamente junto sua companheira Dadá. Resolveu se vingar. As primeiras vítimas foram da família de Domingos Ventura, avô da esposa de João Bezerra. Chegou à casa do homem, comeu e pediu que seus cabras levasse um a um para fora, ao final foi ele com o chefe da família, esse último teve o mesmo fim dos demais, foram degolados e suas cabeças enviadas a Bezerra juntas a um bilhete: “Se o negocio é de cabeças, vou mandar em quantidade”. Em um confronto o Diabo Louro foi baleado na perna, fragilizado ele tenta refugio em outras terras, mas o caçador de cangaceiros Zé Rufino o encontra. Ferido por bala não agüenta e morre. Morreu em Brotas de Macaúbas no dia 25 de maio de 1940. Com a morte de Cristino Gomes da Silva Cleto o cangaço chegava ao seu final.
Aconselho a todos que leem esse magnífico livro. O leitor verá nessas páginas como foram aqueles anos no sertão, onde o Governador não era o Governador, mas um cangaceiro, homem que para uns era bom, enquanto para outros uma peste; fazia caridade ao mesmo tempo em que tomava do que era dos outros.
Luiz Carlos Marques Cardoso.
Luiz Carlos Marques Cardoso.
Extraído do Blog: "Resenhas"
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário