DEPOIMENTO
DE NATÁLIA QUEIROZ SOBRE A INVASÃO DE LAMPIÃO A MOSSORÓ EM 13/06/1927
Esse
texto foi extraído do meu livro “MEMORIAS DE UM TEMPO FUGAZ”, que será
publicado em breve. Está na fase de revisão para depois ir ao prelo. Eis
a entrevista:
P - Onde a
senhora estava na véspera do ataque de Lampião a Mossoró? A senhora fugiu no
trem para Areia Branca?
N - Estava na
casa do prefeito Rodolfo Fernandes com um grupo de amigos e familiares, todos
curiosos com a evolução dos acontecimentos, pois o ataque de Lampião a Mossoró
poderia acontecer a qualquer momento.Sei bem que Júlio Maia ( um dos líderes da
resistência e primo do Prefeito), chegou e disse que nós tínhamos que ir também
para Areia Branca de trem. Continua Natália – os homens estavam se organizando
em trincheiras. O prefeito foi muito corajoso, decidido, isso é que é a
verdade., Acho que fomos no último trem, já muito lotado. Foi uma verdadeira
folia. Eu era muito jovem, claro que estava com medo mas naquela idade tudo era
aventura. Eu ainda não conhecia João Almino. Passamos três dias em Areia
Branca. Era tanto boato! As informações eram desencontradas, mas voltamos
no primeiro trem.
P - Já sabiam
que Lampião havia sido derrotado?
N- deram ordem
para a gente voltar, pois Lampião já havia saído, mas tinha sempre aquelas
pessoas que duvidavam de tudo. No percurso, acho que já bem perto de Mossoró,
avistamos um carro e o trem diminuiu a marcha para saber notícias. Nessa
ocasião o pai de Idália, (esposa de Chico Xavier de Queiroz), o senhor Antonio
do Carmo, muito nervoso perguntou ao motorista do carro em voz alta, como
estava a cidade. O motorista respondeu:- “tudo em paz”, mas ele entendeu “tudo
em bala” .Ficou então gritando para o trem parar.E dizia : – Ta vendo, tudo em
bala”. Foi um verdadeiro alvoroço. Algumas pessoas choraram, mas o maquinista
desceu e foi conversar com o motorista do veiculo ficando esclarecido que
estava tudo em paz. O trem prosseguiu viagem.
P- O trem estava muito cheio?
N- sim estava
mas nem todo o pessoal que tinha ido a Areia Branca voltou naquele dia, alguns
ainda permaneceram por vários dias e a cidade de Mossoró ainda passou quase um
mês com boatos. Diziam que Lampião ia retornar ou que estava na passagem do
rio. Lembro-me de Jararaca na cadeia, fui olhar. Dr. João Marcelino foi o
médico que o atendeu. Dizem que Jararaca foi enterrado vivo, pelos
policiais que iam levá-lo para Natal.
P- O que aconteceu após a fuga de Lampião?
N- Sim,
mas o bando de Lampião fugiu em direção a Jucuri e de lá até a fazenda Veneza,
que era uma propriedade de Alfredo Fernandes. O gerente dela era Childerico
(Childerico Fernandes de Souza), primo de seu pai. Chegaram de manhã
cedo (dia 14). A Bebela (Felisbela Rodrigues Fernandes) me disse muito depois o
sofrimento que passaram. Acabaram com toda a comida existente lá, estoque de
carnes, mataram muitas galinhas a tiro e mandaram fazer comida. Eram mais
de 50 cangaceiros. Saquearam tudo e ainda levaram 15 contos de reis que
Childerico estava guardando para compra de umas reses. Bebela me disse também
que só conseguiu guardar um queijo que caiu e ela jogou para debaixo de um
armário. A certa altura Lampião perguntou se Childerico era primo do prefeito.
Ele disse que sim. Não houve confusão por isso, mas tinha um cangaceiro
chamado Massilon que evitou muito as agressões que alguns queriam fazer. Eles
ficaram na fazenda por todo o dia 14 e depois seguiram para Limoeiro do Norte.
Concluiu Natália: – eu não conhecia ainda João Almino. Minhas amigas é que falavam dele e diziam que ele era irmão de Celso Almino. Ora, se eu também nem sabia quem era Celso.
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