Ele foi tido
como conterrâneo de Jesus e, por isso mesmo, um segundo enviado de Deus quando
chegou a Juazeiro do Norte, no Ceará, e se apresentou como o homem que nasceu
em Belém, na Terra Santa. O nome? Benjamin Abrahão. O sírio caiu nas graças do
religioso mais famoso do Nordeste, o Padre Cícero, e logo se tornou seu
secretário pessoal. Daí em diante, Abrahão se fez na vida. Pois, apesar de ter
sido considerado um santo, soube aproveitar as oportunidades para colocar em
prática as malandragens dos homens de carne e osso, chegando a ser fotógrafo
particular de Lampião para ganhar uns tostões.
Esse sírio –
chamado de turco pelos inimigos – chegou ao Brasil com 14 anos, em 1915. Veio
fugido das perseguições do Império Otomano pela qual passava a Síria, e da ação
sanguinária do general Jamal Pachá, que alistava jovens como Benjamin no
Exército. Foi morar com uns parentes distantes, os Elihimas, no Recife, que por
sua vez faziam a vida vendendo miudezas no comércio. Virou caixeiro-viajante e
começou a explorar a credulidade do povo: contava sua vida na Terra Santa e,
entre uma história e outra, vendia os produtos.
Depois de dois
anos perambulando pelo sertão, ele se deparou com um grupo de romeiros
indo a Juazeiro para receber a bênção de Padre Cícero. Decidiu se juntar a eles
e, quando chegou, o padre reconheceu Abrahão como diferente em meio a tantos
caboclos. Porque era um indivíduo branco, meio alourado e bem mais alto que a
média.
A beata
Mocinha (Joana Tertuliana de Jesus, secretária e tesoureira do padre Cícero) se
aproximou, a mando do padre, para saber de onde vinha o forasteiro. O sotaque
estrangeiro o denunciou e foi aclamado por todos quando disse que vinha da
Terra Santa. “Padre Cícero se dirige aos fiéis e diz: meus amiguinhos, Benjamin
que está aqui é conterrâneo de Jesus”, afirma o historiador Frederico
Pernambucano de Mello.
Bastaram 15
dias para Abrahão se converter e ser nomeado secretário pessoal do padre. A
beata Mocinha era chefe de uma ordem que tinha por objetivo arrecadar donativos
para mandar aos padres que cuidavam do Santo Sepulcro na Terra Santa. A
presença de Abrahão ali, então, era como uma purificação para a casa.
O sírio foi
esperto. Já no início, ele se declarou ourives e passou a cuidar das joias do
religioso. Não demorou a prosperar na vida: comprou ternos de casimira inglesa
e gravata de seda pura. Algumas testemunhas contavam que ele cuidava de joias
belíssimas que deviam ser de Padre Cícero.
Rua de
Juazeiro na década de 1920
Para Benjamim
Abraão, os anos de 1917 a 1934 – tempo em que viveu ao lado do padrinho – nunca
mais seriam os mesmos. Abrahão virou um homem da sociedade.A morte do Padre
Cícero, aos 90 anos, fez com que Benjamin caísse em desespero. O padre era o
ganha pão do sírio. Para salvar o bolso, então, ele filmou o enterro do padre
para a Aba film e, malandro, abriu as portas para depois oferecer à mesma Aba
film uma película (e fotos) de Lampião e de seu bando – já que desde 1930 o
jornal New York Times noticiava as muitas façanhas de Lampião.
Abrahão tinha,
estranhamente, uma credencial de jornalista quando chegou ao Brasil, escrita em
francês. Em certa ocasião conheceu o pioneiro do cinema no Brasil, Ademar
Albuquerque, que mais tarde criou a Aba Film. Conseguiu filmadora, tripé e uma
máquina fotográfica e foi atrás do grupo, pois já conhecia Lampião de uma
visita que o cangaceiro fez ao Padre Cícero em 1926, no Juazeiro.
Lampião não
apenas fez pose para a foto como chamou o bando de todo o Nordeste para se
reunir na filmagem. O resultado: Noventa fotos de qualidade
heterogênea e um filme de 35 mm (hoje restam 15 minutos dele na Cinemateca
Brasileira) em que Lampião é transformado em garoto propaganda da Bayer, que
patrocinou o filme. Alegremente agitado, ele diz na gravação que até Lampião
usacafiaspirina quando tem dor de cabeça...
Abraão morreu
em 1938, em Serra Talhada (PE), assassinado com quarenta e duas punhaladas, sem
que o crime jamais viesse a ser esclarecido, tanto na autoria como na
motivação, donde se especula ter sido mais uma das mortes arquitetadas pelo
Estado Novo uma vez que o sírio teve seus trabalhos apreendidos pela ditadura
de Getúlio Vargas, que nele viu um antagonista do regime. Mas também existe a
versão de que o fotógrafo sírio-libanês teria sido vítima de um ladrão, apesar
de com este nada de valor haver.
Fontes:
Benjamin
Abrahão, Entre Anjos e Cangaceiros. Frederico Pernambucano de Mello. Ed.
Escrituras. 352 páginas.
Wikipédia
Fotos Aba Film
http://cearaemfotos.blogspot.com.br/2015/11/benjamin-abraao-o-polemico-secretario.html
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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