Por: João Marcelino Mariz
Quase todos os livros de ponta que se referem ao cangaço retratam a passagem dos cangaceiros por Sousa em 26 de julho de 1924. Entre um e outro há poucos divergências. Por exemplo, alguns escritores dizem que o irmão de Lampião que esteve em Sousa junto com Chico Pereira (de Nazarezinho), foi Antonio Ferreira, o mais velho. No entanto, a escritora Julieta Pordeus que conversou e conviveu com os próprios personagens locais, diz que o cangaceiro irmão de Lampião que por aqui aportou foi Levino, mais jovem que Antonio Ferreira, porém mais velho que Lampião. No livro intitulado “Nas Pegadas de Lampião”, o autor
Fonte: jaboataoemfoco.com.br
Anildomá Willans de Souza (de Serra Talhada), afirma que estiveram em Sousa acompanhando Chico Pereira, os dois irmãos de Lampião, Antonio e Levino Ferreira, o cangaceiro Meia Noite e outros não menos famosos no meio. Julieta aponta o dia 26 de julho de 1924, enquanto Anildomá, o dia 27. Creio, portanto, que o dia correto é 26.
Além dos roubos – normalmente cangaceiro não furtava, apenas roubava -, o foco principal dos cangaceiros em Sousa era o de matar o farmacêutico Otávio Mariz, tio do ex-governador Antonio Mariz. Otávio havia dado uma “surra’ de “chibata” de couro cru no comerciante Chico Lopes, também conhecido como Chico Américo, em pleno centro da cidade de Sousa. E depois da “pisa” mandou avisar pelo próprio, que o próximo a sofrer uma “sova” seria
Chico Pereira, amigo de Chico Lopes e inimigo de Otávio. Chico Lopes contou tudo a Chico Pereira que já estava envolvido no cangaço com o objetivo de vingar a morte do pai, cujo assassino foi preso por ele mesmo, e depois foi solto sem justificativa. Naquela época a política influenciava fortemente as decisões do Judiciário.
O episódio do ataque dos cangaceiros a Sousa é um dos mais importantes da história da cidade. Talvez menos importante somente que os lances da Revolução de 1930 que ocorreram nas ruas centrais de nossa cidade preconizados por oficiais do Exército Brasileiro, havendo tiroteio e mortes.
O que você passa a ler neste instante foi reproduzido do livro “Antes que Ninguém Conte” da escritora Juliêta Pordeus, lançado em 1986, portanto há 25 anos, e por conseqüência, desconhecido pelos mais jovens. Para suavizar a leitura, entendi de resumir e de acrescentar títulos aos parágrafos.
Veja como ficou o texto em resumo, sem fugir das palavras autênticas da escritora sousense:
AS PRIMEIRAS NOTÍCIAS SOBRE O ATAQUE SURGIRAM DE SÃO JOSÉ DA LAGOA TAPADA. O JUIZ DE DIREITO ERA PARTIDÁRIO.
“... Em São José da Lagoa Tapada, no dia da passagem de Lampião, alguém deixou escapar que Chico Pereira, com muitos homens armados assaltaria Sousa, no dia 26 de julho de 1924 a fim de tirar uma desforra contra Otávio Mariz, combinando-se em reunião que antes do assalto seria avisado os correligionários do prefeito João Alvino Gomes de Sá para que isolasse o seu pessoal, ou seja, que se desse uma senha de identificação e assim ficar-se-ia sabendo quem era do partido de Dr. Mariz. Aí já não se podia cogitar que houvesse razões políticas, uma vez que João Pereira, o pai de Chico, era da mesma agremiação política de Dr. Mariz, bem como do juiz Arquimedes Souto Maior.
DR. MARIZ RETIROU-SE PARA O LASTRO. DEPOIS VOLTOU.
...Mesmo sem acreditar, e não vendo razões para isso, Dr. Mariz, para evitar um possível encontro com Lampião, retirou-se com a família para o Lastro, tendo voltado e, sem que ninguém soubesse, ficou na casa de seu genro Milton Oliveira, aquela casa na rampa do Rio do Peixe, hoje a Casa Paroquial dos Remédios. Em sua casa, Otávio Mariz e o telegrafista Antonio Amorim, providenciaram algumas armas e munições, que sabiam não chegar sequer para responder às primeiras rajadas dos cabras de Lampião ou Chico Pereira.
OTÁVIO MARIZ QUIS RESISTIR. NÃO DEU. O POVO “MORRIA” DE MEDO.
Pela madrugada ouviu-se os primeiros tiros. A população é tomada de sobressalto; na véspera, em meio ao sensacionalismo da notícia, muita gente havia deixado seus lares, refugiando-se onde pudesse. Os cangaceiros acabavam de chegar, confirmando-se a verdade que o Dr. Mariz e o Major Zé Gomes preferiram não acreditar. Na casa de Antonio Amorim ocorria o tiroteio, apenas contra ele e Otávio que terminou por entregar os pontos, mas não se entregando, tendo fugido no início da luta. A população respeitava temerosa. Ninguém ousava colocar os olhos nas brechas das portas e janelas.
O JUIZ DE DIREITO DA COMARCA É PRESO NU DE CINTURA PRÁ CIMA E DE CALÇAS DE PIJAMA.
Às seis horas batem a porta do Major Gadelha. Os cangaceiros traziam preso, o juiz Arquimedes Souto Maior. Nu de cintura para cima, pés descalços e em calças de pijama, o Juiz pedia ao Major Gadelha para abrir a porta, identificando-se. Lá dentro, armados de rifles, estavam o dono da casa, seus netos Felinto Gadelha, José Honório e um amigo da família, Severino Pereira. Major Gadelha abriu a porta e Chico Pereira entrou, seguido de LevIno (irmão de Lampião), que foi tomando todas as armas, enquanto os cabras entravam com o Juiz; nesse instante a mulher do Major Gadelha apresenta-se a Chico e censura: “Oh, Chico, eu nunca pensei que minha casa fosse invadida e assaltada por um filho de meu amigo e companheiro João Pereira!”... Chico Pereira pôs as mãos na cabeça e respondeu: “Dona Dondon, não sou eu, são os homens da terra!”.
HUMILHADO, MAS SALVO – O JUIZ É LEVADO PARA A CASA DO PREFEITO JOÃO ALVINO.
...Depois de uma troca de palavras, Major Gadelha consegue levar o Dr. Arquimedes para a casa do prefeito João Alvino...
OS CANGACEIROS QUEBRAVAM GARRAFAS DE CACHAÇA E ATIRAVAM QUEIJOS NAS RUAS.
Vizinha à loja de Ulisses, na bodega de seu Geraldo, outros cabras quebravam garrafas de cachaça e atiravam queijos na rua, enquanto peças de tecidos, latas de doce e outros objetos eram jogados da loja de Ulisses, no meio da rua...
AS BALAS FURAVAM PORTAS E JANELAS.
Por volta das oito horas, estava a casa do Dr. Mariz sob as balas criminosas “fora da lei”, furando janelas e portas, enquanto a pornografia furava a moral. Dentro de casa, os cangaceiros arrasavam tudo. De sua casa na rua Estreita, a uma distância de 200 metros, mais ou menos, pela fresta da janela alta, em cima de uma mesinha, Tosinho Gadelha apontava o rifle na direção dos cabras de Chico Pereira, e teria puxado o gatilho, se sua jovem mulher, abraçando as pernas, chorando e suplicando, não pedisse para que ele não atirasse, pois os cangaceiros podiam voltar naquela direção...
*Claro que muitos outros fatos interessantes aconteceram na passagem dos cangaceiros por Sousa.
*Tosinho Gadelha e Otávio Mariz foram eleitos prefeito e vice-prefeito de Sousa nas eleições de 03 de outubro de 1955, derrotando Eládio Pedrosa de Melo e Alcindo Gomes de Sá.
João Marcelino Mariz
advogado
Fonte:
Blog: "O Beradeiro.com"
Prezado Mendes, Obrigado pelo carinho e assiduidade em acompanhar meu blog. Isso, vc sabe, é estimulante ao escritor. Referente a sua sugestão em relação a (cor de fonte)está sendo estudada, ok. Quero dizer tbm a vc que seu blog, embora eu não comente, tem me inspirado bastante com suas postagens, principalmente referentes a cultura do seu estado, no qual estou preparando meu romance.Grande abraço
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