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quinta-feira, 24 de maio de 2012

UMA GENTE DECENTE (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa*
Rangel Alves da Costa

UMA GENTE DECENTE

A decência é virtude ausente em muitas pessoas. Tem gente que prima pela falta de compostura, pelo indecoro, pela desonestidade. E não é difícil encontrar por aí quem anda e vive no descompasso de todas as regras sociais.

Contudo, talvez a indecência se alargue e se estabeleça tanto e por todos os lugares, alcance a maioria das pessoas, simplesmente pela inobservância dos princípios éticos e morais, pela falta de valorização própria, pelo senso de levar uma vida afeta ao tanto faz. Ao descuidar de si, então que as atitudes negativas sejam as consequencias mais óbvias.

Mas também é fruto da linhagem familiar, da raiz hereditária, do meio em que foi criado e do contexto social em que permeia. Quando se afirma sobre a força familiar não significa que a família seja tradicional, poderosa ou rica. Não. Essa solidez familiar está presente na família mais humilde e é fruto exatamente dos limites que ela se impõe para sobreviver enquanto clã respeitado.

A família que não abre de vez as portas para que o imprestável vá chegando e se instale estará preservando os seus membros das consequencias mais nefastas. Uma família que encobre ou passa a admitir os erros praticados pelos seus estará inexoravelmente fadada a se contaminar. E por causa dessa aceitação vai perdendo respeito, sendo desvalorizada, esvaziando sua feição de decência.

Por conta disso, aquele que nasce e convive em meio familiar que preza pela honradez certamente estará menos propenso a erros gratuitos. De certa forma o núcleo embrionário serve como espelho e parâmetro, se constitui em algo que procura preservar, e fazendo isso estará também se preservando contra as tantas influências negativas que surgem.

Porque não se deve desprezar tal entendimento, vez que uma maior acuidade sobre o tema tratado levará à conclusão da verdade no que foi exposto, então logo será mais fácil entender o porquê de a gente sertaneja, aqueles humildes filhos dos sertões nordestinos mais distantes e esquecidos, possuírem maior privilégio de decência.

A decência da gente sertaneja é fruto do próprio meio em que vive e da valorização familiar existente ali. Nos acanhados centros urbanos, nas povoações mais afastadas, nas fazendas, nas moradias dispersas pelas vastidões das matarias, em qualquer lugar onde esteja instalado um núcleo familiar, geralmente estarão pessoas lutando pela preservação das raízes, por tudo aquilo que têm respeito maior, pela continuidade da decência que já vem desde os tempos mais antigos.

Para se ter uma ideia, mesmo que seja impossível de controlar os atos da ramificação parental, há sempre uma preocupação de que determinada atitude individual não atinja a honra familiar como um todo. E para que isso ocorra procuram incutir na mente dos mais novos os exemplos dos pais, dos avôs, bisavôs, de toda a geração. E dizem que o avô era pobre mas nunca precisou pegar no que é dos outros para sobreviver. E do mesmo modo dizem que a família sempre foi pobre mas sempre foi respeitada.

Por conta disso, pelos exemplos e pela pressão familiar recebida, o sertanejo tende a viver muito mais com dignidade do que desonestamente. Muitas vezes vivendo em estado de lastimável pobreza, ainda assim procura se comportar com o decoro maior do mundo. Reconhece seus limites, sabe que não adianta fingir ser ou ter aquilo que não lhe é possível no momento, posiciona-se diante do mundo apenas como ser humano igual aos outros, sem vergonha nem ressentimento de nada.

Muitas vezes a chinela é uma simples havaiana, um chinelo de couro cru ou um sapato já a se desfazer; a roupa rasgada veste do mesmo jeito; uma camisa nova, uma calça mais arrumadinha, só mesmo para os dias festivos ou importantes. Qualquer coisa serve para vestir e bem vestir essa gente, qualquer coisa serve para agradar esse povo, pois pessoas agradecidas demais, principalmente pela vida.

Daí a decência maior, a grande dignidade na humildade, a compostura ética e moral, a verdade no jeito de ser e falar, no jeito de ser tão sertanejo. 

Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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