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segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Angicos, o fim da caminhada

Por Joan Edessom de Oliveira

Lampião viveu quarenta anos, mais da metade no cangaço. Comeu o pó das estradas sertanejas ao longo de mais de vinte anos. Palmilhou, por vezes a cavalo, mas no mais das vezes a pé, com suas sandálias de couro, incontáveis léguas por sete Estados brasileiros. Travou centenas de combates e escapou a todos eles. Em Angicos, o cego não disparou um tiro sequer.
             
Cometera, em toda a sua trajetória no cangaço, um erro muito sério. O fracasso do ataque a Mossoró, no Rio Grande do Norte, acompanhou-o por toda a vida. Atacara uma cidade grande, próxima ao mar, importante politicamente. Fora derrotado, uma dura derrota, de valor simbólico muito grande. Atraíra sobre si ainda mais a violência repressora do governo. Mossoró virou um símbolo, um ícone. Lampião não cometeu jamais o mesmo erro.
              
Em Angicos, ele errou uma segunda vez. Muitas vezes repetira que não se fica em coito com uma única saída, “ratoeira” segundo os cangaceiros. Angicos era exatamente uma delas. Corisco ali estivera e dissera isso. Zé Sereno dissera para Lampião a mesma coisa.

Zé Sereno à esquerda

O capitão insistira em ficar, confiava em Pedro de Cândido, o coiteiro que o trairia. Angicos é uma sequência de erros que desafia os historiadores do cangaço até hoje. Como o capitão Virgulino cometera um erro tão grosseiro? Como Juriti e Ligeiro, famosos cachorros de Lampião, juntamente com os outros, não latiram dando o alarma? Como, em esconderijo tão desfavorável, não havia sentinelas? A história ainda busca respostas setenta anos depois.
              
Na manhãzinha de 28 de julho de 1938 havia em Angicos os bandos de Lampião, Luís Pedro e Zé Sereno. Corisco ainda chegaria com Dadá e seu bando. Conforme dizem os sobreviventes, o combate durou apenas quinze minutos. Foi o mais curto da vida de Lampião, e também o que apresentou o maior número de baixas. Foi o combate fatal. Há setenta anos passados.
              
Lampião e Maria correm o sertão até hoje, nos romances de cordéis, na boca dos cantadores, na voz sussurrante das contadoras de história sertanejas, nas inúmeras pesquisas dos historiadores, na boca do povo, de pai para filho, de avô para neto, de bisavô para bisneto.

Segundo Chandler (2003: p. 218), “Lampião era um bandido social, mesmo não sendo um nobre salteador. (...) a sociedade em que viveu era tal que um jovem corajoso, como ele, poderia cair no banditismo muito facilmente. Ou como disse um cantador:

“Era brabo, era malvado,
Virgulino, o Lampião,
Mas era, pra que negar,
Nas fibras do coração
O mais perfeito retrato
Das caatingas do sertão.”

Joan Edessom de Oliveira é mestre em Educação Brasileira pela Universidade Federal do Ceará e diretor da Escola de Formação Permanente do Magistério, em Sobral-CE.

Referências Bibliográficas:
           
CHANDLER, Billy Jaynes. Lampião, o rei dos cangaceiros. 4ª ed. São Paulo: Paz e Terra, 2003.
ARAÚJO, Antonio Amaury Correia de. Assim morreu Lampião. 3ª ed. Santos: Traço, 1982.
MELLO, Frederico Pernambucano de. Guerreiros do sol: violência e banditismo no Nordeste do Brasil. 4ª ed. São Paulo: A Girafa, 2005.
FACÓ, Rui. Cangaceiros e fanáticos. 4ª ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1976.
DIAS, José Umberto. Dadá. Salvador: Fundação Cultural do Estado da Bahia, 1988.
SOUZA, Ilda Ribeiro de (Sila). Sila: memórias de guerra e paz.         
Recife, Imprensa Universitária-UFPE, 1995.

EDIÇÃO 96, JUN/JUL, 2008, 

PÁGINAS 67, 68, 69, 70, 71


Extraído do blog:  "CDM - Centro de Documentação e Memória"

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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