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quinta-feira, 5 de abril de 2018

EPISÓDIOS DA VIDA DE LAMPIÃO - PARTE 1 - CONTINUAÇÃO/FINAL



A Estação Ferroviária de Rio Branco, com o nome de “Barão de Rio Branco”, dada pela Great Western of Brazil Railway, empresa inglesa que administrava as vias férreas de Pernambuco, era a última da rede ligando Recife ao Sertão. Posteriormente, prolongou-se até Salgueiro/PE (512 km do Recife). Naquela época, Rio Branco era distrito de Pesqueira (40 Km de Rio Branco), agreste pernambucano.

Como almocreves, Virgulino, seu pai e seus dois irmãos, seguiam também para Pesqueira, para levar para o sertão: da estação ferroviária daquela cidade, mercadorias despachadas pela central do Recife; de uma mercearia da cidade, aguardente (cachaça) e, de uma mercearia, sacas de massa do reino (trigo) e as bolachas “Sertanejas”, muita apreciadas pela pelas pessoas do Interior.

Uma informação aos nãos nordestinos. Alguns estudiosos consideram “bolacha” e “biscoito” como sendo a mesma coisa. No entanto, no Nordeste chamamos de “bolacha” o produto, seja ele doce ou salgado, fabricado, quase artesanalmente, pelas padarias. O termo “biscoito” chega a ser uma convenção da indústria brasileira, talvez por ser mais antigo do que “bolacha” na nossa língua, segundo os etimologistas.

Em 1913, um dos maiores homens de negócios da região, originário da então vila de Poção, município de Pesqueira (Hoje uma pequena cidade, cujo principal atrativo é a produção da peças, como colchas, almofadas, etc. de renda conhecida por Ranascença, de origem europeia), e também um grande caçador de onças (existiam naquela época) passou para o seu genro duas peles de onça pintada, que matara na serra do Acaí, em Poção, para serem entregues a um amigo residente em Rio Branco. A entrega foi feita pelos almocreves Ferreira.

A almocrevia foi uma das grandes atividades que facilitou a vida de cangaço de Virgulino. Ele percorreu diversas regiões, parte do agreste ao sertão pernambucano e o sertão alagoano, muitas das vezes a pé. Conheceu muita gente, dos mais simples agricultores e comerciantes a grandes e médios proprietários de terras, os poderosos fazendeiros e coronéis, muitos dos quais tornaram-se seus “coiteiros”.

Quando tinha cinco anos de idade, Virgulino foi levado por sua avó, Dona Jacosa, para morar na sua casa, distante apenas cinquenta metros da casa paterna. O menino admirava a agilidade da sua avó nos trabalhos de tecer rendas. Talvez tenha sido esses momentos que lhe inspiraram as primeiras estrofes de “Mulher Rendeira”.

Quando menino, Virgulino gostava de brincar de guerras com os companheiros, usando batoques e talos de bananeira. Eles se dividiam em grupos adversos a que dava o nome de Pereiras e Carvalhos (famílias altamente rivais da região) ou de Antônio Silvino e volante da polícia.

Muitos anos mais tarde, o velho Terto, seu parente, de Inajá, participante desses divertimentos, dizia: “Virgulino nasceu para Comandar. Nas brincadeiras de menino, apesar de ser ele o mais pequeno, era ele o que tinha iniciativa. Se tivesse no Exército, botava Caxias para trás!” (Lampião Seu Tempo e Seu Reinado – Frederico Bezerra Maciel)

Não existiam escolas públicas naquelas terras desamparadas. Havia, sim, os mestre-escola que ensinavam, mediante contrato e hospedagem, durante períodos normalmente de três a quatro meses, nas fazendas. Lampião aprender a ler e escrever com algumas limitações, com o um desses professores. Os irmãos Antônio e Livino não tiveram oportunidade de frequentar regularmente a escola, devido os seus trabalhos no campo, por serem mais velhos do que Virgulino.


Virgulino costumava ler a História de Carlos Magno e os Doze Pares de França e a História de Napoleão Bonaparte em edições simples, talvez até em cordéis, como aqueles onde os poetas populares exaltavam os heróis da terra, como os vaqueiros, os cangaceiros, cabras valentes que lutavam até com o cão (demônio) Ele comprava os folhetos de cordel para ler, decorar e cantar no pinicado da viola ou na sanfona de oito baixos, da qual já tirava acordes, desde os nove anos de idade.

Não fosse o destino cruel de Virgulino e dos dois irmãos, teriam eles constituído lar onde viveriam felizes pelo resto da vida.

Livino namorou uma jovem de cor branca filha de um fazendeiro. Antônio namorou sua prima legítima Licor.

Virgulino apaixonou-se pela primeira vez por uma linda jovem chamada Santina. Teve também uma paixão oculta pela sua prima Gertrudes, irmã de Licor, porém jamais se manifestou em virtude das perturbações surgidas contra a sua família, provocadas pelo seu vizinho Zé Saturnino, que terminaram por leva-lo e aos irmãos ao cangaço.

Aos catorze anos de idade, Virgulino foi conduzido à “zona” (cabaré, zona de meretrício) por dois amigos, adolescentes como ele e já iniciados, Abel de tal e José Pereira da Cunha, o qual seria mais tarde o cangaceiro Ventania.

Próxima Postagem: Parte 2 – O Começo de Tudo
Ruy Lima 02/04/2018

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