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terça-feira, 3 de janeiro de 2012

“QUANDO PENSO EM VOCÊ FECHO OS OLHOS DE SAUDADE...” (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa
Rangel Alves da Costa

“QUANDO PENSO EM VOCÊ FECHO OS OLHOS DE SAUDADE...”
No verso de Flávio Venturini diria que minha linda juventude foi página de um livro bom; na canção daqueles meninos do Clube da Esquina afirmaria que também me chamava moço e também me chamava estrada, viagem de ventania. E lá fui eu...
Contudo, se lembro dos tempos idos, daquela linda juventude, falo pela poesia de Cecília Meireles musicada por Fagner e digo que quando penso em você fecho os olhos de saudade, porque tenho tido muitas coisas, menos a felicidade...
E quando penso em você significa muito, indo além da recordação em si de uma pessoa que foi muito importante naqueles tempos idos. Pensar em você é rememorar a feição da própria idade, de pensamento aventuresco e de mochila às costas repleta de sonhos.
Pensar em você é relembrar os bons e velhos amigos, aqueles mesmos que compartilhavam os sonhos achando que estes não envelheciam. Amigos de qualquer conversa, de confidências da idade, de compartilhamento da cerveja no bar da esquina, dos encontros ao violão e desafinos.
Pensar em você é viver saudosamente a escola, os estudos um tanto descompromissados, professores e colegas, conversas na recreação e olhares para olhares que fingiam não enxergar. Lembrar que um dia fui percebido e me apaixonei, me fiz poeta e entrelaçadamente perdido nos braços do juvenil e doce amor. Onde andará você, que compensava as notas baixas pelo prazer de estar na escola?
Pensar em você remete à rebeldia que começou a ser tecida até o novelo da utopia e da irresignação acabar. Costurava-se a bandeira de luta, adornava-se o sabre para o combate, procurava-se a receita da bomba caseira, pichava-se o muro, ensaiavam-se palavras de ordem. Os livros proibidos, os panfletos, as cartas, tudo no porão, embaixo do chão, tudo folheado à luz da vela que de repente tinha de ser apagada.
Eram muitos os deuses e herois, os mitos que povoavam nossos sonhos libertários, os doutrinadores e profetas de uma luta que não valia a pena combater senão para justificar a indignação com quase tudo existente. Tantos marxistas, guevaristas, anarquistas, rebeldes, comunistas, trotskistas, socialistas e ateus que até se poderia imaginar o adolescente nascido para a luta contra as diferenças de classes, as injustiças sociais e a exploração capitalista. Mas de repente...
De repente ficaram somente a aprendizagem e a bagagem revoltistas e o quase heroi sonhador se viu diante de outra realidade. Quando a vida chamou a viver e a realidade mostrou que é pelo chão que se anda, então o moço teve que tirar sua roupa de guerrilheiro e se contentar em ser apenas diferente da maioria das pessoas. Diferente porque sabia ouvir uma canção e dizer que ali, nas suas entrelinhas, estava um grito de revolta contra a opressão, o militarismo, as perseguições.
Por tudo isso, pensar em você é como abrir um baú e mostrar o passado ao presente. Depois deles, quem apareceu mais? A turma mineira do Clube da Esquina, Geraldo Vandré, Gil, Caetano, Chico Buarque, Belchior, Taiguara, Raul Seixas, Elis, Alceu Valença, Sérgio Ricardo, Edu Lobo e tantos outros. E depois deles apareceu mais alguém? Pelas esquinas foram ficando a inteligência e o comprometimento, ficou amarelado o Pasquim, sumiram os quadrinhos de Lapi e Henfil.
Num dia de saudade, lembro muito bem, me dividi demais por amor. Já conseguia amar uma só mulher, e que bela flor era aquela ingrata que quebrou meu espelho cristalino. E por ela esvazie barris e misturei Espanhola, Todo Azul do Mar, Clube da Esquina II, Sá Marina, Jogo de Damas, Outra Vez, Rua Ramalhete, Não Chore Por Mim Morena, Grito de Alerta, Na Primeira Manhã, Espelho Cristalino...
Mas, de coração apaixonado, não deixava de repetir Canteiros: “Quando penso em você/ Fecho os olhos de saudade/ Tenho tido muita coisa/ Menos a felicidade/ Correm os meus dedos longos/ Em versos tristes que invento/ Nem aquilo a que me entrego/ Já me dá contentamento/ Pode ser até manhã/ Sendo claro, feito o dia/ Mas nada do que me dizem me faz sentir alegria/ Eu só queria ter do mato/ Um gosto de framboesa/ Pra correr entre os canteiros/ E esconder minha tristeza/ E eu ainda sou bem moço pra tanta tristeza/ E deixemos de coisa, cuidemos da vida/ Pois se não chega a morte/ Ou coisa parecida/ E nos arrasta moço/ Sem ter visto a vida...”.
Foi tudo muito difícil, muito sonho, muito bom. Mas o melhor de tudo é que até hoje quando penso em você fecho os olhos de saudade. É que tenho tido muita coisa, menos a felicidade...

Rangel Alves da Costa* 
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com



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