Por Romero Cardoso e Marcela Lopes
Quando da
formidável marcha do bando de Lampião pelas veredas do oeste potiguar, intuindo
objetivo maior, qual fora atacar Mossoró, na época já considerada a segunda
cidade do estado do Rio Grande do Norte, nenhum lugarejo sofreu mais que a
localidade de Boa Esperança (hoje município de Antônio Martins).
Antonio Martins - RN
Em 12 de junho
de 2015 estivemos visitando a aprazível cidade, quando constatamos que
continuam vivas as marcas deixadas pelo sinistro bando, não obstante mais de
oitenta anos assinalarem a verdadeira faina maldita que deixou sinais evidentes
de que as tristes horas jamais se apagarão da memória da simpática gente,
embora a maioria não estivesse presente naqueles fatídicos momentos de terror e
apreensão, tendo em vista que os mais velhos se responsabilizam pela
transmissão dos fatos verificados naquele longínquo ano de 1927 .
Conversando
com pessoas do lugar, houve ênfase ao que literato como Raul Fernandes, em A
marcha de Lampião: Assalto a Mossoró, imortalizou em letras garrafais, pois,
transmitidas de geração a geração, as histórias da presença do bando de Lampião
em Antônio Martins denotam a perpetuação da memória sobre os mais absurdos atos
ignominiosos perpetrados pelo banditismo rural sertanejo contra a indefesa
população do lugar.
José Romero
Cardoso
Boa Esperança
em seu bucólico cotidiano esperava a banda da vizinha cidade de Martins, pois
aproximava-se a festa do padroeiro Santo Antônio. Ao invés dos acordes
amistosos, executando músicas tradicionais e conhecidas, despontou célere o
bando de Lampião. O lugarejo passou a ser literalmente revolvido, com
cangaceiros se apossando de tudo e de todos, destruindo tudo que encontravam
pela frente e praticando atos deliberados de vandalismo.
Cidadão de
nome Vicente Lira foi aprisionado quando chegava à cidade. Lampião em pessoa
colocou-o na frente da alimária. Pisoteado nos pés pelo animal montado pelo rei
do cangaço, Vicente Lira segurou firme nas rédeas. Lampião não gostou, tendo
desferido diversas cutiladas do seu punhal de lâmina perfurante no desditado
sertanejo. Escapou milagrosamente, tendo morrido de morte natural muitos anos
depois.
Irmãos que há
tempos não se falavam foram amarrados em formigueiro. Seresteiro descontraído
teve o violão enfiado cabeça a dentro, ficando o mesmo como espécie de
colarinho. Melancias foram atiradas contra frágeis cabeças, enquanto pulos do
gato foram ensaiados, os quais consistiam em atirar para cima infelizes
criaturas, para que as mesmas conseguissem, sem sucesso, a mesma performance
dos cangaceiros quando das lutas nas caatingas. Conceituado cidadão de
nome Augusto Nunes teve armazém depredado, queimado, destruído na expressão
literal do termo. Prejuízo incalculável que colocou por terra anos de trabalho
árduo.
A esposa
deste, de nome Rosinha Novaes, era preparada para seguir o bando, como refém.
Já estava em cima de um burro quando gritou desesperada que se fosse na terra
dela aquilo não aconteceria. Indagada sobre qual terra era natural, tendo
respondido ter nascido em Floresta do Navio, berço de cangaceiros e coiteiros,
pertencente ao ramo dos Novaes, prima de Emiliano Novaes, serviu de senha para
que o suplício maldito terminasse.
Lampião,
avisado por Sabino Gório sobre a presença de uma pessoa da família Novaes em
Boa Esperança, deu por encerrada a sessão de horror perpetrada pelos
cangaceiros contra aquele povo pacato e trabalhador.
Boa Esperança
deveu muito a Dona Rosinha Novaes pelo fim do terrível sofrimento que foi
imposto pelo bando de Lampião quando de sua passagem inglória pelo simpático
lugarejo.
A memória da
população está acesa no que diz respeito aos malditos momentos que seus
antepassados passaram nas garras do bando de Lampião, pois é consenso geral as
amarguras deixadas pela horda comandada pelo mais audacioso cangaceiro de todos
os tempos.
José Romero
Araújo Cardoso. Geógrafo. Professor-Adjunto IV do Departamento de Geografia da
Faculdade de Filosofia e Ciências Sociais da Universidade do Estado do Rio
Grande do Norte. Especialista em Geografia e Gestão Territorial (UFPB) e em
Organização de Arquivos (UFPB). Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente
(PRODEMA/UERN).
Marcela
Ferreira Lopes. Geógrafa-UFCG/CFP. Especialista em Educação de Jovens e Adultos
com ênfase em Economia Solidária-UFCG/CCJS. Graduanda em Pedagogia-UFCG/CFP.
Membro do grupo de pesquisa (FORPECS) na mesma instituição.
http://cariricangaco.blogspot.com
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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