Reportagem WEBDOC
Há 80 anos, morria
Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, e sua companheira Maria Bonita. O homem
que desenhou um rastro de violência na Caatinga deixou um legado inestimável
para seu povo.
00:00 · 16.06.2018
/ atualizado às 11:06 por Fernando Maia - Repórter
Um Nordeste
miserável, assolado por secas intermitentes, abandonado pelo poder público e
entregue ao jugo dos coronéis da política foi cenário fácil para o surgimento
do cangaço, movimento de banditismo que teve seu auge nas décadas de 20 e 30 do
século passado, sob o comando de Lampião, que entrou para a clandestinidade
empurrado por uma desavença familiar. Uma rixa com seu amigo de infância e
desafeto a partir da adolescência, Zé Saturnino, em Serra Talhada (PE),
desencadeou um dos mais sangrentos capítulos da história brasileira.
Com o
agravamento da rivalidade, a família de Virgulino deixou suas terras e se mudou
para Alagoas. Mas a perseguição não acabou. Por influência política, Zé
Saturnino acionou seus contatos em Alagoas. Zé Lucena, chefe de Polícia foi até
a moradia dos Ferreira e acabou matando o pai de Virgulino. O episódio foi o
estopim para Lampião entrar no cangaço em busca de vingança, pelo grupo do
Sinhô Pereira que, dois anos depois, deixou a vida de cangaceiro e entregou a
chefia do bando ao filho de José Ferreira, que assumiu as rédeas da organização
belicosa.
A versão mais
plausível para a morte do Rei do Cangaço, numa Gruta em Angicos, no Município
de Poço Redondo (SE), em 28 de julho de 1938, aponta que o coiteiro Pedro de
Cândido, que morava abaixo de Piranhas (AL), foi comprar mantimentos a um
comerciante chamado Joca Bernardes. Entre as mercadorias adquiridas, pegou oito
quilos de queijo. A expressiva quantidade levantou a suspeita de Joca. Ele
sugeriu ao sargento Aniceto que interrogasse Pedro de Cândido, que ele
forneceria o paradeiro do cangaceiro mais procurado do País. Os métodos de intimidação
(ameaça de morte e tortura) usados no interrogatório surtiram efeito. Pedro
revelou a localização do Rei do Cangaço.
https://www.youtube.com/watch?v=ub2DMtNGvAc
De imediato, o
sargento Aniceto passou um telegrama para o tenente João Bezerra, usando a
expressão "tem boi no pasto". O tenente entendeu o recado e
rapidamente organizou uma volante que saiu sob o seu comando de Delmiro Gouveia
(AL) de caminhão. Três volantes, com 50 policiais, atuaram na chamada batalha
de Angicos. As de Aniceto e João Bezerra e a comandada pelo soldado Ferreira. Dos
35 cangaceiros que estavam no local, 11 foram mortos e decapitados; e 24
conseguiram fugir.
Herói/bandido
Além dos 80
anos de morte, completa Lampião 120 de nascimento. Há divergências sobre a
data, mas a mais provável é 4 de junho de 1898, indicada no batistério da
Diocese de Floresta (PE). As ações de Lampião pela Caatinga são repletas de
controvérsias. Para uns, o bandoleiro era herói, um justiceiro social que
buscou uma sociedade mais equânime, igualitária; para seus desafetos e algozes,
não passou de um assassino frio, calculista e impiedoso. Independentemente
dessa querela, é fato que o homem que saqueou o Nordeste devolve hoje com juros
tudo aquilo que surrupiou de suas vítimas.
https://www.youtube.com/watch?v=YNqug_WB1Po
Seu legado
pelos sertões do Nordeste, em particular, Pernambuco, Bahia e Alagoas é
impressionante. O turismo, a gastronomia, as artes, incluindo a música, a
dança, o teatro, a literatura, vários museus e trilhas por onde passou são a
prova da influência viva de Lampião, Maria Bonita e sua entourage. A reportagem
refez a trajetória de Virgulino pelos sete estados nordestinos onde atuou com
desenvoltura - Rio Grande do Norte, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Alagoas,
Sergipe e Bahia - para mostrar como as gerações pós-cangaço aproveitaram esse
legado.
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