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terça-feira, 11 de setembro de 2018

FILHOS E PAIS

*Rangel Alves da Costa

Filhos que amam seus pais e filhos que jamais sentiram qualquer sentimento amoroso por aqueles que lhe deram vida. Filhos que cultivam suas raízes e filhos que sequer querem saber de onde vieram.
Filhos que a todo instante agem como filhos, e por agirem assim sempre respeitam, veneram e procuram preservar pai e mãe, e filhos que a todo instante renegam seu berço familiar, a casa onde mora, o sobrenome que carrega e, principalmente, sua herança de sangue.
Filhos que sofrem o mesmo sofrimento de seus pais, que sentem a mesma dor dos seus, que se desesperam em momentos dos desesperos que afetam os seus. E filhos que têm suas raízes como estorvo, como pedras em meio ao caminho, como pessoas que desnecessariamente se preocupam com suas vidas.
Filhos que dão a benção aos pais e filhos que sequer dão bom dia ou boa tarde. Filhos que tudo fazem para não ficar distante dos seus e filhos que quanto mais longe eles estiverem mais se sentem confortados. Filhos que abrem a porta de seus lares com amor e filhos que amam sair sem hora para retornar.
Filhos que perdem uma parte de si quando um pai ou uma mãe se despede da vida terrena. Filhos que nunca se acostumam com as perdas e continuam amando os seus como se ao lado estivessem. E filhos que só lamentam quando seus pais não deixaram nenhuma herança.
Filhos que bebem da saudade dia após dia, que choram de saudade, que sequer conseguem confrontar os velhos retratos. Filhos que oram pelos seus ausentes, que fazem da memória e da recordação um vínculo inseparável. E filhos que fazem do esquecimento uma forma de traduzir sua negação familiar.
Como visto, existem filhos e filhos. Os pais sempre são os mesmos, sempre serão pais, mas os filhos não. Filhos existem que dizem amar depois da impossibilidade do amor real, vivenciado na existência. Tiveram todo o tempo da vida para demonstrar tal amor, mas somente depois da perda alardeiam os sentimentos.


Existem filhos e filhos. Incompreensível é que um filho deixe de fruir, e com a máxima intensidade, a presença de seus pais. Ora, os seus pais estão ali, e por que não uma demonstração de reconhecimento, de amor, de filiação. Por que não estar pertinho deles, por que não procurar saber como andam suas vidas, se estão precisando de alguma coisa?
Será que somente quando os pais se vão é que os amores tardios devem ser revelados? Será que somente com a perda é que surge o reconhecimento de quanta falta fazem, de quanto deixou de aproveitar a vida ao lado deles, de quanto deixou de mostrar todo o amor sentido? Será que o amor dos filhos pelos pais deve nascer do luto?
Não. A vida é frágil, é pouca, é um quase nada. O que somos agora, amanhã já não seremos mais. Um dia nós iremos como nossos pais se vão. Quem tem seus pais também poderá ter seus filhos. E um filho que é pai gosta de ser renegado ou abandonado pelo que trouxe ao mundo? Então por que fazer de conta que seus pais nem existem?
Filhos que amam seus pais nunca os abandonam, nunca dizem não aos seus conselhos, nunca agem como se já fossem adultos e os pais apenas uns velhos. Na verdade, aos olhos e sentimentos dos pais, nenhum filho jamais fica adulto, pois sempre sua criança, sua cria, como se de eterno berço. Não é mimo não. É amor, é cuidado, é medo da voracidade do mundo.
Filhos que amam os seus pais não esperam suas partidas para sentir saudades. As saudades batem sempre, querem sempre reencontrá-los, sempre sentem a necessidade de bater àquela porta ou de dizer “bença pai, bença mãe!”. Que coisa mais linda do mundo! Filhos que amam, pais que se orgulham de suas crias.
E fazer diferente da letra da canção caipira Couro de Boi: um filho expulsa o pai de casa e a este dá somente um velho couro de boi. Já na estrada, o netinho correu e foi pedir ao avô um pedaço daquele couro. Ao retornar, o pai perguntou o porquê daquele pedaço de couro. Então ele respondeu que o pai também ia ficar velho e aquele pedaço poderia ser também colocado em suas mãos.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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