Por: Honório de Medeiros
OS MISTÉRIOS DO ATAQUE DE LAMPIÃO A MOSSORÓ: PRIMEIRA TEORIA ACERCA DA INVASÃO (Segunda Parte):
Leiam, anteriores a este texto, em
1) O ATAQUE DE LAMPIÃO A MOSSORÓ: UM MISTÉRIO QUASE CENTENÁRIO; 2) O ATAQUE DE LAMPIÃO A MOSSORÓ: COMO ERA A CIDADE NA ÉPOCA DA INVASÃO; 3) O ATAQUE DE LAMPIÃO A MOSSORÓ: PRIMEIRA TEORIA ACERCA DA INVASÃO (Primeira Parte).
TEORIA: O ataque a Mossoró resultou da ganância do Coronel Isaías Arruda e Lampião, no que foram secundados por Massilon
Que o Coronel Isaías Arruda foi o maior responsável por induzir Lampião a atacar Mossoró, quanto a isso não há dúvidas. Sem esse assédio, não teria havido o ataque. Com a mentalidade rapace da qual era possuidor Isaías Arruda, quando lhe propuseram essa idéia, percebeu de imediato que sua concretização lhe permitiria ganhar algo de qualquer forma: planejar a empreitada, convencer Lampião, fornecer armas e munição, nada tinha ele a perder se pusesse mãos à obra e o atraísse para esse projeto.
Se tudo desse certo, raciocinou o Coronel, ganharia sua parte - uma verdadeira fortuna[1], levando-se em consideração o valor do exigido, dias após, por Lampião ao Coronel Rodolpho Fernandes, para que houvesse a invasão da cidade -, como acontecera antes, quando Massilon voltara com o dinheiro arrancado de Apodi.
Se nada desse certo obteria um lucro especial vendendo, ao cangaceiro, como de fato vendeu, as armas necessárias ao ataque; além do mais, se por obra e graça das circunstâncias, Lampião morresse no Rio Grande do Norte, ele, o Coronel, ver-se-ia livre das pressões que estava sofrendo, oriundas de Fortaleza, do Governo do Estado, e, até mesmo, do Governo Federal, por suas ligações com o líder cangaceiro, e que o levaram, segundo alguns historiadores, a trai-lo, tentando envenená-lo e queima-lo vivo, ou, segundo outros, a encenar essas duas tentativas de comum acordo com o Rei do Cangaço.
Entretanto a idéia de atacar Mossoró não nasceu no Coronel Isaías Arruda.
Isso por vários motivos, dois deles bastantes simples: em primeiro lugar, ele não chamou Lampião ao Cariri, como já sabemos, e sem Lampião, não haveria condições para realizar o ataque a Mossoró; em segundo lugar por que se a questão fosse meramente financeira, outras cidades, mais próximas e bem menos perigosas, no Ceará, na Paraíba, ou mesmo no Rio Grande do Norte, poderiam ser invadidas e render um grande lucro, sem a possibilidade de fracasso que uma cidade do porte e da distância[2] de Mossoró representava.
Capela de São Vicente, Mossoró, final dos anos 20, começo dos anos 30, por Francisco Soares de Lima
É em Sérgio Dantas, no “LAMPIÃO E O RIO GRANDE DO NORTE[3]”, que encontramos subsídio para essa conclusão:
O cangaceiro “Mormaço”, em diferentes interrogatórios prestados à Polícia (Martins, Pau dos Ferros, Mossoró e Crato), deixou claro que Lampião desejava chegar ao Ceará para refugiar-se e municiar o bando. Também acrescentou, em diversas oportunidades, que Arruda intermediava, invariavelmente, tais compras de munição.
Por outro lado, Mossoró não teria entrado no campo das elucubrações criminosas do Coronel Isaías Arruda, se não tivesse acontecido o seguinte fato, esse muito significativo, também relatado por Sérgio Dantas[4]:
Em dias de abril daquele ano[5], o sinistro caudilho[6] recebera importante solicitação. Décio Holanda[7] – destacado fazendeiro do município de Pereiro, no Ceará – pediu-lhe que colocasse a “cabroeira” particular a seu serviço, posto que planejava tomar de assalto a cidade de Apodi, no Estado vizinho.
(...)
Viajou[8] até Serra do Diamante, em Aurora, e foi ter com Arruda. Descreveu-lhe o imbróglio. Através do confrade – mestre na intriga política – empresariou o bandoleiro Antônio Leite, o Massilon.
O plano sinistro, em um primeiro momento, previa a conquista de Apodi. Sugeria, em seguida, o aprisionamento de Francisco Pinto e principais agregados políticos do intendente. Por fim, prescrevia extorsões, roubos, incêndios, homicídios.
Ainda:
Aurora, Ceará. Há dois dias Massilon já retornara ao esconderijo. Ao mentor Isaías Arruda, prestou contas do assalto. O apurado foi dividido meio a meio, como anteriormente combinado entre cangaceiro e Coronel (O CEARÁ, 1928).
Antônio Leite estava eufórico. Descrevia detalhada e reiteradamente a sucessão de assaltos. Gabava-se do feito heróico:
- Disseram que eu não sabia brigar, e eu volto com quarenta contos de réis!
Casa do Coronel Isaías Arruda em Aurora, Ceará. Nela há um subterrâneo onde o Coronel estocava armas.
Ou seja, em assim sendo, Mossoró foi conseqüência de Apodi e de uma circunstância inesperada: a chegada de Lampião em Aurora, no Ceará, terras do Coronel Isaías Arruda. Apodi, por sua vez, foi conseqüência das brigas entre coronéis norte-rio-grandenses e paraibanos disputando o poder[9].
E a idéia do ataque a Mossoró, da qual resultou o planejamento de Isaías Arruda e a execução de Lampião, com certeza não foi de nenhum dos dois, mas, sim, proposta de Massilon, à qual aderiu de pronto, pelas razões elencadas acima, o Coronel, e, com extrema relutância, o maior dos cangaceiros.
Portanto tudo leva a crer que Massilon, ou alguém ou alguns que ele representava, idealizou, Isaías planejou, e Lampião executou.
A pergunta que se faz agora, é se a idéia de Massilon atacar Mossoró foi algo estritamente seu ou de alguém ou alguns mais, do qual ou dos quais ele seria mero marionete.
CONTINUA QUARTA-FEIRA DA PRÓXIMA SEMANA COM A SEGUNDA TEORIA ACERCA DA INVASÃO DE MOSSORÓ POR LAMPIÃO.
[2] Perto de quinhentos quilômetros, de Aurora a Mossoró, área praticamente descampada, sem a proteção natural como serrotes, mata fechada ou pedreiras, ante um cerco militar, sem as quais o cangaceiro não passava.
[7] Décio Sebastião de Albuquerque Holanda era seu nome completo. “Genro de Tilon Gurgel do Amaral, casado que foi com sua filha Francisca Brito Gurgel (Chicuta). Décio morou vários anos no RN, transferindo-se depois para o Ceará” (“NAS GARRAS DE LAMPIÃO”; GURGEL, Antônio; BRITO, Raimundo Soares de; Coleção Mossoroense; Série “C”; v. 1.513; 2ª edição; Mossoró).
Extraído do blog do escritor, professor, advogado e pesquisador do cangaço:
Dr. Honório de Medeiros
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