Por Gibran Araújo - Areia Branca
D. Elita Souto do Monte. Fonte da imagem: Acervo do autor. Gentilmente cedida por Nietta Lindenberg do Monte.
Como curioso irrequieto que sou
das coisas de Areia Branca, sempre tive interesse em conhecer não somente a
história da minha terra, como também em saber quem foram as pessoas que a
desenvolveram, tentando descobrir os motivos das homenagens que dão nome aos
logradouros e aos prédios públicos deste município. Desde a minha infância,
quando a Escola Estadual Elita Monte funcionou vizinha à casa de meus pais,
tenho curiosidade de saber quem foi esta senhora e por qual motivo o seu nome
estava impresso nas fardas e no timbre, gravado no frontispício, ecoando
através dos tempos, formando gerações e se perpetuando na história de minha
terra! Perguntei incansável e inutilmente às pessoas mais velhas e aos atuais e
antigos funcionários desta instituição de ensino por subsídios que explicassem
quem foi Elita Monte e por que a essa escola se dava o seu nome. O tempo passou
e mesmo assim a inquietação em solucionar essa curiosidade nunca me sossegou…
Até que um belo dia, ao pesquisar
o arquivo paroquial de Areia Branca, deparei-me com a esclarecedora informação
deixada no Livro de Tombo pelo Mons. Leão Medeiros Leite, então Vigário da
Paróquia Nossa Senhora da Conceição de Areia Branca:
“Interessado em poder
proporcionar aos pobres da cidade um pouco de educação às crianças e
ministrar–lhes instrução, pude fundar, no dia 3 de outubro de 1938, a Escola
Paroquial, embora pobremente aparelhada. A Escola foi inaugurada com dois
turnos, com mais de 40 alunos, sendo Professor o Sr. João Baptista de Souza. As
aulas funcionam no antigo Grupo Escolar, à Rua Cel. Fausto, enquanto não for
inaugurado o prédio que está em trabalho, doado à Paróquia, à Rua Silva Jardim,
que estava há anos abandonado e está sendo concluído, graças à generosidade
espontânea de D. Elita Souto do Monte, residente no Rio de Janeiro, doando 6
contos de réis.”¹
No dia 14 de novembro de 1938, em
meio ao grandioso evento do Congresso Eucarístico Paroquial de Areia Branca, o
primeiro realizado na Diocese de Mossoró e o terceiro no Estado do Rio Grande
do Norte, houve a inauguração do Salão Paroquial. Fez o discurso inaugural o
Revmº. Vigário que agradeceu as generosas ofertas da extinta Sociedade “Amor e
Caridade” e da benfeitora D. Elita Monte e se congratulou com o povo por esse
acontecimento dizendo “ali se farão as festas das Associações e funcionará a
Escola Paroquial”. O Sr. Bispo Diocesano fez eloqüente discurso concitando
todos a amparar a Escola. Compareceu grande número de Sacerdotes, autoridades,
seminário, associações e música.¹
O escritor mexicano Reynaldo de
La Paz, que esteve presente neste Congresso, em seu livro “A Diocese de Mossoró
e suas marcantes realizações”, publicado em 1939 pela Editora Ramos &
Pouchain, nos dá as seguintes informações complementares:
“A Escola Paroquial é outra bela
iniciativa do infatigável vigário. Instalada no Salão Paroquial, consta de duas
Classes primárias, funcionando a 1ª classe denominada “Santa Theresinha” pela
manhã, com 17 alunos. A 2ª classe “D. Elita Monte”, funciona à tarde com 23
discípulos. A escola é subvencionada pelo governo municipal, sendo seu diretor
o Rvdmo. Vigário, e professor o Sr. João Baptista de Souza.”²
Em 1943, o então Vigário Pe.
Ismar Fernandes de Queiroz nos informa que “em reconhecimento da generosidade
de D. Elita Monte, esposa do Cel. Miguel Faustino do Monte, a Escola Paroquial
que funciona no Salão Paroquial recebeu o nome de Escola Paroquial Elita
Monte”.¹
Este prédio situado na então Rua
Silva Jardim, atual Francisco Ferreira Souto, foi doado à Paróquia de Nossa
Senhora da Conceição pela Sociedade “Amor e Caridade”, que se
propunha a construir um hospital, arrecadando dinheiro através de festas
populares. Fora lançada a pedra fundamental do referido hospital, e logo depois
foi levantada 3 paredes, onde hoje existe a Escola Estadual Francisco Fausto,
em frente à Praça Antônio Lúcio, no início da Rua Jorge Caminha. Devido às
questões políticas locais, esta sociedade foi extinta e com o saldo existente
em caixa, o respeitável e justo Seu Dimas, como Presidente da Sociedade,
realizou a doação conforme escritura pública passada no seu Cartório, depois de
propriedade de Manoel Leandro Sobrinho, para funcionamento da Escola Paroquial,
que depois obedeceu à direção da Professora Maria de Lourdes. A escola
funcionou neste local até 1976, quando o prédio desabou por incúria dos
responsáveis pela sua conservação, como bem disse o confiável tabelião.³
Depois, o Colégio Elita Monte,
como era popularmente conhecido, passou a funcionar em outro local na mesma
rua, quatro quarteirões acima, no quarto imóvel a contar da Travessa Joaquim
Nogueira até a Travessa dos Calafates, onde hoje se transformou em bar e
residência. Era um prédio velho azul, cujo piso era todo de madeira e logo
na sua entrada tinha uma escada em estilo de época que dava para a
secretaria. No início dos anos 1980, o colégio mudou novamente de lugar,
mas ainda continuou funcionando na mesma rua, no prédio da antiga sede do
Sindicato dos Estivadores, esquina com a Avenida Deputado Manoel Avelino.
Deste prédio, magnífico registro do esplendor do passado de Areia Branca, hoje
só existem escombros e ruínas. Até que finalmente a escola se mudou nos anos
2000 para a Rua Rui Barbosa, Bairro São João, e oficialmente se intitula Escola
Estadual Elita Monte.
Mas afinal, quem foi Elita Souto
do Monte?
Elita Souto nasceu em Macau/RN a
13 de março de 1888, filha do Cel. Elias Antônio Ferreira Souto e de Thereza
Rebouças Ferreira Souto. Cel. Elias Souto era professor concursado do
magistério público em sua terra natal, Assú/RN. Depois residiu em Macau/RN,
onde foi administrador da Mesa de Rendas Municipal. É tido como o fundador da
imprensa diária da capital do Rio Grande do Norte, Natal. Elita era sobrinha de
Alfredo de Souza Rebouças, Prefeito de Areia Branca de 1932 a 1934, e cunhada
do Desembargador João Dionísio Filgueira, que dá nome a uma das ruas de Areia
Branca. Elita Souto se casou em Natal/RN com o riquíssimo empresário cearense,
Coronel Miguel Faustino do Monte, viúvo de Maria Idalina, esta sobrinha de Joca
Soares, um dos fundadores de Areia Branca.
Miguel Faustino do Monte - foto gentilmente cedida ao nosso blog http://blogdomendesemendes.blogspot.com pelo jornalista Geraldo Maia do Nascimento
Cel. Miguel Faustino do Monte
nasceu em Sobral/CE e por volta de 1884 chegou a Mossoró, tinha um grande tino
comercial e com o tempo se tornou o principal sócio da firma M. F. do Monte
& Cia., uma das maiores empresas do estado à época, dona da principal usina
de algodão e de três das maiores salinas do parque salineiro da região
mossoroense, Jurema, Pitulico e Caenga, passando também esta empresa a
funcionar como casa bancária até 1930, quando o inteligentíssimo e visionário
empreendedor encerrou definitivamente suas atividades. O industrial salineiro
Cel. Miguel Faustino e sua segunda esposa D. Elita Monte foram os pais de Maria
José Souto do Monte e Miguel Faustino do Monte Filho. Passaram a residir no Rio
de Janeiro por volta dos anos 20, onde o patriarca Miguel Faustino construiu um
imenso patrimônio imobiliário.
Capa do livro “Uma Roseira com
Duas Rosas”, parceria de Elita Monte e sua neta Nietta Monte, publicado em
1966.
Dona Elita Monte era poetisa
e sempre apresentou vocação às artes a exemplo de seu pai que era
professor, jornalista, escritor e crítico literário. Em 1916, ela já escrevia
poemas e poesias. Dona Elita gostava de escrever cartas, correspondências e
mantinha amizades literárias com Manuel Bandeira e com Câmara Cascudo, este foi
o prefaciador do livro “Uma Roseira Com Duas Rosas”, publicado postumamente em
dezembro de 1966, em parceria com sua neta Nietta Lindenberg do Monte. Nos
últimos anos de vida, Dona Elita se enveredou pela pintura em telas, em louça e
em outros materiais diversos.
Mesmo com tantas informações de
sua biografia, faltava ainda um rosto que habitasse e desse alma a esta ilustre
personagem, ora resgatada para o conhecimento do povo areia-branquense. E
através de algumas tentativas, consegui fazer contato com sua neta Nietta
Lindenberg do Monte, professora especialista em Educação Indígena e Meio
Ambiente, autora de muitos livros sobre o tema e da obra Memoriando, publicado
em 2010 pela editora 7letras, que foi musicado e apresentado no lançamento do
livro como espetáculo de monólogo cantante, categoria de teatro musical voltado
para uma estrutura de canto a capela. A multifacetada artista e cientista
Nietta traz a poesia no sangue e no nome e também gosta da arte de pintar como
sua avó. Ela sempre me atendeu bem e gentilmente me auxiliou em ceder
informações, bem como fotografias e os livros. Ensejou ainda a oportunidade
para que eu conhecesse o seu irmão Miguel Monte, quando de sua vinda recente a
Mossoró para tratar de assuntos da Salina Caenga, em Grossos, que ainda lhes
resta. Encontro breve, porém muito proveitoso e interessante, sobretudo porque
recebi das mãos do neto de Elita Monte um presente verdadeiramente grandioso: o
manuscrito “Papae – mais de minha vida”, espécie de autobiografia escrita nos
anos 1947-48 pelo seu avô Cel. Miguel Faustino do Monte, nonagenário que narrou
com lucidez penetrante sua admirável história de vida com informações nunca
dantes veiculadas.
Miguel Faustino do Monte faleceu
em 10 de novembro de 1952, aos 94 anos de idade, e sua esposa D. Elita Monte
faleceu no dia 26 de setembro de 1965, aos 77 anos. A esta patrona ilustre e ao
mesmo tempo desconhecida, que despendeu generosa quantia pela educação, bem
como pelo desenvolvimento de Areia Branca, devemos lembrar a todas as gerações
vindouras a gratidão e o reconhecimento de quem foi esta digníssima benfeitora
que através de um belíssimo e louvável ato de solidariedade, consagrou o seu
nome na História de Areia Branca!
Bibliografia:
¹Primeiro Livro de Tombo da
Paróquia N. S. da Conceição de Areia Branca (1919-1944)
²PAZ, Reynaldo de La. A diocese
de Mossoró e suas marcantes realizações: resenha e apreciações. Editora Ramos
& Pouchain, 1939. p. 75
³RAMOS, Dimas Pimentel. In:
RAMOS, Ricardo. Dimas Pimentel Ramos, nascido em 6.nov.1900.
https://areiabranca.wordpress.com/2013/10/30/dona-elita-souto-do-monte-a-ilustre-patrona-desconhecida/
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
Pois é caro pesquisador Gibran Araújo, a foto da esposa do senhor Miguel Faustino, eu havia encontrado através pesquisa. Porém, a foto dele, só mesmo a que Mendes postou ontem, - foto essa que até mesmo para restaurar apresenta dificuldade. Veremos se alguém consegue uma outra nítida!
ResponderExcluirAtenciosamente,
Antonio Oliveira - Serrinha - Bahia.