Por Relembrando Mossoró
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Por Sérgio Trindade
Nascido em Martins, oeste do Rio Grande do Norte, no dia 18 de agosto de 1907, graduado em Direito, em 1955, Raimundo Nonato da Silva foi folclorista, memorialista, romancista, pesquisador, professor, magistrado, jornalista, técnico em assuntos educacionais, membro da União Brasileira de Escritores – seção RN, da Casa Euclides da Cunha, do Instituto Genealógico Brasileiro, da Academia Norte-rio-grandense de Letras, do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, do Cenáculo Brasileiro de Letras e Artes e da Sociedade dos Homens de Letras do Brasil, um dos mais eminentes e profícuos intelectuais e um dos mais conceituados e requisitados historiadores do Rio Grande do Norte, tendo publicado vários livros, ensaios e artigos em revistas especializadas e jornais.
Mesmo tendo um volume significativo de pesquisa na área de História, Raimundo Nonato é mais conhecido como memorialista e não como historiador. E ele não foi, de fato, um historiador de academia.
Adquiriu na observação acurada de sertanejo e na disciplina espartana de pesquisador o estofo de um arquiteto do tempo passado. Conviveu com a elite letrada de sua época e com o homem simples do campo; travou relações com cultos e analfabetos, de quem ele dizia saber mais do que muitos homens de livros. Essa convivência, a leitura bem orientada e a férrea disciplina de pesquisador e de escritor nos legou algumas das mais importantes obras intelectuais do estado.
Raimundo Nonato fez-se grande pela grandiosidade do que pretendeu e do que conseguiu fazer no campo do conhecimento e do saber. Buscou conhecer e conheceu o Rio Grande do Norte, dedicando-lhe importantes páginas de seus estudos. Suas obras retratavam personagens do povo e da elite do seu tempo, e muitas sobre o seu estado natal.
Para o professor Tarcísio Gurgel, pesquisador e maior autoridade em literatura norte-rio-grandense, Raimundo Nonato foi um escritor obstinado, perspicaz, “a quem tudo aguça a curiosidade logo transformada em literatura.” Como nunca parou de produzir, “escrevendo indistintamente, compulsivamente, acabou constituindo obra irregular”, mas de grande importância para a cultura da região oeste e do estado do Rio Grande do Norte.
Foram quarenta anos de estudo e de produção, com uma obra que abrange as áreas de Etnografia, Folclore, Ficção, História e Memorialística, em trabalhos como Figuras e tradições do Nordeste, Histórias de lobisomem, Visões e abusões nordestinos, Termos populares do Rio Grande do Norte, Jesuíno Brilhante, o cangaceiro romântico e Presença Norte-rio-grandense na Alçada Pernambucana, entre outras.
Raimundo Nonato conheceu profundamente o seu estado e, principalmente, a região onde nasceu, o oeste potiguar. Dedicou quase toda a sua vida a um trabalho de recuperação do passado que viveu ou que ouviu contar. Ajudou a construir um acervo espiritual e coletivo a que chamamos memória. Foi este o seu maior legado. E por isso, no campo da Memória coladinho ao da História, Raimundo Nonato fez-se grande. Saber o que contavam os mais velhos, com referências marcantes, quase míticas, sobre fatos passados, foi, para Raimundo Nonato, como se esbarrasse nos insondáveis labirintos da história mais distante, com personagens que fizeram e que escreveram o mundo no qual vivia.
Mesmo “não revelando a unidade e o estilo de um Octacílio Alecrim ou de uma Madalena Antunes”, o seu texto memorialístico desperta grande interesse, afirma Tarcísio Gurgel.
Fazem parte do seu veio memorialístico obras de peso como Os revoltosos de São Miguel, Lampião em Mossoró e Memórias de um Retirante.
Um historiador potiguar lembra “que uma das melhores maneiras de reconstituirmos o passado é ouvir. Ouvir mais e melhor, pois só assim poderemos definir os desvãos de um período particularmente conturbado, em que as paixões e os ressentimentos turvam a verdade, apresentada em fragmentadas versões. Apreender a versão – se possível um número significativo de versões – significa encontrar aproximações múltiplas da verdade buscada. A memória é matéria-prima para os que trabalham com a História, e é nessa condição e não como produto final que deve ser trabalhada. É como espécies de slides que preservam as imagens de uma realidade que já não existe. Ao projetarmos os slides temos sempre as mesmas imagens, as mesmas figuras, mas as interpretações sobre elas serão diferentes, visto que a ação do tempo esmaece o passado, diluindo-o, principalmente quando remete há muitos anos.” E acrescenta “que existe ainda a possibilidade de acontecer distorções ocasionadas, como diz Paul Thompson, (A voz do passado), ‘pelas sucessivas mudanças de valores e normas que podem, talvez, inconscientemente, alterar as percepções’. A memória é um experimento que transforma o lembrado em lembrança, algo intrínseco ao ser que lembra e não mais objeto a ser lembrado. É através da memória que o discurso do sujeito se torna possível.”
Raimundo Nonato, nascido em Martins, sertanejo, retirante e memorialista, faleceu na cidade do Rio de Janeiro no dia 22 de agosto de 1993, aos 86 anos de idade, deixando um obra viva que faz viver o passado do estado no qual nasceu.
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