Por Rangel Alves
da Costa*
As alegrias
existem, todos sabem. As exultações e os contentamentos também. Neste momento
muitos estão sorrindo, felizes, satisfeitos, bem sei. Dádiva ao que encontra
sua motivação, sua propensão ao instante de alma confortada e cheia de graça.
Muitos têm momentos assim, experimentando todo o encanto da vida e do mundo.
Mas agora apenas silencia e entristece.
Há muita
tristeza neste momento, por todo lugar. Aliás, é muito mais um permanecer do
que um estar. Pessoas existem onde as tristezas parecem uma constância sem fim.
Ainda que os sorrisos despontem e as alegrias aflorem, tudo se afeiçoa mais a
um véu sobre a face do que mesmo reflexo de um estado interior. É como se a
aparência, fingindo um estado emocional, tentasse resguardar o verdadeiro
sentimento.
Não será
preciso nenhuma motivação dolorosa. As perdas, os adeuses, as distâncias, as
saudades, as desesperanças e desilusões, provocam sofrimento e não tristezas.
Estas não necessitam de acontecimentos ou de fatos, de memórias ou recordações,
para se revelarem. Por ser algo inato, que já se encontra interiorizado, então
suas motivações aparecem até mesmo num instante de festa.
Alguém diria:
tristes das tristezas tão tristes. E acrescentaria: uma bela pintura numa
moldura angustiada e melancólica. E terminaria afirmando: talvez não seja
correto pensar assim, vez que a beleza da pintura pode mesmo estar na feição
entristecida de sua moldura. Mais acertado pensar assim, pois as faces tristes,
por não estarem marcadas pelo grito silencioso nem pela pujança da dor, mas
apenas pelo desalento, acabam se tornando singelas e cativantes.
É fácil
reconhecer pessoas assim, de tristes tristezas tristes. Elas caminham pelas
ruas como se estivessem distantes de tudo, falam com as pessoas sem emoção ou
afagos, caminham sem pressa ou correria, levam no olhar uma direção às
distâncias, aos horizontes, aos desconhecidos. Seus olhos se ausentam do
fulgor, do brilho, da incessante busca pelas paisagens. Mesmo abertos e
voltados para pessoas ou lugares, não se pode afirmar que esteja enxergando
alguma coisa.
Há assim uma
pessoa debruçada na janela ao entardecer. Mesmo diante de uma paisagem bonita,
mesmo perante as alegrias que passam, simplesmente permanece alheia a tudo. A
lágrima não escorre pela face, mas quem a avista logo imagina um rio se
derramando a qualquer momento. Mas não chora. Não é tristeza de chorar, apenas
de sentir, de vivenciá-la em todos os sentidos, até que ela se resguarde sem ir
embora de vez. Eis que a tristeza sempre permanece com seus invisíveis sinais.
Não está no
velho solitário sentado no banco da praça, mas está na mocinha recolhida ao seu
quarto, com a luz apagada. Não está na pessoa que vive puxando o lenço para
enxugar os olhos por todo lugar, mas está naquele que sobe ao monte e ali no
cume permanece sem pensar em retorno, sem sequer perceber que a noite chegou.
Não está na notícia, no espanto nem no convívio de difícil situação, mas está
no olhar que saindo à porta e vai se alongando pelas distâncias, além das
nuvens, além das montanhas, além de tudo, ainda que pouco importe que alguma
coisa possa ser avistada.
A verdade é
que as tristezas tristes são as tristezas mais belas que existem. São como as
sublimes poesias que enternecem ao invés de afligir a alma, são como os versos
escritos como folhas de outono, como solidão de jardim, como florada que vai se
embalando pela ventania. Por detrás da vidraça embaçada, em tardes chuvosas, a
um olhar tristonho de tristeza triste. E ninguém afirmará da dor perante uma
expressão de puro sentimento.
Há no silêncio
e na solidão um chamado a essa tristeza, a essa tristeza tão triste. Porém nem
tudo mundo poderá senti-la. Somente os que assim a vivem compreendem o mistério
dessa lágrima que nunca necessita ser chorada para desaguar pelo mar sem fim,
pelo além-mar da alma e do sentimento.
Poeta e
cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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