Por Rangel Alves
da Costa*
Toda loucura é
amiga da imaginação, do voo sem asas, dos espaços etéreos, do mistério e da
magia, daquilo que é impossível alcançar. Impossível ao ser humano de mente
sadia, principalmente porque este mal sabe caminhar rente ao chão.
Mas para o
louco tudo possui uma ponta de possibilidade. E não é à toa que o doido
conversa com a pedra, faz amizade com qualquer pedaço de pau, sente verdadeiro
encantamento por seres inanimados. E também admira a noite, ama as estrelas e é
verdadeiramente apaixonado pela lua.
A verdade é
que o doido tem uma relação das mais instigantes, misteriosas e profundas com a
lua. A esfera lunar lhe causa um efeito tão profundo que nem a ciência ainda
foi capaz de apontar os motivos e a dimensão de tudo assim acontecer. Talvez a
lua esteja para o louco assim como o sol está para o sertão: um sempre está no
outro.
Mas nem só
laivos amorosos a lua provoca no doido, eis que também tem o dom de
acentuar-lhe a loucura, de provocar sensações indescritíveis, de fazê-lo querer
alcançá-la a todo custo. A lua o atrai, o chama, escraviza, aumenta a loucura e
a paixão pelo seu mistério.
Segundo o
conhecimento popular, quando a lua está cheia, esplendorosamente iluminada no
céu, o louco alcança um estágio que vai desde a letargia à insanidade total. A
lua cheia faz o louco ficar mais louco, mais arredio, mais perigoso, mais
revelador de suas propensões mais escondidas.
A ficção
sempre gosta de mostrar a estranha relação entre a loucura e a lua cheia. Numa
novela, por exemplo, um personagem vivia verdadeiramente ameaçado pela chegada
da lua cheia. Sua situação ficava tão deplorável que a irmã tinha de mantê-lo
trancado numa jaula, sob pena de ser levado pela claridão da noite. Mas acaba
não resistindo e é levado pelo feitiço da lua.
Muito tenta se
explicar acerca dessa estranha e poderosa atratividade. Na ficção, a lua tem o
dom de enfeitiçar, mas a realidade aponta outras possibilidades. Seria amor,
seria o despertar de um desejo escondido, ou seria simplesmente a atratividade
da lua penetrando e transformando uma mente já fragilizada? Ou seria um
daqueles mistérios cuja compreensão humana seria também reputada como loucura?
Talvez apenas uma força magnética agindo sobre as fendas cerebrais do louco.
Apenas talvez.
Parece que o
doido adivinha sua breve transformação. Igualmente ao cágado que sai da toca
assim que uma trovoada se aproxima, ou como o cavalo que risca na estrada e não
segue adiante quando pressente ameaça na beira da estrada, assim também o louco
ante a chegada da lua cheia.
É doido,
maluco, insano, mas acentua ainda mais sua loucura. Geralmente fica mais
entristecido, cabisbaixo, dialogando consigo mesmo, andando de lado a outro
como alguém que ansioso espera um acontecimento. Mas nada mais que a lua, que
mesmo ainda escondida no céu já começa a provocar reações. E aos poucos tais
reações se transformam em verdadeira agonia.
Quando a noite
chega e a janela é aberta, logo o louco será avistado olhando pra cima, aflito,
nervoso, tomando de espanto e de desejos estranhos. E a lua impiedosa, talvez
percebendo aquela dolorosa situação, parece se avolumar ainda mais e se
aproximar imensa, toda inteira, daquela janela.
Ninguém sabe o
que se passa na mente do louco nestes momentos terrivelmente misteriosos.
Ninguém sabe se o magnetismo da luz do luar penetra e torna em rodopios a mente
frágil ou se aquela auréola dourada vai trazendo um encantamento arrebatador.
Talvez nem o próprio doido saiba distinguir o que realmente sente naquele
momento.
Mas a verdade
é que se espanta, se encanta, delira, extravasa. E no ápice da transformação,
talvez o amor esteja misturado à dor, talvez a paixão venha misturada à
angústia de tanto querer e não poder alcançar.
E é por isso
que grita, que ergue os braços, que quer voar. E voa. Não sai do lugar, mas
voa. E passa a noite inteira voando, até que a manhã o encontra sorridente. Ou
mesmo com feições crispadas de sofrimento. Ninguém sabe. Somente a lua.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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