Bruna Martins de Oliveira Ferreira*
https://tsrd.fandom.com/pt-br/wiki/Cangaceiro
Palavras-Chave: Cangaceiro,
Santo, Memória, Fonte.
Resumo
O objetivo
deste trabalho é investigar sobre o cangaceiro Pedro Santana, vulgo “Xexéu”, e
as memórias em torno de sua vida e morte; analisar a importância das diversas
fontes para construção desta memória e assim confrontando as diversas
informações, coletadas até esta fase da pesquisa. A questão central é em torno
da data de sua morte, que teria sido em 19 de março de 1924, dia de São José,
na Vila de Santa Catarina – como fonte sobre a vida e morte de Xexéu, utilizo o
Cordel escrito há cerca de 14 anos, por Diomar Araújo e Rozelio Souza
(disponível apenas pela internet: Youtube). Os autores do Cordel tiveram como
inspiração para a construção do cordel, a coletânea História & Estórias de
Catarina, 2003, onde professor Iran Paes de Andrade utilizando de relatos e
memórias, escreveu o conto: Pedro Xexéu – o Cangaceiro Santificado, livro que
também utilizo como fonte… ou se de acordo com pesquisas realizadas, sua morte
estaria ligada a passagem do grupo de Lampião pela cidade de Aurora, na data de
7 de julho de 1927 (relatado no Blog Cariri Cangaço).
Tanto o Conto
quanto o Cordel contam a saga do cangaceiro, se baseando em memórias
construídas ao longo dos anos. Ambos são registros de memórias. Memórias que ao
meu ver estão sendo esquecidas ou deixadas de lado, muitas vezes pela rápida
absorção e explosão das redes sociais. Poucos são aqueles que ainda se sentam
as calçadas em rodas de conversas, para compartilhar de suas memórias e trocar
experiências vividas principalmente com os jovens…valorizar estas duas fontes é
valorizar a memória e identidade daquele município (grupo social). Segundo
MENESES:
O modo como
uma sociedade assegura continuidade cultural, ao preservar, com o auxílio de
uma “mnemônica cultural”, seu conhecimento coletivo, de uma geração à seguinte,
tornando possível que gerações vindouras possam reconstruir sua identidade
cultural. Não se trata de buscar testemunhos do passado, nem mesmo de
continuidade cultural, mas de identificar material capaz de assegurar a
inteligibilidade do passado, num determinado contexto cultural do presente. O
passado, portanto, é ativamente construído. (MENESES, 2009:447)
A variedade de
informação adquirida durante a pesquisa em sites, blogs sobre o assunto;
relatos diretos e indiretos; análises de artigos e reportagens, foi
relativamente extensa, porém ainda não conclusiva, já que encontrei vários
relatos e/ou informações sobre a pessoa “Xexéu”, em diferentes locais e datas,
gerando assim um conflito com minhas fontes primarias. A escolha pelo Cordel
como fonte principal (a priora) é justamente pela pluralidade (inclusive de
temas) e a vasta fonte de informação social, econômica e cultural que ele nos
proporciona, pois, a utilização do Cordel também tem uma história, os interesses
dos historiadores variaram no tempo e no espaço, em relação direta com as
circunstancias de suas trajetórias pessoais e com suas identidades culturais
(LUCENA,2015). Ser historiador do passado ou do presente, além de outras
qualidades, sempre exigiu conhecimento e sensibilidade no tratamento de fontes,
pois delas depende a construção convincente de seu discurso (JANOTTI in
PINSKY,2008:10).
Sendo assim,
diálogo com autores teóricos como POLLAK (1992) – Memória e Identidade Social,
sobre memória e a importância da construção da mesma; CERTEAU (2008) – A
Escrita da História, com lugar social, inclusive sobre e como o Conto foi
escrito; a utilização de fontes como parte importante da pesquisa com PINSKY
(2011) – Fontes Históricas, entre outros autores e estudiosos: ANDRADE (2003);
BARBOSA; CARVALHO; DANTAS&MUNIZ (2012); FACÓ (1980); LEAL (2012); LUCENA
(2015); MATOS (2012); MENESES (2009) se fez necessário para o desenvolvimento
da pesquisa.
Utilizando
Michel de Certeau, com uma questão do lugar social, onde acontece a produção
historiográfica; toda pesquisa historiográfica se articula com um lugar de
produção socioeconômico, político e cultural, ou seja, que o local onde vive o
historiador e o contexto no qual ele está inserido influencia diretamente na
produção da história e na forma como ele interpreta os acontecimentos e os
reproduz. Tendo como base o lugar social, me atento na questão da santificação:
por que Xexéu havia se tornado santo? Quem o santificou? Porque esta memória se
perpetua até os dias de hoje? Como isso se torna relevante para um grupo (s)
social (s)?
Importante
destacar que um documento é o fundamento de pensamento histórico que também nos
traz que tipo de memórias devem ou não serem preservadas pela história… e mais,
a importância desses documentos está ligada com o passado de onde este se
originou. Nenhum documento emana uma verdade absoluta, todo documento é uma
construção permanente que dialoga questões do presente, e nos estabelece
um link com o passado através dela (BACELLAR in PINSKY, 2008:25). Sem
deixar de lado a importância da escola dos Annales, que trouxe a diversificação
de fontes, e as escolas que surgiram posteriores que estudam o cotidiano, assim
como LUCENA (2015) cita a importância da Historia Cultural.
Infelizmente a
falta de documentos que auxiliariam na pesquisa e até mesmo depoimentos de
populares, seria de suma importância, já que estes testemunhos orais ampliam as
possibilidades de interpretação do passado (ALBERTI in PINSKY, 2008:155) porém,
como a pesquisa encontra se em fase inicial, continuo buscando informações
(fontes orais e documentais) que sejam relevantes e que possam contribuir com o
resultado final. A autora MATOS (2012:69) conclui que na “visão de um
sociólogo, os devotos são autores da história que fazem essas pessoas serem
consideradas santas, até porque são utilizados modelos aceitos pela igreja
como, capela própria, ex-votos e pedidos dos fiéis”. Como bom historiador e
pesquisador nos encanta ler os testemunhos de pessoas do passado, e nos faz
entender como era seu cotidiano e suas lutas diárias (BACELLAR in PINSKY,
2008:24). Relato interessante está disponível no Jornal O Povo feito pelo
Jornalista Landry Pedrosa, onde o próprio conta algumas das conversas que
ouvira quando criança:
(…) dizia o
velho Ferreira que o pistoleiro apareceu nos Inhamuns e pediu para se esconder
na fazenda Mucuim, em Arneiroz. Propriedade do coronel Mário Leal, fazendeiro
respeitado da região.
Porque foi
morto Pedro Xexéu? Para responder, Manoel Ferreira, cauteloso com parentes do
coronel ainda vivos, fazia uma pequena pausa e dizia: “o finado Xexéu sabia
muito”. Em seguida, seu Manoel encarava a pequena plateia, acomodada no patamar
da igreja Matriz, e desfechava: “Agora, matem a charada”. E encerrava a prosa.
O Butim
Tibúrcio contava, no café do Antônio Gato, que alcançou uma graça depois de ver
a morte de perto. Após se engasgar com uma espinha de peixe numa comilança. ‘’.
Na hora me agarrei com a alma do finado Xexéu. Tossi forte e a espinha de
curimatã voou longe”. A conversa do Butim se assemelha a tantas outras que ouvi
contar em Catarina sobre os milagres do cangaceiro santificado.
O relato acima
só confirma o medo que a população ainda tem quando são questionados sobre o
assunto… marcas deixadas pelo coronelismo que até hoje pairam sobre a
comunidade. Sendo assim, o culto se torna uma eterna construção de memória
social, tanto de Xexéu como dos devotos e moradores da época, já que a memória,
segundo POLLAK é “um elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto
individual como coletiva, na medida em que ela é também um fator extremamente
importante do sentimento de comunidade e de coerência de uma pessoa ou de um
grupo em sua reconstrução de si. ” (1992: 05)
Todo
historiador se aproxima de um detetive ou de um Sherlock Holmes, pois através
da investigação, de indícios, consegue-se nortear seu trabalho. Nenhum
documento considerado falso deve ser descartado, e sim investigado. A partir de
aí saber filtrar o que deve ou não ser utilizado em sua pesquisa como fonte.
Ter o olhar da época, contextualizar cada situação e se colocar no lugar, dando
valor as fontes, e esta valorização é dado pelo meio social que está inserido e
o que ele representa dentro daquele meio ou época que foi produzido, e o que torna
relevante é a análise que se faz dele. (BACELLAR in PINSKY, 2008:63)
Sabe se que
desde o início da era cristã, muitos foram os santos populares que surgiram.
Muitos foram canonizados e outros desprezados, de certa forma por conveniência
pela Igreja, e aqui no Brasil não foi diferente. E durante o período das
revoltas e movimentos populares da Primeira Republica, vários santos populares
apareceram. Vale ressaltar “Padre Cícero Romão Baptista, é talvez o santo
popular que gera mais comoção de fiéis como um todo. Sobretudo, por que assumia
com muita propriedade a função de religioso carismático em Juazeiro do Norte,
onde possuía bastante prestigio social e político. ” (MATOS, 2012:60)
Hoje no lugar
onde Xexéu foi brutalmente assassinado encontra se uma Cruz e uma pequena
capela, construída pela população, localizada no Sítio São Bento distante 3 km
da sede de Catarina, onde todos os dias 2 de novembro (dia de finados) e nos
dias 18 e 19 de março (dia de São José), recebem visitações. Este é o relato do
autor do cordel Diomar Araújo que muito contribui para minha pesquisa,
inclusive ele mesmo comparece a estas datas acompanhado de sua família. O mesmo
me informou que durante estas datas é muito comum a presença de pessoas de
outros municípios e Estados irem visitar a capela e fazer suas orações e até
mesmo pagando promessas.
A figura de
Pedro Santana Xexéu ainda é uma incógnita, mas para muitos devotos é o
suficiente. Em meio as dificuldades e mazelas que o sertão proporciona aliado
ao descaso dos governantes, ter um refúgio baseado em alguém que mistura o
divino com humano é um alento e uma esperança. Essa perspectiva a priora pode
ser alterada de acordo com o surgimento de novas fontes ou documentos. Assim
como MATOS (2012, pag. 62) cita uma passagem bíblica de Lucas (23:39-43) …
ladrões, como aquele que morreu na cruz ao lado do Cristo e se arrependeu,
podem sim existir na modernidade, e facilmente se tornarem mártir.
Referências
Bibliográficas
ANDRADE, I.
Paes. Histórias & Estórias de Catarina. Pedro Xexéu – O Cangaceiro
Santificado. Coletânea (Vários autores). Rio-São Paulo-Fortaleza: ABC Editora,
2003, p. 97-126
BARBOSA,
Nathan Pereira. Escrita, Legitimação e Construção de Identidades: algumas
considerações sobre a historiografia e seus intelectuais. Disponível em: http://uece.br/eventos/semanadehistoriadafeclesc/anais/trabalhos_completos/72-6182-20112013-172539.pdf
CARVALHO, J.
Murilo. Os três povos da República. REVISTA USP, São Paulo, n.59, p. 96-115.
Disponível em: http://www.journals.usp.br/revusp/article/download/13279/15097
CERTEAU,
Michel. A Escrita da História. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2008.
Disponível em: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/3238146/mod_resource/content/1/Michel-de-Certeau-A-Escrita-Da-Historia-rev.pdf
DANTAS,
Kyldemir; MUNIZ, C. Cesar. Cangaço – Episódios e Personagens, Edição especial
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FACÓ, Rui.
Cangaceiro e Fanático: gênese e luta. 6 ed. Rio de Janeiro: Editora Civilização
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MATOS, I. dos
Santos. MARIA ALICE: A SANTA SEM IDENTIDADE. Relatório técnico apresentado ao
Curso de Jornalismo do Centro Superior do Ceará, mantenedora da Faculdade
Cearense – Fac., como exigência parcial para obtenção do grau de Bacharel em
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em: http://ww2.faculdadescearenses.edu.br/biblioteca/TCC/JOR/MARIA%20ALICE%20A%20SANTA%20SEM%20IDENTIDADE.pdf
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Sites
consultados
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2011. O Reverso do Cangaceiro (Santificados III). Acesso 08/08/2018. https://www20.opovo.com.br/app/opovo/cadernosespeciais/santificadosiii/2011/06/04/noticiasjornalsantificados3,2251045/o-reverso-do-cangaceiro.shtml
Jornal O Povo
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Diário do
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História, 2017. LAMPIÃO NO CEARÁ – A VOLTA, NA VOLTA, DO “REI DO CANGAÇO”: A
DURA SITUAÇÃO DO BANDO DE LAMPIÃO EM TERRAS CEARENSES, APÓS O FRACASSADO ATAQUE
A MOSSORÓ. Autor – Sálvio Siqueira. Acesso: 26/09/2018. https://tokdehistoria.com.br/2017/11/19/lampiao-no-ceara-a-volta-na-volta-do-rei-do-cangaco/
Cordel
ARAUJO, Diomar
e SOUZA, Rozelio – CANÇÃO DE PEDRO XEXÉU – CATARINA – CEARÁ. Disponível
em https://youtu.be/uNCyMomxwpI
Agradecimento
a:
José Cicero da
Silva, (reposta em 05/09/2018) pela indicação ao prof. Pereira. E-mail
jccariry@gmail.com
Professor
Francisco Pereira Lima (Professor Pereira), de Cajazeiras, Paraíba. (Resposta
em 16/09/2018) pela informação do Livro Cangaceiros de Lampião de A a Z de
Bismarck Martins de Oliveira, P.280, Impressos Edilson, Campina Grande – PB,
2012. E-mail franpelima@bol.com.br
Kiko Monteiro
(resposta em14/09/2018) pela informação do Livro Cangaceiro e Jagunços,
Dicionário Bibliográfico, de Renato Luís Bandeira, p. 353, Editora Sollar.
E-mail lampiaoaceso@hotmail.com
Diomar Araújo, jornalista e autor do Cordel, que entre os dias 01,03 e 04 de outubro de 2018, através de relato pessoal e com informações sobre o tema, contribui para a construção do meu trabalho.
* Graduando de Licenciatura Plena em
História a Distância (FAFIDAM – UECE). martins.ferreira@aluno.uece.br
https://simehisce.wordpress.com/simposios-tematicos/2-memoria-e-oralidade/pedro-santana-xexeu-a-santificacao-na-memoria/
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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