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quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Nova Ordem do Cangaço

Por Raul Meneleu Mascarenhas

A partir do ano de 1929, passou a acontecer uma das mudanças mais radicais no modo do famoso cangaceiro portar-se perante seus inimigos, vindo a tornar-se muito mais perigoso ainda. Mulheres passaram a integrar seu bando e ele passou a dividi-lo em grupos e subgrupos. Que estratégia incrível para os padrões ‘cangaceirísticos’ daquela sua época. Ninguém ainda tinha feito isso. Eram uma espécie de clãs familiares e autônomos sob a direção de homens de sua inteira confiança. Era a Nova Ordem do Cangaço que se apresentava. Chamava menos atenção e seus inimigos não tinham a menor ideia onde ele se encontrava, pois o bando dividido, a população os via em muitos lugares e as autoridades ficavam sem saber onde centrar fogo, com números maiores de contingente.

Essa estratégia, ou por querer ou por necessidade e imposição do destino, fez que Lampião, perseguido sem descanso pelas Forças Volantes de Pernambuco, tivesse que fugir e refugiar-se na Bahia com cinco companheiros que lhe restavam e maltrapilhos e famintos ali chegaram para a recomposição mais espetacular de sua vida. Era o ‘Fênix’ que retornava mais forte e das cinzas ressurgia sua têmpera de ‘cabra macho’ que não temia ninguém.

 
Arte de Mário Cravo Júnior

Lampião veio a entender por conta da situação em que seus inimigos contavam com armas melhores e poderosas, que deveria mudar de estratégia. Em sua mente de guerreiro privilegiado e líder, compreendeu que já não tinha condições de dirigir um número considerável de cangaceiros. Além disso o  sertão ficava aos poucos modernizado, com estradas, vias férreas e pipocava o progresso. Sua vida e de seus cabras agora dependiam mais da ‘inteligence’ que de seus músculos, coragem e pontaria pois deixava aos poucos de ser um território virgem e impenetrável. O Governo estava agora em toda a parte com suas construções de progresso e sua ‘gana’ de exterminar o banditismo naquela região.

Élise Grunspan Jasmin em seu livro ‘Lampião, Senhor do Sertão’, veio a tecer um comentário de pé de página onde o chama de ‘O Guerreiro Sedentário’ justamente por substituir seus ataques violentos, embora vez em quando o fizesse, por essa nova ordem familiar tornando-se menos nômades. Em suas notas, Élise Grunspan Jasmin aponta para António Silvino que tentara “resistir a construção da estrada de ferro pela companhia Great Western no sertão da Paraíba. Em 1906, ele perseguia os engenheiros ingleses encarregados de executar os trabalhos, ameaçava os operários, cortava os fios telegráficos, deteriorava as vias já instaladas e extorquia os passageiros do trem. Constatando a ineficácia de sua empresa, enviou uma carta aos diretores da Great Western por meio de Francisco de Sá, um de seus empregados, dizendo que permitiria a construção da estrada de ferro mediante uma indenização de 30 contos de réis. Ver, a esse respeito.

Virgulino Lampião

Sempre que tinha oportunidade. Lampião ameaçava ou assassinava os operários que trabalhavam nos canteiros. Em 1929. fez interromper a construção de uma estrada que devia ir de Juazeiro a Santana da Glória, CE, e que devia passar por seu refúgio predileto, o Raso da Catarina. Em outubro desse mesmo ano, constatando que sua ameaça não tinha sido levada em consideração, matou um dos operários. Em 1930, perto de Patamuté. BA. atacou um grupo de operários e matou um deles. Em 1932. no sitio Carro Quebrado, entre Chorrochó e Barro Vermelho, na Bahia. Lampião executou nove operários.

No Estado de Sergipe. em fevereiro de 1934, atacou operários e paralisou a construção da estrada. As autoridades governamentais nunca levaram em conta as ameaças de Lampião, e a partir de 1930 intensificaram os projetos de abertura do sertão ao "progresso". No dia 9 de junho de 1935, por ocasião de uma reunião organizada em Águas Vermelhas, na fronteira de Pernambuco. Carlos de Lima Cavalcanti, governador desse Estado, e Osman Loureiro, governador de Alagoas propuseram um plano de construção de estradas e vias férreas nas zonas do sertão afetadas pelo cangaço.

Elas deviam cortar sistematicamente em diversos eixos as regiões mais freqüentadas por Lampião e facilitar o transporte das Forças Volantes por caminhão, enquanto os cangaceiros se deslocavam quase sempre a pé. Os canais e as vias fluviais também deveriam ser controlados, pois permitiam o envio de armas aos cangaceiros. Lampião sabia que as conquistas tecnológicas com as quais as Forças Volantes tinham sido municiadas e a penetração das vias de comunicação através do sertão poderiam anunciar seu fim próximo e pôr em perigo sua autoridade na região (Informações extraídas das obras de Frederico Pernambucano de Mello, op. rir., 1985, e Quengo: !Amplio?, 1993).

Raul Meneleu Mascarenhas
Blog Caiçara do Rio dos Ventos

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