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sábado, 15 de outubro de 2016

HISTÓRIAS DE BASTIÃO

*Rangel Alves da Costa

Quando viajo ao sertão, a minha estadia é dividida entre caminhadas pelas estradas ao redor, visitas aos conterrâneos mais antigos e proseados de calçadas ou debaixo de pés de pau. Gosto de ouvir causos e relembranças de outros idos, relatos quem mexem com a imaginação e narrativas até difíceis de acreditar. Mas tudo verdade num sertão de tantos fascínios, segredos e mistérios.

Mas não é todo mundo que sabe contar um causo que verdadeiramente desperte atenção. Tem gente que além da boa memória, muito do que diz foi vivenciado por ele próprio. E é tal conhecimento dos fatos, detalhando em minúcias os acontecidos, que tornam as narrativas em preciosidades. Um destes exímios contadores de histórias chama-se Bastião, como assim é por todos conhecido.

Pois bem, mesmo não estando ainda envelhecido, Bastião traz consigo um verdadeiro livro de histórias ribeirinhas, sertanejas e de todos os tipos, eis que conhecedor de perto de todas as situações relatadas. E conta o que vivenciou como caçador das matarias matutas, como pescador de um tempo de Velho Chico de outras águas, como morador do mato e de pequenas povoações, como sertanejo que já revirou o seu mundo no dia a dia da sobrevivência.

Assim, munido de experiência e como que levando em cada palavra a tarrafa, o barco, a espingarda, o aió e todo um aparato de mato e rio, diz Bastião da saudade do São Francisco de água farta para pescaria e dos peixes grandes que ali habitavam, principalmente o surubim e a tubarana. E pelas mesas e feiras os pescados em profusão e a vida ribeirinha bem mais fácil de ser vivida. Tudo ali buscado no rio caudaloso e lar de grandes canoas e barcos de pescarias, muito diferente da magreza das águas de agora.


Relata Bastião que não só um rio de bonança, mas também de histórias tão belas como inexplicáveis. As presenças estranhas nas águas, os repentinos saltos nas águas que mais pareciam gente pulando ao redor. Ele mesmo pescando mais um amigo e de repente o barco como que travar e eles sentirem que está sendo puxado por uma força desconhecida. E puxado com uma força tal que não adiantava remar com mais força. Não adiantava. Mas de repente o barco ser largado para prosseguir.

Causos dando conta de fogo-corredor margeando o rio e o pescador. Um facho luminoso que ora se expandia ou diminuía, que mudava de lugar repentinamente. E nas águas os barulhos estranhos, os sons de redes sendo lançadas sem que houvesse qualquer outro pescador ao redor. O pescador que por duas ou três vezes lançou sua tarrafa e no mesmo instante ou tarrafa foi arremessada por cima. Só que não havia mais ninguém por ali. Em situações assim não adianta pescar, pois as forças sobrenaturais irão sempre impedir qualquer proveito na pescaria.

Coisas estranhas que acontecem no Velho Chico e em qualquer rio, como o pescador de repente se sentir completamente perdido, desnorteado em cima de seu barco, fato que acontece mais ao amanhecer. Por quê? Não há uma explicação humana e compreensível para os mistérios das águas. Há certeza que nelas moram seres encantados e que geralmente agem para intimidar pescadores, forasteiros e todo aquele que não souber respeitar aqueles leitos e suas profundezas.

Sobre os famosos negos-d’água que habitam nas profundezas, que repentinamente surgem nas beiradas ou mesmo dentro dos barcos e que se lançam das pedras grandes toda vez que há uma aproximação humana, Bastão diz que nunca chegou a avistar seres assim. Mas que diversas vezes ouviu “batins” estrondosos, de coisas que se lançavam estrondosamente nas águas, e que bem podiam ser cágados ou outros animais que igualmente se jogam nas águas quando estranhos se aproximam. Mas não duvidava que aquela força estranha que impedia seu barco de seguir bem poderia ser um nego-d’água. Ou qualquer outro mistério ainda maior.

E mistérios não faltam nas histórias de Bastião, conforme continuarão sendo relatados no próximo escrito.
  
Escritor
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