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segunda-feira, 16 de março de 2015

DONA ELITA SOUTO DO MONTE, A ILUSTRE PATRONA DESCONHECIDA

Por Gibran Araújo - Areia Branca
D. Elita Souto do Monte. Fonte da imagem: Acervo do autor. Gentilmente cedida por Nietta Lindenberg do Monte.

Como curioso irrequieto que sou das coisas de Areia Branca, sempre tive interesse em conhecer não somente a história da minha terra, como também em saber quem foram as pessoas que a desenvolveram, tentando descobrir os motivos das homenagens que dão nome aos logradouros e aos prédios públicos deste município. Desde a minha infância, quando a Escola Estadual Elita Monte funcionou vizinha à casa de meus pais, tenho curiosidade de saber quem foi esta senhora e por qual motivo o seu nome estava impresso nas fardas e no timbre, gravado no frontispício, ecoando através dos tempos, formando gerações e se perpetuando na história de minha terra! Perguntei incansável e inutilmente às pessoas mais velhas e aos atuais e antigos funcionários desta instituição de ensino por subsídios que explicassem quem foi Elita Monte e por que a essa escola se dava o seu nome. O tempo passou e mesmo assim a inquietação em solucionar essa curiosidade nunca me sossegou…

Até que um belo dia, ao pesquisar o arquivo paroquial de Areia Branca, deparei-me com a esclarecedora informação deixada no Livro de Tombo pelo Mons. Leão Medeiros Leite, então Vigário da Paróquia Nossa Senhora da Conceição de Areia Branca:

“Interessado em poder proporcionar aos pobres da cidade um pouco de educação às crianças e ministrar–lhes instrução, pude fundar, no dia 3 de outubro de 1938, a Escola Paroquial, embora pobremente aparelhada. A Escola foi inaugurada com dois turnos, com mais de 40 alunos, sendo Professor o Sr. João Baptista de Souza. As aulas funcionam no antigo Grupo Escolar, à Rua Cel. Fausto, enquanto não for inaugurado o prédio que está em trabalho, doado à Paróquia, à Rua Silva Jardim, que estava há anos abandonado e está sendo concluído, graças à generosidade espontânea de D. Elita Souto do Monte, residente no Rio de Janeiro, doando 6 contos de réis.”¹

No dia 14 de novembro de 1938, em meio ao grandioso evento do Congresso Eucarístico Paroquial de Areia Branca, o primeiro realizado na Diocese de Mossoró e o terceiro no Estado do Rio Grande do Norte, houve a inauguração do Salão Paroquial. Fez o discurso inaugural o Revmº. Vigário que agradeceu as generosas ofertas da extinta Sociedade “Amor e Caridade” e da benfeitora D. Elita Monte e se congratulou com o povo por esse acontecimento dizendo “ali se farão as festas das Associações e funcionará a Escola Paroquial”. O Sr. Bispo Diocesano fez eloqüente discurso concitando todos a amparar a Escola. Compareceu grande número de Sacerdotes, autoridades, seminário, associações e música.¹

O escritor mexicano Reynaldo de La Paz, que esteve presente neste Congresso, em seu livro “A Diocese de Mossoró e suas marcantes realizações”, publicado em 1939 pela Editora Ramos & Pouchain, nos dá as seguintes informações complementares:

“A Escola Paroquial é outra bela iniciativa do infatigável vigário. Instalada no Salão Paroquial, consta de duas Classes primárias, funcionando a 1ª classe denominada “Santa Theresinha” pela manhã, com 17 alunos. A 2ª classe “D. Elita Monte”, funciona à tarde com 23 discípulos. A escola é subvencionada pelo governo municipal, sendo seu diretor o Rvdmo. Vigário, e professor o Sr. João Baptista de Souza.”²

Em 1943, o então Vigário Pe. Ismar Fernandes de Queiroz nos informa que “em reconhecimento da generosidade de D. Elita Monte, esposa do Cel. Miguel Faustino do Monte, a Escola Paroquial que funciona no Salão Paroquial recebeu o nome de Escola Paroquial Elita Monte”.¹

Este prédio situado na então Rua Silva Jardim, atual Francisco Ferreira Souto, foi doado à Paróquia de Nossa Senhora da Conceição pela Sociedade “Amor e Caridade”, que  se propunha a construir um hospital, arrecadando dinheiro através de festas populares. Fora lançada a pedra fundamental do referido hospital, e logo depois foi levantada 3 paredes, onde hoje existe a Escola Estadual Francisco Fausto, em frente à Praça Antônio Lúcio, no início da Rua Jorge Caminha. Devido às questões políticas locais, esta sociedade foi extinta e com o saldo existente em caixa, o respeitável e justo Seu Dimas, como Presidente da Sociedade, realizou a doação conforme escritura pública passada no seu Cartório, depois de propriedade de Manoel Leandro Sobrinho, para funcionamento da Escola Paroquial, que depois obedeceu à direção da Professora Maria de Lourdes. A escola funcionou neste local até 1976, quando o prédio desabou por incúria dos responsáveis pela sua conservação, como bem disse o confiável tabelião.³

Depois, o Colégio Elita Monte, como era popularmente conhecido, passou a funcionar em outro local na mesma rua, quatro quarteirões acima, no quarto imóvel a contar da Travessa Joaquim Nogueira até a Travessa dos Calafates, onde hoje se transformou em bar e residência. Era um prédio velho azul, cujo piso era todo de madeira e logo na sua entrada tinha uma escada em estilo de época que dava para a secretaria. No início dos anos 1980, o colégio mudou novamente de lugar, mas ainda continuou funcionando na mesma rua, no prédio da antiga sede do Sindicato dos Estivadores, esquina com a Avenida Deputado Manoel Avelino. Deste prédio, magnífico registro do esplendor do passado de Areia Branca, hoje só existem escombros e ruínas. Até que finalmente a escola se mudou nos anos 2000 para a Rua Rui Barbosa, Bairro São João, e oficialmente se intitula Escola Estadual Elita Monte.

Mas afinal, quem foi Elita Souto do Monte?

Elita Souto nasceu em Macau/RN a 13 de março de 1888, filha do Cel. Elias Antônio Ferreira Souto e de Thereza Rebouças Ferreira Souto. Cel. Elias Souto era professor concursado do magistério público em sua terra natal, Assú/RN. Depois residiu em Macau/RN, onde foi administrador da Mesa de Rendas Municipal. É tido como o fundador da imprensa diária da capital do Rio Grande do Norte, Natal. Elita era sobrinha de Alfredo de Souza Rebouças, Prefeito de Areia Branca de 1932 a 1934, e cunhada do Desembargador João Dionísio Filgueira, que dá nome a uma das ruas de Areia Branca. Elita Souto se casou em Natal/RN com o riquíssimo empresário cearense, Coronel Miguel Faustino do Monte, viúvo de Maria Idalina, esta sobrinha de Joca Soares, um dos fundadores de Areia Branca.

Miguel Faustino do Monte - foto gentilmente cedida ao nosso blog http://blogdomendesemendes.blogspot.com pelo jornalista Geraldo Maia do Nascimento

Cel. Miguel Faustino do Monte nasceu em Sobral/CE e por volta de 1884 chegou a Mossoró, tinha um grande tino comercial e com o tempo se tornou o principal sócio da firma M. F. do Monte & Cia., uma das maiores empresas do estado à época, dona da principal usina de algodão e de três das maiores salinas do parque salineiro da região mossoroense, Jurema, Pitulico e Caenga, passando também esta empresa a funcionar como casa bancária até 1930, quando o inteligentíssimo e visionário empreendedor encerrou definitivamente suas atividades. O industrial salineiro Cel. Miguel Faustino e sua segunda esposa D. Elita Monte foram os pais de Maria José Souto do Monte e Miguel Faustino do Monte Filho. Passaram a residir no Rio de Janeiro por volta dos anos 20, onde o patriarca Miguel Faustino construiu um imenso patrimônio imobiliário.

Capa do livro “Uma Roseira com Duas Rosas”, parceria de Elita Monte e sua neta Nietta Monte, publicado em 1966.

Dona Elita Monte era poetisa e sempre apresentou vocação às artes a exemplo de seu pai que era professor, jornalista, escritor e crítico literário. Em 1916, ela já escrevia poemas e poesias. Dona Elita gostava de escrever cartas, correspondências e mantinha amizades literárias com Manuel Bandeira e com Câmara Cascudo, este foi o prefaciador do livro “Uma Roseira Com Duas Rosas”, publicado postumamente em dezembro de 1966, em parceria com sua neta Nietta Lindenberg do Monte. Nos últimos anos de vida, Dona Elita se enveredou pela pintura em telas, em louça e em outros materiais diversos.

Mesmo com tantas informações de sua biografia, faltava ainda um rosto que habitasse e desse alma a esta ilustre personagem, ora resgatada para o conhecimento do povo areia-branquense. E através de algumas tentativas, consegui fazer contato com sua neta Nietta Lindenberg do Monte, professora especialista em Educação Indígena e Meio Ambiente, autora de muitos livros sobre o tema e da obra Memoriando, publicado em 2010 pela editora 7letras, que foi musicado e apresentado no lançamento do livro como espetáculo de monólogo cantante, categoria de teatro musical voltado para uma estrutura de canto a capela. A multifacetada artista e cientista Nietta traz a poesia no sangue e no nome e também gosta da arte de pintar como sua avó. Ela sempre me atendeu bem e gentilmente me auxiliou em ceder informações, bem como fotografias e os livros. Ensejou ainda a oportunidade para que eu conhecesse o seu irmão Miguel Monte, quando de sua vinda recente a Mossoró para tratar de assuntos da Salina Caenga, em Grossos, que ainda lhes resta. Encontro breve, porém muito proveitoso e interessante, sobretudo porque recebi das mãos do neto de Elita Monte um presente verdadeiramente grandioso: o manuscrito “Papae – mais de minha vida”, espécie de autobiografia escrita nos anos 1947-48 pelo seu avô Cel. Miguel Faustino do Monte, nonagenário que narrou com lucidez penetrante sua admirável história de vida com informações nunca dantes veiculadas.

Miguel Faustino do Monte faleceu em 10 de novembro de 1952, aos 94 anos de idade, e sua esposa D. Elita Monte faleceu no dia 26 de setembro de 1965, aos 77 anos. A esta patrona ilustre e ao mesmo tempo desconhecida, que despendeu generosa quantia pela educação, bem como pelo desenvolvimento de Areia Branca, devemos lembrar a todas as gerações vindouras a gratidão e o reconhecimento de quem foi esta digníssima benfeitora que através de um belíssimo e louvável ato de solidariedade, consagrou o seu nome na História de Areia Branca!

Bibliografia:

¹Primeiro Livro de Tombo da Paróquia N. S. da Conceição de Areia Branca (1919-1944)
²PAZ, Reynaldo de La. A diocese de Mossoró e suas marcantes realizações: resenha e apreciações. Editora Ramos & Pouchain, 1939. p. 75
³RAMOS, Dimas Pimentel. In: RAMOS, Ricardo. Dimas Pimentel Ramos, nascido em 6.nov.1900. 

https://areiabranca.wordpress.com/2013/10/30/dona-elita-souto-do-monte-a-ilustre-patrona-desconhecida/

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

Um comentário:

  1. Anônimo11:33:00

    Pois é caro pesquisador Gibran Araújo, a foto da esposa do senhor Miguel Faustino, eu havia encontrado através pesquisa. Porém, a foto dele, só mesmo a que Mendes postou ontem, - foto essa que até mesmo para restaurar apresenta dificuldade. Veremos se alguém consegue uma outra nítida!
    Atenciosamente,
    Antonio Oliveira - Serrinha - Bahia.

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