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segunda-feira, 22 de setembro de 2014

MANIA DE DOIDO

Por Rangel Alves da Costa*

Segundo os livros, mania é um hábito levado ao extremo; é a obstinação por gestos, atitudes ou gostos estranhos. É a tal da esquisitice em determinados comportamentos. E tudo mundo é propenso a isso, mas ao doido é imputada a maestria nas manias e atitudes pra lá de extravagantes. Por isso mesmo que diante de uma esquisitice praticada logo se diz que a pessoa está com mania de doido.

O doido realmente exagera nas suas excentricidades, extravagâncias, nos desarvoramentos. Mas a sua insanidade, loucura ou manifestação de qualquer distúrbio logo revela sua propensão para a tomada de atitudes tidas como exacerbadas. Logicamente que não é comum alguém encher as mãos de pedras e ficar horas e mais horas esperando alguém passar para arremessá-las. Mas assim acontece no conhecido doido de pedra.

Mas tem gente tida como normal que faz igual ou pior. E assim porque não está presente o aspecto da loucura enquanto distúrbio psiquiátrico. Naquele realmente louco tudo se justifica, ainda que diante de uma atitude demasiadamente extremada, mas não diante de uma ação pensada e refletida de uma pessoa em pleno gozo de suas faculdades mentais. E não raro que em situações tais, de destempero ou maluquice, a pessoa seja considerada também doida, mas por outros fundamentos.

E logo se diz que só pode estar completamente doida aquela que faz da vida e do corpo um reles laboratório para todos os tipos de experiências. E espalha-se que só pode estar com algum problema mental aquele jovem que abandonou o estudo e a família para enveredar pelos caminhos das drogas. E mais: só pode estar maluca aquela zinha que engravidou sem sequer saber o nome do pai; só pode estar de juízo mole aquele que mal tem de comer e beber e mantém um carro na sua garagem. E por aí vai.


Tais loucuras são proclamadas pelas atitudes estranhas tomadas por pessoas tidas e havidas como normais. Contudo, outras saem da esfera do desacerto na vida para entrar na esfera da loucura própria do doido, ou seja, para agir como se desajuizado realmente fosse. Só pode estar completamente sem juízo aquele que ameaça agredir o outro somente porque pareceu lhe olhar. Só pode estar maluco de pedra aquele que joga comida envenenada no quintal do vizinho apenas porque não gosta do latido do cachorro. Só pode estar completamente ensandecido aquele que pagou caro por um erro cometido e ainda assim se sente cada vez mais preparado para praticar outros absurdos.

Sem falar na loucura social, no caos mental das pessoas nos grandes centros, nos absurdos cotidianos que pontuam as vivências. O doido ao volante, a loucura no trânsito; o insano armado, a louca brutalidade; o maníaco na esquina, o enlouquecimento da vítima; o psicopata à espreita, o absurdo e suas consequências; o alucinado tomado de álcool ou droga, todos tidos como iguais; olhos estranhos que estão mirando ao redor, e a loucura da violência, do medo, do terror social.

Tudo isso possibilita imaginar o quanto a loucura do realmente doido é sadia, normal, aceitável. Joga pedra, faz careta, corre atrás, amedronta, até age com violência, mas tudo previsível e compreensível. Basta que seja compreendido para que seja lidado, tornado amigo, tido como pessoa comum. Nem todo doido apresenta permanente quadro de grave insanidade, eis que muitos vivem num pêndulo onde o juízo balança segundo determinadas circunstâncias psicológicas, ambientais e naturais.

Que loucura mais romântica a doido apaixonado pela lua. Que coisa estranhamente admirável o doido que conversa sozinho, que se pergunta e responde, que sorri e canta uma canção oferecida a si mesmo. Até mesmo aquele tido como de loucura extremada possui atitudes instigantes aos sentimentos despertados para sua condição. Aquele semblante impassível, aquele olhar distante, aquela mudez e que aquela inação, transmitem a sensação do que o ser humano realmente é ao imaginar-se mentalmente sadio.

Mas apenas imaginar-se, pois também mentalmente imperfeito. E portador de loucura disfarçada, que é o a pior de todas.

Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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