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sexta-feira, 13 de setembro de 2013

Obra de Luiz Gonzaga se eterniza


Passados 20 anos de sua morte, o Rei do Baião continua presente nos festejos juninos e na alma do Nordeste

Figura marcante e imprescindível aos festejos juninos do nordeste brasileiro, Luiz Gonzaga ainda hoje dita as comemorações alusivas a Santo Antônio, São João e São Pedro. Mas afinal, quem é esse homem, que embora falecido há quase 20 anos, ainda é figura cativa nas festas do mês de junho? Qual o poder de sua obra e por que esse legado ainda perdura?
De acordo com o pesquisador José Mauro de Alencar, do Memorial Luiz Gonzaga (MLG), em Recife (PE), Luiz Gonzaga é tido como o maior ícone musical do nordeste porque conseguiu sintetizar a cultura da região em seu trabalho. "Luiz Gonzaga tem uma obra infinita. O cara praticamente cantou o nordeste todo, toda a cultura, em todos os seus aspectos", acredita.

Segundo Mauro, Luiz Gonzaga agregou muitos valores ao seu trabalho. "Na música, ele inventou uma estética. Trouxe pra si a estética do cangaço, com aquele chapéu de aba quebrada; trouxe o gibão e com ele a estética do vaqueiro. Ele começou a lapidar a cultura nordestina e trouxe para o palco tudo isso", explica.

Uma dos motivos para o amor do músico com os festejos juninos é o fato de ele ser devoto de São João, até por conta da localidade onde nasceu. A região de Exu, no Araripe (PE), tem como padroeiro São João Batista, também conhecido como São João do Carneirinho. Isso porque os pioneiros da ocupação humana na região - a família Alencar - eram devotos do santo.

"A cólera vinha assolando o Ceará e o Barão de Exu fez a promessa de que se a cólera não chegasse ao povoado, levantaria a capela de São João. A cólera não atingiu a região, aí ele começou a construção", relata Mauro, acrescentando que Luiz Gonzaga nasceu e se criou nesse ambiente.

Parcerias

Outro fator que fez de Luiz Gonzaga uma espécie de ‘mestre de cerimônias' do nordeste brasileiro é a manutenção de muitas parcerias ao longo de sua vida. De acordo com pesquisas do MLG, mais de 50 compositores trabalharam com ele, muitos de forma recorrente.

"Ele foi o grande cantor nordestino, pela grandeza da qualidade e quantidade de assuntos. Ele fez homenagem a cantador de viola, a conquista de beira de praia, a vaqueiro, aos trabalhadores, a todos os signos do nordeste. Ele tem música de Ary Barroso a Alcimar Monteiro", enfatiza Mauro.

Das diversas parcerias que Luiz Gonzaga manteve ao longo da carreira, algumas são memoráveis e indissolúveis. Uma delas foi com o também sanfoneiro Dominguinhos. "Na época que eu conheci Luiz Gonzaga, em 1954 no Rio de Janeiro, com 13 anos, um quarteto tocava com ele: Abdias no agogô, Miudinho no zabumba, Marinês no triângulo e Zito Borborema no pandeiro. Ele dizia que esse era o conjunto típico brasileiro", relembra Dominguinhos.

Na percepção do músico, a importância do ‘Rei do Baião' deve-se ao fato de todo o seu trabalho estar ligado aos festejos juninos. "Os discos dele sempre saíam depois do carnaval, porque era a festa mais importante no Brasil. Gonzagão começava a fazer sempre por volta de setembro ou outubro, para ficar pronto em dezembro e ser lançado logo após o carnaval, para dar tempo de chegar antes de junho em todo o nordeste", recorda Dominguinhos.

Encontro

Em Sergipe, um músico teve sua vida mudada a partir do contato com Luiz Gonzaga. José Gregório Ribeiro - conhecido como Josa, o vaqueiro do Sertão - aos 25 anos e já aposentado da polícia do Rio de Janeiro, voltou a Sergipe e no ano de 1961 participou do programa de rádio ‘Festa na Casa Grande', na rádio PRJT, posteriormente Difusora e hoje Aperipê. O que o artista não sabia, contudo, era de um ouvinte em especial, que de Caldas de Cipó, na Bahia, o ouvia: o velho Lua, como os amigos próximos chamavam Luiz Gonzaga.

Após o programa, Gonzagão telegrafou para a rádio marcando um encontro com Josa. O encontro aconteceu na praça General Valadão e depois desse primeiro contato a amizade surgiu entre eles, ao ponto de Gonzaga levar Josa a Recife para gravar seu primeiro compacto. A partir daí, eles excursionaram por três meses pelo país. Com 80 anos de vida e 50 de carreira, Josa hoje não mais se apresenta em público por conta da idade, contudo, sua história é repassada pela filha, Joseane Dy Josa.

"A vida de Josa se transformou em uma vida de estrela. O número de pessoas que reconhecem a história de painho, o número de músicos que gravaram a obra dele, o fato de a Rede Globo vir fazer matéria com ele no quadro ‘Me Leva Brasil', e o fato de até hoje artistas como Alcimar Monteiro gravarem músicas dele e de outros músicos, como Zinho, Pedro Sanfoneiro e Dominguinhos, fazerem parcerias com painho me fazem ficar orgulhosa de todo o trabalho musical de Josa, o vaqueiro do Sertão", diz Joseane Dy Josa.

Popularização

O pesquisador José Mauro de Alencar acredita que graças a Luiz Gonzaga as festividades juninas ganharam novas dimensões. "No tempo de Luiz Gonzaga, o nordeste era essencialmente católico. Depois veio o profano da festa, que também ampliou a popularidade do São João. Isso também se deve à música de Luiz Gonzaga, que aumentou o gosto que o povo já tinha pelo São João", analisa.

Segundo Mauro, há algumas décadas o São João não era tão popular quanto hoje em dia. "Com certeza quem deu essa grande levantada na popularidade do São João foi Luiz Gonzaga, em cima de seu caminhãozinho, de palco em palco, de cidade em cidade, distrito em distrito, vila por vila. Ele cantou em quase todas as cidades do interior do nordeste, quase todas mesmo, cerca de 90% delas", conta o pesquisador.
Mudanças

Porta-voz maior da cultura nordestina, Luiz Gonzaga hoje cede seu nome a diversos lugares em variados pontos do país. Ruas, museus, espaços para shows levam seu nome, como forma de manter viva a chama do trabalho do Rei do Baião. Contudo, o advento do chamado forró eletrônico por vezes afasta os festejos juninos dos seus elementos mais genuínos, reunidos na obras de Luiz Gonzaga.

Para Dominguinhos, mesmo com as mudanças, as festas da época ainda continuam em alta e fomentam o turismo em várias localidades, apesar de a tradição em si ser mantida apenas em alguns aspectos. "Hoje em dia temos uma miscelânea muito grande e as grandes bandas também estão inseridas no contexto junino", observa o artista.

Segundo ele, algumas cidades já despontam como redutos da tradição. Muitas vezes a própria população pede ao poder público local uma festa com músicos que tocam o forró clássico no comando da festa.

Trajetória

Luiz Gonzaga do Nascimento nasceu em 1912 na fazenda Caiçara, em Exu, sertão pernambucano. Filho da dona de casa Santana e do lavrador Januário - que nas horas vagas tocava e consertava sanfonas -, logo cedo aprendeu a tocar o instrumento com o pai. Por morar em uma região pequena sem muitas possibilidades e desprovida de escola, o jovem Luiz aprendeu a ler e escrever na casa de uma família tradicional na região: a família Alencar.

Ainda criança, acompanhado pelo pai, Luiz Gonzaga tocava e encantava a população nas feiras livres das cidades próximas. Subia em um caminhão e fazia seu show. Antes de completar 18 anos, apaixonou-se por Nazarena, filha do coronel Deolino, um grande fazendeiro da região que o ameaçou de morte caso o visse com a jovem garota.

Por conta da situação embaraçosa, Luiz Gonzaga levou surra dos pais, fato que o estimulou a sair daquela situação de dependência. Alistou-se no exército na cidade cearense de Crato e lá permaneceu como soldado, viajando pelo Brasil por nove anos.]

Após largar as Forças Armadas, em 1939, fixou moradia no Rio de Janeiro - então capital federal - onde passou a dedicar-se exclusivamente à música. Na época áurea do rádio, participou de vários programas de auditório e em 1941, ao executar ‘Vira e Mexe' no programa de Ary Barroso foi aplaudido de pé.

Como prêmio, foi contratado pela Rádio Nacional e posteriormente gravou a música em LP pela RCA Victor, importante gravadora da época. Daí pra frente, os trabalhos de Luiz Gonzaga o consagraram como representante nato do povo nordestino.

Fonte: PMA
Por Carlos Augusto

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