A
religiosidade praticada em torno do padre Cícero representava “aceitação” das
regras políticas e sociais da República
Cícero Romão
Batista* é cearense, o líder religioso do povo sertanejo oprimido pelo
latifúndio, pelo Estado e por uma Igreja distante e ausente. Nasceu no
Crato, em 1844 e faleceu em Juazeiro do Norte em 1934, aos 90 anos de
idade. O “padroeiro do Nordeste”, pessoa influente na região, foi o
fundador de Juazeiro do Norte, em 1872. Além de orações e bençãos,
“padim” aconselhava seus “afilhados” sobre atividades econômicas, doenças,
questões familiares, desavenças, e sugeria nomes de candidatos para as
eleições. Participante ativo da política, envolveu-se nas disputas que
envolviam mortes entre as oligarquias das famílias dos “coronéis” do sertão
nordestino. Ligado aos “coronéis”, aos jagunços e aos cangaceiros.
Foi prefeito, deputado federal, e vice-governador. “Padim”, é
lider, mediador, curador, aconselhador, padrinho e santo.
Ainda jovem,
aos 28 anos, foi suspenso pelo Vaticano do cargo de vigário de Juazeiro, mas,
construiu uma igreja em torno da qual se formou uma comunidade. Sua liderança
foi ainda mais misturada ao intenso misticismo e fanatismo do seu povo, que
padecia fome e sede no sertão do Ceará. No início do Século XX surgem bandos
com o intuito de vingar injustiças e mortes de suas famílias. Para combater
esse novo fenômeno social, o Poder Público cria as "volantes". Nestas
forças policiais, os seus integrantes se disfarçavam de cangaceiros, tentando
descobrir os seus esconderijos. Logo, ficava bem difícil saber ao certo quem
era quem. Do ponto de vista dos cangaceiros, eles eram, simplesmente, os
"macacos". E tais "macacos" atuavam com mais ferocidade do
que os próprios cangaceiros, criando um clima de grande violência em todo o
sertão nordestino. Nesse contexto, surge a figura do Padre Cícero Romão
Batista, apelidado pelos fanáticos até hoje, de “Santo de Juazeiro”, que nele
vêem o poder de realizar milagres. Endeusado nas zonas rurais nordestinas, o
Padre Cícero conciliava interesses antagônicos e amortecia os conflitos entre
as classes sociais. Em meio a crendices e superstições, os milagres (muitas
vezes, resumidos a simples conselhos de higiene ou procedimentos diante da
subnutrição) atraem grandes romarias para Juazeiro, ainda mais porque os seus
conselhos erão gratuitos. O Santo de Juazeiro, contudo, a despeito de ser um
bom conciliador e uma figura querida entre os cangaceiros, utilizava a sua
influência religiosa para agir em favor dos "coronéis", desculpando-os
pelas violências e injustiças cometidas. Teve como ferrenho inimigo o bispo Dom
Joaquim, que o delatou a Roma, o que veio a causar o impedimento de padre
Cícero ministrar os sacramentos, realizar missas, batizados e casamentos, e,
até hoje ainda não estar reabilitado perante o clero romano. Padre Cícero
encontrava soluções para tudo: Segundo referem alguns velhos que ouviram de
seus ascendentes, a festa de Nossa Senhora das Candeias em Juazeiro se deve ao
fato de um seu afilhado ir queixar-se de estar passando fome porque não estava
vendendo nada na sua sucata, então o padre Cícero mandou que ele começasse a
fabricar lamparinas de latas, o homem obedeceu e no domingo, na hora da missa o
padim anunciou que doravante haveria uma procissão de Nossa Senhora das Luzes
e que todos levassem não velas, mas lamparinas, então, todos passaram a se
apegar a Nossa Senhora das Candeias. O sucateiro não dava vencimento e
trabalhava: Abria as latas durante a noite e pela manhãzinha ia soldar, fato
que lhe trouxe algumas reclamações “de incomodar o sono dos vizinhos”, mas que
também foi resolvido pelo padim. Mas não foi só isso. Com o aviso da procissão
toda a cidade (que andava meio parada), se mobilizou: chegavam e partiam
caminhões para abastecer com o querosene e os caminhoneiros levavam a notícia,
chegavam os caminhões pau-de-arara com romeiros, abriram-se mercadinhos,
restaurantes, hospedarias, o povo apanhava latinhas nas ruas, as sucatas
compravam e vendiam, os artesãos fabricavam terços, as gráficas catecismos e
santinhos, os mascates se misturavam às multidões de romeiros de todos os
lugares... A um ato do padim Ciço Juazeiro prosperava... Hoje a cidade de
Juazeiro do Norte, do Ceará, é local de peregrinação e túmulo do padre Cícero.
É centro comercial, centro de artesanato e centro turístico, para lá afluem
durante todo o ano peregrinos para pagarem promessa de curas e milagres do
"padim", visitarem a sua casa onde tem estátuas dele e seu cotidiano,
comprarem fitas bentas e santinhos, assistirem missas, principalmente a missa do
chapéu em que a multidão agita chapéus de palha de carnaúba, (contam que o
corpo de padre Cícero foi exposto por um momento, aos fiéis na janela de sua
casa, e, um de seus afilhados - como eram todos - rapidamente subiu atá a
janela, tirou o chapéu e tapou o sol do rosto do "padim" impedindo
que o sol lhe incomodasse) e subirem até o monte do horto onde está a sua
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