*Rangel Alves
da Costa
Eu estava em
Exu, na região do Araripe pernambucano, para o Cariri Cangaço Exu/Serrita 2017,
quando na pousada fui surpreendido com o professor Afrânio dizendo que após o
evento iria ainda percorrer outras cidades do Nordeste e que certamente
passaria em Poço Redondo para conhecer o Lampião em Paris. Havia ouvido falar
neste local e estava com muito interesse em conhecê-lo.
Fiquei
surpreendido com tal afirmação, principalmente por que jamais imaginaria que um
professor universitário mineiro já tivesse ouvido falar num bar e choperia
recentemente inaugurado em Poço Redondo, no sertão sergipano, município onde
está localizada a Gruta do Angico e onde Lampião e parte de seu bando foram
emboscados ao alvorecer de 28 de julho de 38.
Realmente não
sei como o professor Afrânio ficou sabendo. Talvez algum poço-redondense que
também estava lá houvesse comentando sobre a existência de tal ambiente com tão
inusitado e instigante nome: Lampião em Paris. Sendo um espaço novo,
recentemente inaugurado, até aquele momento eu também não sabia o porquê da
denominação Lampião em Paris. Somente depois, dias após retornar a Poço Redondo
é que fiquei sabendo acerca das justificativas para que o bar e choperia
recebesse tal nome. E mais adiante direi o que fiquei sabendo.
Mas não ficou
só nisso não, pois o Lampião em Paris parece já ter atravessado outras
fronteiras e causado verdadeiro rebuliço. E assim por que ao redor do nome se
formou como uma legião de defensores e de ferrenhos críticos. Significa dizer
que o nome Lampião em Paris está provocando tamanha discussão que chega ao
extremo de xingamentos. Mas também defesas encantadoras.
De um
estudioso do cangaço me chega uma estranha reclamação: “Mas Rangel, como é que
você deixa que aí em Poço Redondo, terra de Alcino, de Adília, de Sila, de
Cajazeira, Zabelê e tantos outros, além de guardar no seu território a Gruta do
Angico, que coloquem num bar um nome tão injurioso. Falar de Lampião em Paris é
o mesmo que dizer que o maior cangaceiro era afrancesado, trejeitoso,
afeminado. Já pensou Lampião falando francês e fazendo biquinho? Já pensou
Lampião passeando de calça apertadinha ao redor da Torre Eiffel?”.
E prosseguiu o
indignado amigo: “Logo vão chamar esse bar de Lampión en Parrí, com biquinho e
tudo. Avistar esse bar com tal nome é o mesmo que avistar o Capitão Cangaceiro
de camisa florida e cachecol no pescoço, sentado de perna passada, todo mimoso,
num daqueles cafés parisienses de artistas e afrescalhados. Não, isso não. É
até um crime uma coisa dessas. Se Lampião estivesse vivo certamente iria ter
uma conversinha com quem fez isso com o seu nome. Ia fazer com que o dono desse
lugar engolisse seu bar com Paris e tudo. E mais, o que esse dono acha que
Lampião foi fazer em Paris? Peça pra mudar o nome pra Lampião em Poço Redondo,
na Maranduba ou no Angico, mas não em Paris. Dizer de um Lampião em Paris é
corromper a história do cangaço e dizer que o cangaceiro maior vivia se
abanando igual uma gazela louca”.
Já outro
amigo, desta feita um renomado escritor, telefonou-me para afirmar totalmente o
contrário, pois revelou: “Estranho é, mas não deixa de ser uma bela homenagem a
um homem cuja história desde muito ultrapassou as mais distantes fronteiras.
Hoje Lampião é francês, é norte-americano, é russo, é latino-americano. Lampião
hoje está em Paris, em Quebec, em Nova Iorque, em Moscou. Dizer de Lampião em
Paris é reconhecer o além-fronteiras desse nordestino que hoje é lido e relido
pelo mundo inteiro, é estudados nas maiores e mais importantes universidades do
planeta, é cidadão universal, e tanto para o ódio como para a afeição. Coisa
boa, pois, saber que em Poço Redondo, na Capital Mundial do Cangaço, há não só
Lampião e seu bando por todo lugar, mas também em Paris. Uma Paris sertaneja,
certamente, mas um reconhecimento de que ele ainda vive e está por todo lugar”.
Do meu alado,
apenas a surpresa do quanto o Lampião em Paris de Poço Redondo tanto rebuliço
vem causando. Mas a maioria não sabe, contudo, o que realmente justificou a
colocação de tal nome num bar e choperia. Segundo fiquei sabendo, a ideia
nasceu do gosto de Lampião pelos perfumes, principalmente franceses. Sabido é
que o rei cangaceiro, mesmo vivendo debaixo do mundo sertanejo escaldante e
suarento, apreciava derramar sobre si fragrâncias importadas que lhes eram
presenteadas pelos coronéis e suas madamas. Assim, o Lampião em Paris seria uma
homenagem a essa perfumada vaidade do Capitão.
Mas também por
que Lampião pode ser encontrado em todas as ruas, esquinas e cafés de Paris.
Cartazes, livros, folhetos, sempre confirmam a presença do rei do cangaço em
meio a um mundo tão perfumado. Ainda que por lá não se goste muito de tomar
banho.
Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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