Por Dênis Carvalho
Dênis Carvalho com Cristiano Ferraz
Localizada ao
norte de Floresta, a Favela, na época propriedade do Sr. Antônio Novaes,
tenente da Guarda Nacional, foi sabidamente palco de um dos mais famosos e
acalorados combates entre cangaceiros e volantes.
Na manhã do
dia 11 de novembro de 1926, Lampião acompanhado por um bando com cerca de 90
homens, aguaritados em duas casas: a sede e uma construção nova, foram
atacados, esperadamente, por uma força volante comandada pelo sargento José é Saturnino e o aspeçada Manoel Neto, que contavam com um corpo de 80 praças.
Após cerca de 4 horas de tiroteio, cercados por todos os lados e sem nenhuma
chance de vitória, as forças volantes foram obrigadas a bater em retirada,
deixando os corpos dos mortos para trás.
O “Fogo da
Favela” deixou um soldo de nove mortos, sendo seis soldados: Antônio Freire
Panta e Gaudêncio Pereira da silva do 2º Batalhão e Francisco Pereira, João
Gregório Neto, Agripe Lopes dos Santos e Cícero Petronilo da Silva, do 3º
Batalhão; um civil e dois cangaceiros, além de muitos outros feridos.
Segundo Marcos
Antônio de Sá (Marcos de Carmelita) e Cristiano Luiz Feitosa Ferraz, no
aclamado “As Cruzes do Cangaço: Os Fatos e Personagens de Floresta-PE”: “Os
criminosos fizeram toda espécie de crueldade com os defuntos. Sangraram,
degolaram, esfacelaram crânios, furaram os olhos com cápsulas das balas e
depois colocaram espalhados para todos os lados.” A barbárie cometida pelos
cangaceiros foi tamanha que impressionou até mesmo Corisco, o “Diabo Loiro”
ante tamanha carnificina.
Após a saída dos cangaceiros, Manoel Novaes e alguns agregados abriram uma cova e enterraram num só lugar cinco soldados e em outros três locais distintos, mais um militar, o civil e um cangaceiro.
Integrante do
3º Batalhão, Agripe Lopes dos Santos era filho ilegítimo de Manoel Alves de
Carvalho Barros (Não confundir com Manoel Alves de Carvalho, “Cel. Nezinho”, da
Fazenda Quebra Faca, pai de Auzônio Alves de Carvalho; homônimo), com Josefa
dos Santos, descendente de escravos (Dados de Nivaldo Alves de Carvalho).
Segundo relato
de Nivaldo Carvalho, Agripe era um sujeito intrépido, disposto e bastante
ousado. Em suas “pelejas”, proferia xingamentos, ameaças e até desafios ao
bando, tendo chegado a chamar Lampião para resolver a questão “corpo-a-corpo”,
munidos de faca.
Por volta da segunda
metade da década de 30, Maura dos Santos, irmã de Agripe, teve um sonho ou
algum tipo de presságio, onde se fazia necessária a colocação de um símbolo Cristão sobre a sepultura do irmão.
Havia,
entretanto, um delicado e meticuloso empecilho:
Em meados de
abril do ano de 1936, Adalberto Emílio Novaes havia tido uma desavença com a família do Sr. Lino Alves de Carvalho (Irmão do Major Tiburtino Alves de
Carvalho Barros, da Fazenda Água Branca), tendo, aquele, desferido uma tapa no
rosto de uma das filhas deste, recebendo, na hora, em contraparte, uma
“tamboretada”. Lino, já com idade avançada, procurou sua faca de ponta para ir
em defesa de suas filhas, mas não logrou êxito em encontrá-la, dado o calor do
momento.
Alguns dias
depois, Adalberto, acompanhado por seu tio Lerinho, a chamado do juiz de
direito, dirigia-se à cidade quando sofreu um atentado.
Levino Alves
de Carvalho (sobrinho e noivo de uma das filhas de Lino), na companhia de um
cabra, montou uma emboscada à espera do desafeto na margem da estrada que liga
as terras dos Novaes a Floresta. Diante da demora, pediu que o companheiro
montasse vigília enquanto tomava descanso. No entanto, o vigilante adormeceu,
tendo Levino acordado com o barulho do galope dos cavalos de Adalberto e
Lerinho. Apressadamente, pegou seu rifle e acordou o companheiro, desferindo
diversos tiros de rifle em direção aos alvos, mas estes já tinham tomado alguma
distância, e ao ouvir o estampido dos tiros, aceleraram o galope e partiram
abaixados e em manobras evasivas, em ziguezague, conseguindo sair ilesos do
atentado.
O caso
repercutiu até mesmo na capital do Estado. O temor do surgimento de uma questão
de proporções maiores fez com que o Dr. Carlos de Lima pedisse a interferência
do deputado Afonso Ferraz, que encaminhou recomendações ao então prefeito de
Floresta Fortunato de Sá Gominho (Siato), para, entre outras, entender-se com
Emílio Novaes para conseguir a retirada de Adalberto da região. (Floresta: Uma
Terra - Um Povo, Leonardo
Ferraz Gominho)
De fato, um
acordo (redigido por Nestor Valgueiro de Carvalho) fora lavrado entre as
famílias Carvalho e Novaes. Adalberto e a família de Lino sairiam da região e
não mais se falaria em questão ou qualquer ato de vingança. Contudo os rancores
e ressentimentos permaneceriam vivos por durante décadas. A família Carvalho,
que até então era adversária política da família Ferraz, rompe com os Novaes e
passa a dar apoio político a seu antigo adversário.
Dada a
situação, por ser um Carvalho, o pedido para demarcação e colocação da cruz
sobre o local de repouso de Agripe foi negado pelo proprietário da fazenda
Favela, agastando ainda mais as relações entre as famílias.
Diante da
recusa, Francisco “Chico Antão”, filho de Antão Alves de Carvalho (este também
irmão do Major Tiburtino da Faz. Água Branca), aborrecido, confeccionou uma
pesada e maciça cruz em “linha” de baraúna, com mais de metro e meio de altura
e fincou na divisa das terras de propriedade das duas famílias, tendo ficado
cerca de dois quilômetros de distância do local exato da sepultura; a nove
quilômetros da cidade de Floresta, na estrada que liga esta a Carnaubeira da
Penha (dados coletados em GPS por Cristiano Luiz Feitosa Ferraz).
Recentemente
foi trazida ao grupo uma provável situação envolvendo o monumento, por Arenio
Lopes Goncalves. Com as obras de terraplanagem e asfaltamento da estrada
que liga Floresta a carnaubeira, a cruz estaria correndo um sério risco de ser
deslocada ou mesmo destruída.
Discussões
sobre uma provável medida foram tecidas: caso necessário, poderia ser coletada,
realocada para um local próximo ou até mesmo, com a autorização dos atuais
proprietários da fazenda Favela, ser posta sobre o lugar a qual fora
originalmente destinada, tendo sido consultado membros, como Voltaseca
Volta e Cristiano
Ferraz, sobre o caso. Em suma, o que realmente importa é a preservação do
marco e da sua história.
Hoje, dia 20
de outubro de 2017, recebi o irrecusável convite de Cristiano
Ferraz para verificar a situação da Cruz de Agripe, munidos de
picareta e outras ferramentas (para caso fosse preciso fazer o resgate).
Ainda de uma
certa distância, avistamos o marco em seu lugar, intocado. Felizmente, o
canteiro de obras fica a uma distância de 20 metros do local, não oferecendo
nenhum risco.
A decisão,
portanto, não poderia ter sido outra, senão deixá-la em sua originalidade, em
respeito não apenas ao propósito para qual foi construída, mas também, a toda a
história que envolveu sua colocação naquele local.
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