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segunda-feira, 7 de fevereiro de 2022

CANGAÇO E O CORONELISMO.

Por Honório de Medeiros - [Historiador e sócio do IHGRN]

O coronelismo e o cangaço, tão característicos de certo período histórico do Sertão nordestino brasileiro, mais precisamente de meados do século XIX a meados do século XX, são manifestações do Poder, de como ele é obtido, mantido e até mesmo combatido, em intrincada trama, ao longo do processo histórico.

As narrativas acerca do coronelismo e cangaço devem ser analisadas levando-se em consideração o fator de "ocultamento" próprio da atuação dos que detêm o Poder. Nesse sentido, escrever, dizer, omitir, acrescer, manipular, enfim, tudo isso e mais, cumprem o papel de narrar como os fatos ocorreram a partir da perspectiva de quem pode impor sua percepção das coisas e dos fenômenos, em detrimento da verdade. Quem critica o estudo do Cangaço, mesmo de forma oblíqua, tratando-o como algo menor dentre os epifenômenos da cultura sertaneja, hostiliza a História e não entende o que é o Poder.

Não houve manifestações violentas do Coronelismo no Sertão nordestino sem um entrelaçamento com o banditismo rural; não houve Cangaço sem Coronelismo. Acrescentemos a esses ingredientes o fanatismo messiânico e teremos um ponto-de-partida concreto e verossímil para a real história da época dos coronéis e cangaceiros. O ponto-de-partida é o cangaceiro, começando com Jesuíno Brilhante, o primeiro dos grandes, a história dos coronéis do Cariri cearense, e a vida do mítico Padre Cícero do Juazeiro.

No Rio Grande do Norte é difusa, porém persistente, a concepção de que seus coronéis eram homens afastados da violência, bem como é persistente a concepção de que o cangaço, excetuando a invasão de Apodi, por Massilon, e Mossoró por Lampião, tratados como “pontos fora da curva”, pouca relevância teve em nosso Estado.São "esquecidas" as relações dos coronéis com José Brilhante, o Cabé; a do Coronel João Dantas com Jesuíno Brilhante; a invasão de Martins; a invasão de Apodi e sua relação com coronéis apodienses; a invasão de Mossoró e sua relação com coronéis paraibanos e cearenses; a morte de Chico Pereira e sua relação com o coronelismo paraibano e potiguar.

As invasões de Apodi e Mossoró são indissociáveis, e se constituem em epicentro de um processo político que durou aproximadamente dez anos, terminando tragicamente na famosa eleição de 1934-1935,na qual houve o assassinato do Coronel Chico Pinto e o de Otávio Lamartine, filho do ex-governador Juvenal Lamartine, e dizem respeito a disputas políticas entre famílias senhoriais do Sertão paraibano e potiguar. Todas essas atividades violentas protagonizadas por cangaceiros estão conectadas com o coronelismo. Todas elas são faces da disputa pelo Poder Político.

O cangaço é a história de homens que resolveram se vingar de uma injustiça; de homens que não aceitaram ser escravos e optaram por fazer das armas meio-de-vida; de homens que optaram por sobreviver SEM LEI E SEM REI, em uma liberdade absoluta, uma liberdade de fera, aquela liberdade anterior ao surgimento do Estado, da qual nos falou Hobbes em O Leviatã.

O cangaço é a história de rebeldes, certos ou errados. Podemos subjugar rebeldes. Podemos condenar rebeldes. Podemos matar rebeldes. Mas não podemos impedir que a memória de suas existências nos provoque. Podemos não aceitar os rebeldes, mas podemos tentar compreendê-los, tenham sido cangaceiros, coronéis, ou fanáticos, e em os compreendendo, aprendermos as lições da história.

http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/cangaa-o-e-coronelismo/455191

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