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sábado, 25 de outubro de 2014

‘A “LEI” DO FORA- DA- LEI’


“(...)Além de muito religioso, Lampião dizia-se um grande justiceiro... Vejamos como aplicava sua justiça, segundo a narrativa de um participante da tragédia. Estávamos acampados em Lagoa do Rancho, no interior da Bahia. Depois de alguns dias, estourou um escândalo: O dono da fazenda onde estávamos queixou-se a Lampião de que um dos seus “cabras” havia estuprado sua filha. Lampião seguido pelo bando, foi ver a filha do fazendeiro, e o quadro a que assistimos era triste:

a mocinha estava num estado lastimável. O autor do ato bárbaro fora Sabiá, um rapaz com 18 anos mais ou menos, e novo no Bando. Praticado o atentado, Sabiá fugiu para o mato. Lampião, depois de ver o estado em que ficou a filha do fazendeiro, falou secamente: 

- Volta Seca e Gavião, vão buscar o Sabiá”. 

Eu e Gavião saímos à procura de Sabiá, quando nos aproximamos do local ele estava entrincheirado, e gritou: 

- Não avancem, eu abro a cabeça dos dois com uma bala: 

- Sabiá, o capitão quer falar com você! 

– Se ele quer falar comigo, venha ele mesmo me buscar!

Achei muita ousadia, mas não tentei capturá-lo... Olhei para o meu camarada e retornamos á fazenda. Lampião quando nos viu sozinhos, perguntou indignado: 

- Cadê ele?” 

– Sabiá está entrincheirado, ali, embaixo atrás de uma pedra; 

- Porque não trouxeram ele?

– Porque ele nos matará; nós dissemos que o Capitão queria falar com ele. Mas ele respondeu: Pois venha ele mesmo se quiser. Foi a conta! A testa de Lampião franziu-se, os lábios se comprimiram e, serrilhando os dentes disse:

- Eu vou buscar esse cão.
- Não avance nem mais um passo, capitão, que eu atiro! Ninguém vai me pegar, dizia Sabiá.

Lampião olhou-o por um momento e, de repente, falou:

- Você não atira em ninguém, menino. E avançou. Avançou resoluto, com Sabiá fazendo pontaria para ele. A todo instante eu esperava o estampido assassino do fuzil de Sabiá. Mas o tiro não saiu. Frente a frente com Sabiá, Lampião gritou: 

-Atira, cachorro! Atira!

E Sabiá não atirou... Pelo contrário, arriou o fuzil. Foi seu fim pois Lampião, rápido, deu com a coronha de seu fuzil na cara do rapaz, que rolou pelo chão, ensanguentado. Eu e Gavião aproximamo-nos depressa do local e Lampião mandou que o levássemos à fazenda. Desarmei Sabiá, eu de um lado e, Gavião do outro. Levamo-lo de volta, enquanto Lampião ia à frente, a passos rápidos. Sabiá estava tonto, com a boca arrebentada e todos os dentes da frente quebrados. Sangrava muito e vinha amparado por mim e Gavião. Na fazenda, todos se acercaram de nós. Eu sabia que a coisa ia ter um fim trágico, pois Lampião estava furioso. Foi feito um círculo de gente e, no meio dele, Sabiá, ladeado por mim e Gavião com Lampião na frente, que olhava sem afastar por um segundo sequer os olhos de Sabiá. Olhava-o com ódio, sem dizer nada, e o silêncio era completo, pois ninguém ousava falar Sabiá mal se aguentava em pé. Estava vencido. Vencido e convencido. Lampião, então, pôs-se a falar: 

- Vais morrer porque não presta, cão. É por causa dessas coisas que falam mal da gente, por ali. Mas eu te dou um exemplo, pra todos saberem que o bando de Lampião tem vergonha. E apontando para dois empregados da fazenda, ordenou: 

- Vocês dois ali, cavem um buraco pra enterrar esse cabra! 

Os homens obedeceram e, de enxada em punho, puseram se a abrir a cova. Sabiá não falava e tenho até impressão de que não compreendia o que se passava. Depois de alguns minutos, a cova pronta, isto é dada como pronta por Lampião, apesar de não ter mais de dois palmos de profundidade, mandou ele que os dois homens parassem e, apanhando uma “Berbere”, apontou para a cara de Sabiá, que nem moveu a cabeça. Quem estava atrás de Sabiá correu pra se abrigar. Lampião fez a pontaria e gritou: 

- Vai-te pros infernos, cão! E deu no gatilho! 

Sabiá caiu morto, mas Lampião continuou a atirar. Houve quem contasse quinze tiros... Aquela expressão: “Vai-te pros infernos, cão” era muito comum a Lampião, quando matava alguém naquelas condições. Saciada sua fúria assassina, Lampião ordenou aos dois empregados que abriram a cova: 

- Joga este peste aí! Cachorro se enterra de qualquer jeito(...).

Fonte : PORTO, Onélio José. Pingos e respingos. Gráfica Mauro Morais Ltda, 1976.
Pag. 44, 45, 46 e 47.

Fonte: facebook
Página: Sálvio Siqueira

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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