Por Francisco
Jarismar
“Você não é
minha esposa, é um anjo da guarda que Deus enviou” (Corisco)
Na semana em
que homenageamos as mulheres não vou falar da Madre Tereza, nem da irmã Dulce,
nem da Rainha Elizabeth II, nem da dama de ferro Margareth Teather, tampouco de
nossas mães, esposas e filhas.
Vou dizer de
Dadá, a companheira de Corisco, a flor do mandacaru. O símbolo da fortaleza, da
feminilidade e da coragem da mulher sertaneja. O elo entre o sofrimento e a ressignificação da vida. Do espargimento do amor verdadeiro, sem culpas e sem
ressentimentos.
Nascida Sérgia
Ribeiro da Silva, apelidada de Dadá, em Belém do São Francisco-PE, em 25 de
abril de 1915, a filha de seu Vicente Ribeiro da Silva e dona Maria Santana
Ribeira da Silva foi arrastada do seio familiar para as hostes do cangaço, aos
12 anos, em 1927, por Cristino Gomes da Silva Cleto, o famoso cangaceiro
Corisco. Numa ação perversa e desumana o “Diabo Loiro” a sequestrara, na mais
tenra infância, e a sentenciara a vida errante nas caatingas como rechaço por
uma querela de coiteiros.
A menina foi
violentada em sua pureza e ainda que as bonecas povoassem o seu universo o ódio
se fez nascer por aquele homem cruel, grosso e indelicado. As marcas da
violência física e moral delongaram-se em transmutar-se. A adolescência perdida
conheceu todas as dores que o sertão tinha a oferecer.
Sem alternativas
outras, Dadá se deixa letrar e aprende o manuseio das armas, sob as instruções
de Corisco. Única cangaceira a atirar de fuzil, também não arredava do seu 38
colt cavalinho e a ela foram atribuídas todas as mortes por arma pequena nas
baixas dos “macacos”.
Mas o tempo,
que é o dono de tudo, faz o seu papel de forma paciente e precisa. E assim, o
algoz passa a vítima da presa numa ressignificação existencial de que só o amor
é capaz. Dadá alcança patamares de fama que poucos cangaceiros conseguiram.
Nos 12 anos de
vida cangaceira recebeu inúmero elogios de Lampião: – O homem que tem uma
mulher como Dadá, nunca está só. Compadre Corisco é homem de sorte!. Labareda,
outro cangaceiro, disse: – Dadá valia mais do que muito cangaceiro. Já um
coiteiro afirmou: – Metade da força de Corisco está em Dadá.
O ódio por
Corisco se transforma em um amor indescritível e a saga do casal ultrapassa a
tragédia de Angicos, (onde findam Lampião, sua Maria e mais 9 companheiros)
como que a exigir um desfecho próprio, um desenlace singular para um amor que
ainda tinha provas a dar.
Em meio a Moça
de Cirilo, Nenêm de Luiz Pedro, Leonilda de Azulão, Inacinha de Gato, Maria de
Ferrugem, Noca de Mormaço, Otilia de Mariano, Leonora de Serra Branca, Cristina
de Português, Lilia de Moita Braba, Lídia de Zé Baiano e Maria de Lampião, Dadá
chamava a atenção pela sua coragem. Superara todas as ofensas que poderiam lhe
fazer. Foi apelidada, por um coiteiro, de “Nêga Pau” em referência ao seu
destemor da vida e dos homens.
Dadá era
valente, debatia, opinava e chegava a espantar cangaceiros do bando por conta
da sua forte personalidade. O machismo não admitia manifestação feminina. Mas
Dadá era mandona e chegou até mesmo a alvejar o cangaceiro Caixa de Fósforo,
quando o mesmo questionou sua fala. Dadá chegava a interferir nas ações do
bando!
O cangaço
definha com a morte de Lampião, os sobreviventes ao massacre de Angicos-SE, em
1938, debandam. O governo Vargas promulga a lei de anistia aos cangaceiros, em
1940. Muitos negociam sua rendição, mas Dadá não permite a Corisco esse gesto.
Cuida do companheiro gravemente ferido até o último momento. Retribuindo com
carinho, atenção e zelo todos os feitos do companheiro em seu favor e colocando
um lajedo sobre as memórias trágicas da infância perdida.
O romance da
caatinga tem trágico fim. Em 1940, em uma emboscada, o Tenente Zé Rufino, “O
matador de cangaceiros”, mata Corisco e fere traumaticamente a perna direita de
Dadá, contudo não lhe permite a morte pelos volantes. Um deles ainda bravata: –
Vamos acabar de matar essa puta!, ao que ela de pronto responde: – Me dá o
fuzil e me chama de puta! Eu te toro pelo meio! Eu mato esse macaco miserável!
Dadá foi
esposa, mulher, pariu 7 filhos (3 sobreviveram) que não pode criar. Foi
companheira inarredável de Corisco até o fim. Se a morte de Corisco sela o fim
do cangaço, a morte de Dadá, em 07 de fevereiro de 1994, sepulta a bravura
indômita da mulher sertaneja.
Mais de trinta
anos depois Zé Rufino lhe diria: “Dadá, você nasceu errado, devia ser homem, em
muito lugar do sertão, você tinha mais nome que Lampião”. Deus salve as
mulheres, Deus salve Dadá!
https://www.facebook.com/groups/lampiaocangacoenordeste/
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