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sexta-feira, 12 de fevereiro de 2021

ABC DE LUCAS DA FEIRA

Do acervo do pesquisador Antonio Corrêa Sobrinho

“Passado mais de um século e meio da execução desse salteador baiano, resta dela os 104 versos das 26 estrofes com o título de “ABC de Lucas da Feira”, composição atribuída ao oficial de justiça da mesma Feira de Santana, Souza Velho, que escreveu este trabalho, em 1849, por ocasião do enforcamento do dito celerado:

Adeus, Saco do Limão,

Lugar aonde eu nasci,

Eu vou preso para baixo,

Levo saudades de ti.

Bem me diziam meus sócios

Que eu mudasse de condição,

Que Cazumbá por dinheiro,

Fazia a pintura do cão.

Cuidava que esta vida

Nunca havia de ter fim;

Porque contava na Feira

Muitos amigos por mim.

Desenganado fiquei

Quando me vi prisioneiro,

Só com a minha prisão

Ganharam tanto dinheiro.

Entusiasmado carreguei,

Muitas pompas e grandeza,

Pois em meu rancho eu tinha

Botes de rapé Princesa.

Fui preso para a Bahia,

Fizeram grande função,

Mas eu desci a cavalo

E os guardas de pés no chão.

Gostaram de eu estar preso

Com tanta rigorosidade,

Eu vou para a Bahia

Dos sócios levo saudade.

Homens pobres não roubei,

Que não tinham o que roubar,

Mas os ricos de carteiras

Nenhum deixei escapar.

Integra-te, negro Lucas,

Que hoje chegou teu dia,

Assegura tuas armas,

Que [que é] de tua valentia?

Já estou entregue, gente,

Me mostrem o delegado,

Na mão direita a cravina,

Na esquerda o meu terçado.

Kalumbi e Sobradinho,

Tapera e São João

Aonde eu tinha meu rancho

Lá me fizeram a traição.

Lá na Oliveira tinha

Manoel Nunes confiado [atrevido],

Um dia preguei-lhe o berço

Em um pau bem apregado.

Mulata de bom cabelo,

Cabrinhas de boa cor,

Crioulinhas por debique,

Brancas não me escapou.

Não digo quem são meus sócios,

Não me convém dizer,

Que eu por me ver perdido

Não deito os mais a perder.

“O” é letra redonda

Toda aquela redondeza

Me chamava capitão,

Sou capitão com grandeza.

Perdão, perdão, minha gente,

A todos por caridade,

A injustiça que fiz

Nesta pequena cidade.

Queriam saber com certeza

Quem era meu grande amigo;

Se almoçava, jantava e ceava

Era somente comigo.

Roubava também muita gente,

À fiúza do Luquinha,

Quem não rouba dinheiro,

Rouba carne e farinha.

Saltando eu, na Bahia

Vi muita gente faceira,

Brancos e pretos chamavam:

Venham ver Lucas da Feira.

Tapera e Santo Amaro,

Muritiba e Cachoeira,

Corriam todos pra ver

O grande Lucas da Feira.

Unicamente o presidente e chefe

Vieram com muita alegria;

Vieram me apertar a mão,

Quando cheguei na Bahia.

Vigário José Tavares,

Com o qual me confessei,

Só o pecado que eu disse

Foi o da moça que eu matei.

Choro hoje arrependido

Por conselho não tomar,

Já me cortaram o braço

Inda querem me enforcar.

Pisilon é letra do fim,

Comecei e vou findar,

A forca é pena última

Queiram, gente, perdoar.

Zombem velhos, zombem moços

Zombem também os meninos

Que hoje chegou o meu dia

Vou cumprir meu destino.

Letras vogais são cinco,

Que são a, e, i, o, u,

Adeus, Caldeirão de Lucas,

Adeus, Tanque do Urubu.”

Fonte: “A Pena de Morte em Sergipe”, de Pedrinho dos Santos, historiador.

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