Por Sálvio Siqueira
Em certa data
do ano de 1924, O “Rei do Cangaço” se envereda por veredas na base da Serra do
Catolé.
Tinha o chefe cangaceiro de ir buscar ‘encomendas’ para abastecimento do bando, encomendados a gente de confiança.
Usando de táticas praticadas lá do outro lado do Atlântico, determinados ‘coronéis’ abasteciam Lampião, com armas, munição, vestimentas e alimentos na base do toma lá da cá. Ao prestar um ‘favor’ ao bandoleiro, com certeza esse seria cobrado, mais dia menos dias... E nada melhor do que estar em uma rede, no alpendre da casa grande da fazenda, e seu, ou mesmo seus, inimigos serem atacados, feridos ou mesmo mortos por um bando de foras-da- Lei. Nada juntava aquele ‘coronel’ aos fatos ocorridos. E tudo se pode dizer do filho de Zé Ferreira, menos que ele descumpriu uma palavra dada, ou entregou alguém que lhe tenha ajudado.
Pois bem, nesse dia, 24 de março, seguindo com dois de seus ‘cabras’, quis o destino que o comandante Theófannes Ferraz Torres e sua volante, se depara com o pequeno grupo. Inicia-se o tiroteio e um projétil penetra no calcanhar do “Rei Vesgo”, traspassa a parte atingida e penetra na barriga do animal em que ia montado.
O animal despenca e, ao cair, cai por cima da perna de Lampião. O animal, desfalecido, está com todo seu peso em cima da perna do cangaceiro que, tenta, estrebucha e, só a muito custo e esforço, consegue retirar sua perna de debaixo do corpo do animal.
Os dois
cangaceiros que seguiam com o chefe seguram o fogo para que a volante não
termine de matar seu chefe, nem a eles. Após se desvencilhar daquele peso,
Lampião pega seu rifle e a coisa muda de figura. Tiroteando como só ele
conseguiu tirotear, consegue dar uma guinada de 360° na situação, atingindo
vários militares. Consta no Boletim emitido pelo comandante da volante que os
casos mais graves seria do “soldado Manoel Gomes Sá e do Anspeçada Manoel
Amaral de Souza”. (Lampião – entre a Espada e a Lei” – DANTAS, Sérgio Augusto
de Souza. 1ª edição)
Na obra acima citada, há um relato de uma entrevista dada por Vanderley Pereira Nunes, a qual transcrevo na íntegra:
“Aquele foi o
primeiro ferimento de gravidade que Lampião sofreu. Não sei de outro ferimento
antes deste. Dizem que foi o próprio Major Teófhanes quem disparou contra ele e
lhe atingiu o calcanhar. Correu a notícia aqui que a bala do fuzil atravessou
um calcanhar de Lampião de um lado para outro, e acabou alojada na barriga do
jegue no qual vinha montado. Daí Lampião caiu e por cima dele arriou o bicho. O
peso do jegue, que é muito para um homem suportar, deixou preso uma das pernas
de Lampião. Com o peso do animal por cima, o ferimento começou a sangrar muito”.
Com esse
fenomenal contra ataque, obriga o comandante bater em retirada para não
aumentar as baixas da pequena tropa. Ligeiramente, os cangaceiros passam para o
lado paraibano da Serra do Catolé. Ao reencontrarem-se com o restante do bando,
o chefe mor do cangaço escolhe a Serra das Panelas, como coito para
recuperar-se do ferimento. Tinha como ‘enfermeiro, o cangaceiro, que era também
raizeiro, Cícero Costa. Com os cuidado de Cícero, a ferida dava sinais de boa
recuperação...
Porém, um ex
canganceiro, que agora “trabalhava” do outro lado, Quelé, grande inimigo de
Lampião, por o mesmo ser o causador de inúmeras mortes de familiares seus. Ao
saber que o “Rei” estava ferido, junta uma volante e segue em sua busca. Após
idas e vindas pelas brenhas sem encontrar algum vestígio do local, Quelé
descobre onde o mesmo localiza-se, através de um coiteiro que, depois de grande
sessão de torturas, abre o jogo.
Quelé comanda o ataque e pega os cangaceiros totalmente desprevenidos. O primeiro a tombar sem vida é Cícero Costa. Esperança e Lavandeira são feridos. O primeiro consegue cair na mata e escapar da morte. Já o segundo não tem a mesma sorte e é sangrado pelo comandante da volante. Tendo sangrado o cangaceiro, Quelé saí em busca de sinais que o levem ao seu desafeto maior, Lampião.
Lampião está
de repouso numa rede e no momento dos primeiros tiros joga-se no chão.
Apressadamente levanta-se começa uma corrida em busca de escapar, salvar sua
vida. Nisso o ferimento rebenta e uma grande hemorragia se inicia. A perda de sangue
é imensa e depois de levantar-se e dar poucas passadas, cai no tórrido chão do
árido sertão o “Rei do Cangaço”, quase sem forças.
Quelé, ainda
de punhal na mão, percebe um rastro de sangue na terra seca. Segue com cautela
e, já estando a poucos metros de seu grande inimigo, escuta alguém o chamar
para fazer uma averiguação em algo... No mesmo instante, dá meio volta e vai
ver do que se trata.
Lampião, ao
cair, sente a falta de forças nas pernas e, por mais que tente, não consegue
mais ficar em pé. Arrasta-se e ‘entra’ numa mota a fim de esconder-se. Ver o
seu inimigo verificando o terreno e aproximar-se cada vez mais, acreditamos que
ele pensou que seria, naquele lugar, sangrado por Quelé. Mas, ver ele dar meia
volta e ir para juntos dos seus comandados e, nesse instante perde os sentidos.
Após vários
dias no mato, o ferimento infecciona bastante. Começa a aparecer bichos e os
mesmos, a devorar os tecidos da perna de Virgulino, ainda vivo...
Um rapazinho,
menino ainda, está a caminhar naquela ribeira quando sente um odor forte, e vai
verificar que catinga é aquela. Nesse momento escuta o homem falar, chega junto
e ver um homem deitado no chão em condições deploráveis. Sai em toda carreira
que o mocotó bande na bunda e vai chamar seu pai. O pai do menino vem e faz o
que está ao seu alcance para cuidar do ferido. Recuperando um pouco as forças,
Lampião manda que o homem vá em determinado lugar, diga a seus irmãos, Antônio
e Livino, que está vivo e que venham busca-lo... O que fazem sem perda de
tempo, nas quebradas do sertão.
Fonte Ob. Ct.
Foto Ob. Ct.
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