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quinta-feira, 8 de outubro de 2015

O CANGAÇO: 12 FOTOS E 7 FATOS IMPRESSIONANTES SOBRE UM BRASIL FORA DA LEI - PARTE FINAL

O lendário cangaceiro Lampião posa para foto segurando uma edição de um dos jornais que costumava ler, "O Globo", 1936. (Benjamin Abrahão/Acervo Abafilm).

#4 - A opinião pública dividida entre amor e ódio.

Lampião já era uma lenda viva antes mesmo de sua vida ser documentado pelo corajoso jornalista sírio-libanês, Benjamin Abrahão.  Tratado pela polícia dos estados como uma verdadeira praga a ser exterminada, temido por onde passava, ainda assim ganhou a simpatia de muita gente.Virgulino tinha a confiança de gente de diversos setores da sociedade: coronéis, sertanejos e até mesmo a igreja, representada pelo inigualado Padre Cícero, a quem se deposita regionalmente o prestígio de uma santidade. 

A situação de considerável apoio da sociedade pode se amparar no senso de justiça em crítica à força oficial vigente. O respeitado historiador britânico, Eric Hobsbawn, em uma de suas obras (Bandidos/1969), apontou o Cangaço brasileiro como um exemplo claro do fenômeno do banditismo social, que se alinhava ao princípio de contestação, como um sentido primitivo de revolta. 

“O ponto sobre bandidos sociais é que eles são criminosos camponeses a quem o senhor feudal e o Estado enxergam como criminosos, mas que permanecem dentro da sociedade camponesa, e são considerados por seu povo como heróis, como campeões, vingadores, lutadores pela justiça, talvez até mesmo líderes de libertação e, em qualquer caso, homens para serem admirados, ajudados e apoiados. Esta relação entre o camponês comum e o rebelde, bandido e ladrão é o que faz o banditismo social interessante e significativo.”
Eric Hobsbawn

Volantes do Estado da Bahia em registro de Benjamin Abrahão, circa 1936. (Benjamin Abrahão/Acervo Abafilm).

#5 - Volantes: a polícia especial dos estados treinada com as mesmas práticas dos cangaceiros.

Por décadas a República simplesmente amargou a inferioridade de suas forças diante do preparo e conhecimento preciso dos bandos cangaceiros. Equipados com cangas de madeira e utensílios metálicos (daí o nome cangaço: canga+aço), esses grupos eram compostos por homens (e também, muito raramente, mulheres) de invejável experiência de combate, sempre furtivos e ágeis.

Nas cidadelas invadidas, a polícia costumava ser ínfima e sem a menor condição para impedir investidas tão bem articuladas. Quando chegava algum reforço capaz de enfrentá-los, os cangaceiros simplesmente desapareciam em rotas de fuga que os levavam para outros estados, onde somente as forças policiais correspondentes poderiam atuar.

A reação dos estados foi precisa: responder na mesma moeda. Foram constituídas as chamadas forças volantes, o braço cangaceiro da polícia, formadas por homens (alguns deles até ex-cangaceiros) de preparo e práticas de combate idênticas às dos bandos criminosos. Assim, rotas de fuga, abrigos e investidas furtivas estavam mais sujeitas a falhas. 

O encontro de Abrahão com o bando de Virgulino, em foto tirada pelo cangaceiro Juriti. Da esquerda para a direita: Vila Nova, não identificado, Luís Pedro, Benjamin Abrahão (à frente), Amoroso, Lampião, Cacheado (ao fundo), Maria Bonita, não identificado, Quinta-Feira, foto de 1936. (Acervo Abafilm).

#6 - O jornalista libanês que documentou a vida dos cangaceiros.

Figura responsável pelos mais preciosos registros iconográficos do Cangaço, Benjamin Abrahão Botto conheceu de perto, por vários meses, a rotina de diversos bandos cangaceiros, inclusive os dos notáveis Corisco e Lampião. Ele foi por muitos anos secretário de Padre Cícero em Juazeiro do Norte, no interior do Ceará, até que com a morte do sacerdote em 1934, colocou em prática seu projeto mais ambicioso: filmar e fotografar Lampião e seu bando.

Se aproveitando da ligação de Lampião com Padre Cícero, Abrahão facilmente se aproximou do cangaceiro. Lampião era uma figura extremamente vaidosa, característica que o consolidava como Rei do Cangaço, se deixando acompanhar pelo jornalista. O material coletado ao longo de cerca de 2 anos (1936 e 1937) era de extrema preciosidade e foi recebido nas grandes metrópoles como um verdadeiro escândalo. O Cangaço era uma ofensa ao Estado Novo de Getúlio Vargas, que tratou de censurar e confiscar o registro de Benjamin. 

“As fotos e filmes de Benjamim eram um atestado da incompetência das forças policiais e uma afronta ao Palácio do Catete”. - Frederico Pernambucano de Mello


O sírio-libanês Benjamin Abrahão trouxe a público relatos detalhados sobre a rotina e características dos bandos cangaceiros, o que pode ter sido nocivo à estratégia dos bandos, cada vez mais combatidos em esfera interestadual. Em menos de três anos a maior parte dos principais bandos foi desmantelada, inclusive com a execução de Lampião (1938) e Corisco (1940). O próprio Benjamin também teve seu fim em 1938 (dois meses antes da morte de Lampião e seu bando),vítima de nada menos que 42 facadas em um assassinato até hoje não esclarecido. Segundo o historiador Frederico Pernambucano de Mello, a mesma força que matou Lampião, matou Benjamin: o desmoralizado Estado Novo. 

“Antes que o Estado Novo espatifasse o sistema de poder do sertão, era alto negócio para qualquer fazendeiro comercializar com o cangaceiro. O Estado Novo acabou com esse colaboracionismo. A morte de Benjamin foi, sobretudo, uma queima de arquivo histórica.”
Frederico Pernambucano de Mello

Cangaceiro Barreira posa junto à cabeça de seu ex-companheiro de bando, Atividade, como prova de lealdade à volante. 

#7 - Um cerco que se fechava: a falência dos bandos e o fortalecimento do combate ao cangaço.

Com o passar dos anos, a forma que o Estado tratava o Cangaço era cada vez mais madura. A segunda metade dos anos 1930 foi especialmente difícil para os bandos cangaceiros. Um a um, os criminosos iam sucumbindo ou se entregando em troca da anistia. O marco do fim dos tempos do Cangaço foi a emboscada que executou Lampião, Maria Bonita e diversos membros de seu bando. Suas cabeças foram expostas ao público em muitas cidades do Sertão nordestino.

“Naquela época, Lampião mobilizava grossos capitais. Travava com coronéis da região que financiavam seus roubos e recebiam parte do lucro. Seu bando era a imagem do sucesso da organização fora da lei."
Frederico Pernambucano de Mello

O fim do Cangaço foi causa direta da insatisfação com tamanha desmoralização do Estado Novo causada pelas imagens de Abrahão. Não só como atividade marginal, mas também como exemplo escancarado da corrupção de coronéis colaboradores, o Cangaço era uma afronta a Getúlio Vargase sua proposta ideológica. E sistematicamente pagou o preço da visibilidade que adquiriu.

Cadáver do cangaceiro Cirilo de Engrácia, morto por civis e usado como exemplo pela volante alagoana. A cabeça de Cirilo já havia sido decepada, foi recolocada para a foto. 1935. (Autor desconhecido/Acervo Sociedade do Cangaço).

Cabeças cortadas de membros do bando de Lampião, incluindo o próprio e sua parceira, Maria Bonita, mortos em uma emboscada em Porto da Folha, Sergipe. Elas foram expostas como troféu na escadaria da Prefeitura de Piranhas, no estado de Alagoas, este episódio simbolizou o fim dos tempos áureos do Cangaço. Foto de 1938 (Autor desconhecido/Acervo Sociedade do Cangaço).
Cabeças dos cangaceiros expostas em Santana do Ipanema/AL, 1938. (Autor desconhecido/Acervo Sociedade do Cangaço).

O médico legista Charles Pittex segura as cabeças mumificadas de Lampião e Maria Bonita, elas ficaram expostas por muitos anos na Faculdade de Medicina da Bahia, foto de 1939. (Autor desconhecido).


FIM

Bruno Henrique Brito Lopes 
Graduado em História pela Universidade Católica de Pernambuco. 

http://www.historiailustrada.com.br/2014/11/o-cangaco-12-fotos-e-7-fatos.html

http://blogdomendesemendes.bçogspot.com

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