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quarta-feira, 31 de julho de 2013

A PEDRA, O GRÃO, O PÓ... E A VENTANIA (Crônica)

Por: Rangel Alves da Costa(*)
Rangel Alves da Costa

Tudo, mas tudo mesmo, pode ser resumido nestes três elementos: pedra, grão e pó. E a ventania levando o pó para dizer que a pedra, por maior rochedo que tivesse sido, de repente pouca valia terá no destino.

A pedra representa a força, o poder, a dureza, a firmeza. A pedra é sólida, segura, forte. Do mesmo modo é o ser humano nas suas normais capacidades de existência. Tão firme que parece inquebrantável.

O grão, ou a pedra que é quebrada ou partida em pedaços menores, representa a fragilidade, a fraqueza, a inconsistência, a desestabilidade. O grão, fruto daquilo que já foi rochedo, demonstra bem a validade daquela famosa frase: Tudo que é sólido se desmancha no ar.

Igualmente a pedra, de repente o ser humano começa a se fragilizar, a perder sua força e potência, a sentir diminuída sua solidez, para se transformar apenas em pedaços dentro de um mesmo ser. Passa a sentir mais de perto o coração, a mente, o organismo.


O pó, a poeira ou a partícula, representa o resto do resto do resto. O grão, com o passar do tempo, vai se consumindo de tal modo que logo começa a se esfacelar, a perder o resto de suas forças, a não ter forças para manter sobre si aquilo que lhe permite existir. E então será apenas pó.

O ser humano caminha pelo mesmo percurso, eis que possui esse mesmo destino da pedra ao pó. A frase bíblica deixa induvidoso: Tu és pó e ao pó há de retornar. O rochedo, a pedra intacta, nada mais é que um acúmulo de pó sedimentado. Bem assim o homem, um acúmulo de grãos que se diluirão.

O homem é pedra, é forte, é impávido, e tudo suporta nesta condição. Mas o tempo vai corroendo o rochedo, a idade vai desabando a rocha, e não demora muito para que uma junção de pedras frágeis tome o seu corpo. E a corrosão da pedra leva ao desgaste de tudo, até que o que resta do corpo se transforme em pó.

O pó, pois, é a metáfora de muito que há na vida: o resto, o nada, o adeus, a fragilidade absoluta, a partida, o voo forçado, a despedida, a morte, a submissão ao querer daquilo que nenhum valor havia sido dado noutros tempos, quando ainda era rochedo: a ventania.

A ventania, neste percurso da pedra ao grão, passa a significar a força oculta, a energia do relegado, o que se manteve em silêncio até o momento do grito. A pedra pouca importância dava à sua existência, mas ela, a ventania, continuava passando e sentindo sua aspereza.

A pedra, certamente por se achar indestrutível, nem percebia que a ventania levava minúsculos grãos toda vez que por ali passava. Ao ser quebrada, repartida, fragilizada, sentiu que a ventania se transformava em poeira depois de cada passagem. E  que o tempo se encarregaria de entregar ao seu sopro aquilo que restou de cada grão.

Urge indagar: quem é mais forte, quem tem mais poder, quem é mais consistente, será o rochedo ou a ventania? Ou de outra forma perguntar: a pedra bruta não é infinitamente mais presente e poderosa que o vento? Alguém poderia dizer que a pedra possui existência, enquanto a ventania é apenas aparentemente percebida.


Neste caso, logicamente que a pedra seria muito mais forte e poderosa que qualquer ventania ou vendaval. Ainda que a força do vento chegue destruidora e vá arrastando a pedra para longe, ainda assim esta terá a mesma força e aparência onde for deixada.

Contudo, ouso afirmar que as forças e as fragilidades são iguais. Nem a pedra supera a ventania nem a ventania se sobrepõe ao rochedo. E é muito simples explicar. A ventania some no horizonte e num caminho que não haverá mais volta, e levando consigo o último pó daquilo que um dia foi rochedo.

E ali também o pó do homem. Não aquele que jaz sob a terra, assim transformado de seu rochedo, mas como metáfora de sua extrema fragilidade, de sua força de pluma em meio a todas as forças. Principalmente as forças do tempo, da idade, dos limites da vida.

E também o frágil peso do ser diante da Criação. Pois tudo infinitamente pó. Tudo eternamente na poeira do que passou. E tudo passa, tudo se transforma, do tudo ao nada.

(*) Meu nome é Rangel Alves da Costa, nascido no sertão sergipano do São Francisco, no município de Poço Redondo. Sou formado em Direito pela UFS e advogado inscrito na OAB/SE, da qual fui membro da Comissão de Direitos Humanos. Estudei também História na UFS e Jornalismo pela UNIT, cursos que não cheguei a concluir. Sou autor dos seguintes livros: romances em "Ilha das Flores" e "Evangelho Segundo a Solidão"; crônicas em "Crônicas Sertanejas" e "O Livro das Palavras Tristes"; contos em "Três Contos de Avoar" e "A Solidão e a Árvore e outros contos"; poesias em "Todo Inverso", "Poesia Artesã" e "Já Outono"; e ainda de "Estudos Para Cordel - prosa rimada sobre a vida do cordel", "Da Arte da Sobrevivência no Sertão - Palavras do Velho" e "Poço Redondo - Relatos Sobre o Refúgio do Sol". Outros livros já estão prontos para publicação. Escritório do autor: Av. Carlos Burlamaqui, nº 328, Centro, CEP 49010-660, Aracaju/SE.

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
  
http://blogdomendesemendes.blogspot.com

Um comentário:

  1. Anônimo16:33:00

    Caro Professor Mendes: Estive falando com o Dr. Rangel através o blograngel...., que, embora eu venha arquivando todos seus artigos e crônicas, esta de hoje é na realidade a obra-prima dos seus escritos, por nos alertar para uma profunda reflexão sobre a vida no Planeta Terra. Disse-lhe que talvéz seja pelos meus SETENTA ANOS, que me deixam na posição de "GRÃO" em direção ao "PÓ". Antonio José de Oliveira - Bela Vista-Serrinha-Ba.

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