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terça-feira, 20 de janeiro de 2015

“O GLOBO” – 26/06/1957 - PARTE III

Material do acervo de Antonio Corrêa Sobrinho

LUIZ PEDRO, SUPERIOR A LAMPIÃO

A janela, a pedido de um amigo comum, se fecha. Oferecemos um copo de água mineral ao entrevistado e ele recusa: “Por ora, não”. Em sequência, entrando propriamente no objeto da reportagem garante:

- Homem, o bandido que criou nome foi Lampião, mas no grupo dele havia estrategistas mais hábeis, como Luiz Pedro, que também era mais valente e mais esperto do que o chefe.

O coronel João Bezerra percebe o nosso espanto e adita:

- Todavia, lampião também era um cabra valente da peste.

DETALHES INÉDITOS SOBRE O FIM DO BANDOLEIRO

O repórter solicita ao coronel João Bezerra que focalize a morte do famigerado Virgulino Ferreira, comissionado como capitão por decreto do Governo Bernardes. O entrevistado parece comprazer-se com a solicitação:

- Está certo: vou devassar para vocês passagens que nunca pude devassar sobre os meus passos para chegar a Lampião.

E, segurando o braço do repórter:

- Reconstituirei a verdade histórica, que alguns tentam vulnerar.

PROCURANDO LOCALIZAR A “GANG”

O coronel João Bezerra, ereto na cadeira e policiando todas as anotações do repórter, reconta, então, desde o seu início, a caçada que, desencadeando-se na hinterlândia das Alagoas e de Pernambuco, mobilizou a atenção nacional. Seu tom de voz, agora, torna-se mais duro:

- Fortemente apoiado pelas autoridades, comecei por efetuar sindicâncias para a localização do grupo. Numa diligência que eu fizera, quando eles passaram no município de Palmeira dos Índios, eu soube que ali haviam tiroteado com o sargento Porfírio, em Creibeiras. Eu me achava em Olho d’Água das Flores, de ordem superior, por acreditarmos que eles procurariam aquele centro. Encontrava-me, dessarte, na boca da barra, mas lá eles não compareceram.

REMUNICIANDO O CONTINGENTE

Deduzimos que a primeira tentativa fora frustrada. E o coronel João Bezerra, ajeitando o laço da gravata, sem maior convicção:

- Homem, cangaceiro, como mosca, a gente não derruba com o primeiro tapa.

E continuou:

- Somente depois do tiroteio, já mencionado, entre os facínoras e a Força Pública, ocasião em que, confirmando o adágio, entre mortos e feridos se salvaram todos, segui para Santana de Ipanema, em caminhão, onde apanhei munição suficiente para reabastecer a tropa, que demandaria o homizio dos cangaceiros. Chegando a um povoado de nome Tiririca, embosquei casas de caboclos – alguns prisioneiros do grupo – e, às 8 horas do dia seguinte, eu os peguei, assombrados, obrigando-os a orientar a tropa até o sítio onde haviam deixado o grupo, que era nas caatingas fechadas, onde havia numerosas macambiras.

LAMPIÃO DA TAPA EM LUGAR DE ESMOLA

- Lobrigando algumas macambiras com folhas quebradas, interroguei um ex-prisioneiro do bando. Ele me asseverou que fora ele que ali caíra. Ao pedir uma esmola a Virgulino Ferreira, deste recebeu violento tapa, projetando-o ao solo. Dispensei o prisioneiro, porquanto já levantara todos os vestígios da passagem dos delinquentes, e ative-me aos seus rastros durante doze dias, perdendo-os nas caatingas de Guaribas, perto da vila de São Domingos, município de Buíque, Pernambuco.

MAIS DE DUZENTOS QUILÔMETROS ENTRE ESPINHOS

A um quesito do repórter, o entrevistado esclarece:

- Cumpri, aproximadamente, nesse percurso, quarenta léguas, com as voltas e revoltas da caatinga. Eis os lugares que me lembro de ter percorrido, na pista dos cangaceiros, nessa viagem: Lagoa do jirau, Riacho do Mel, Riacho de Traipu, Serra dos Tocos, Poço do Cosme, Lagoa da Camiso, Serra do Uruçu, Serra das Antas, Currais Novos, Serra de São Pedro, Sete Lagoas, Uamaro. Saí de lá emplastrado de espinhos.
DESENHA-SE O DESÂNIMO

- Em face do escondimento dos rastros dos criminosos, verifiquei que eles se iam acampar ocultamente, porém já na proteção de alguém, no povoado. Distante cerca de quinhentas braças do local, escolhi entre os 95 homens 20 soldados dos mais carrancudos – que mais facilmente se poderiam assemelhar com os marginais – para poder fazer investigações diretas. Percebendo que nas maiores casas de negócios havia um aspecto de indignação, abordei um comerciante sobre a existência ou passagem de cangaceiros por ali. Ele redarguiu que ignorava totalmente o fato. Sondei os demais, mas nenhuma informação obtive a respeito. Meu ato subsequente foi retornar ao seio da tropa, no acampamento. Um leve desânimo desenhou-se em mau espírito.

ABATE DE BODES CRIA UMA PISTA

- Chegando ao acantonamento, vi que já haviam abatido quinze bodes. Inquirindo de quem era a criação, responderam-me que parecia ser do subdelegado local. Mandei chamá-lo, apresentando-se ele imediatamente para cobrar a despesa. Fê-lo, porém, a preço exorbitante. Chamei-lhe a atenção, frisando que não deveria deslembrar-se do convênio sobre o custo de gado e de bode para tropas volantes. Ele concordou e eu ainda o interpelei com certo rigor, acentuando que quem não era amigo dos soldados passava a sê-lo dos cangaceiros.

CONTINUA...

“O GLOBO” – 26/06/1957 

Fonte: facebook
Página: Antonio Corrêa Sobrinho

http://blogdomendesemendes.blogspot.com

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