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domingo, 11 de setembro de 2016

CURRALINHO E OS ESCOMBROS DA HISTÓRIA

Rangel Alves da Costa*


Curralinho é uma povoação ribeirinha, às margens do Velho Chico, no município de Poço Redondo, este fincado no Alto Sertão Sergipano do São Francisco. Situa-se na região mais semiárida, mais seca e mais empobrecida do Nordeste brasileiro. É um contexto geográfico até contrastante, vez que a secura da terra não fica muito distante das beiradas do São Francisco. Da sede do município à margem do rio não são mais que 14 km.

Pois bem. Foi nas beiradas do São Francisco onde todo o povoamento do sertão sergipano teve início. E foi em Curralinho que o homem e o animal primeiro aportaram, vindos dos litorais mais distantes, ainda nos tempos da colonização portuguesa e invasões holandesas, para ali colocarem os pés e darem início ao que se tem hoje como sertão. E o nome Curralinho pelos pequenos currais que foram surgindo assim que os rebanhos eram descidos das embarcações.

A partir destes pequenos currais, verdadeiros “curralinhos”, o forasteiro, então se tornando desbravador dos desconhecidos sertões, foi abrindo veredas entre as serras até encontrar local apropriado para erguer moradia, levantar novo curral, demarcar e tomar posse da terra inabitada. Assim, passo a passo, a partir das beiradas do Velho Chico, o sertão foi sendo povoado. Contudo, Curralinho permanecia com fundamental importância neste nascente contexto sertanejo.

Ora, era das margens do Curralinho, bem defronte às altas calçadas que ainda servem de proteção às grandes enchentes, que toda a vida sertaneja respirava. As grandes embarcações, chatas e vapores, faziam percurso trazendo e levando pessoas, mercadorias, animais, tudo. Açúcar, carvão, tecidos, farinha, café, nada do utilizada deixava de chegar por aquelas beiradas. Daquele porto se seguia a Pão de Açúcar, Penedo, Propriá, e daí ao mundo inteiro. E não havia outro meio de chegar ou partir.

Em tal contexto, logo se observa a importância que Curralinho passou a ter. A própria povoação possuía um comércio florescente e com sustento garantido a toda população, não apenas pela pesca abundante, mas principalmente pelo intenso tráfego comercial. O espelho desse tempo de pujança ainda pode ser mirado nas velhas construções, de beleza arquitetônica inigualável, mas que, infelizmente, estão se tornando em verdadeiros escombros. São os escombros da história de Curralinho, de Poço Redondo, do sertão.

O que aconteceu como o Poço de Cima – local de nascimento da cidade de Poço Redondo – é o mesmo que está acontecendo com Curralinho. Quem chega hoje ao Poço de Cima avista somente restos e escombros de toda a grandeza de um dia. Até mesmo a Capela de Santo Antônio teve de ser “adotada e cuidada” sob pena de mais nada restar ao lado dos antigos túmulos familiares. E o mesmo está acontecendo com Curralinho. Quando as últimas quatro ou cinco casas do Poço de Cima desabarem de vez, apenas a capela e o cemitério restarão da antiga e rica história.

Daquelas antigas e belíssimas construções de Curralinho, somente umas duas ou três continuam de pé, habitadas, e em cujos interiores ainda é possível encontrar a feição viva do passado. Já as demais ou foram completamente derrubadas ou possuem somente a fachada em pé, e mesmo assim quase desabando. Perante tais fachadas, é como se o tempo fosse da história. Mas não. São os descasos humanos que sempre levam ao abandono e à destruição.

Tais relatos são testemunhos do que ontem, sábado, dia 10, pude presenciar. Estive em Curralinho e fui andando de rua a rua, descendo e subindo beco, virando esquina, e cada vez mais me afligindo pela situação daquelas imponentes e suntuosas moradias. Como dito, apenas duas ou três ainda preservam as antigas arquiteturas tanto nas fachadas como nos interiores, mas já com mostras de voraz destruição. As outras, apenas com o que resta das fachadas, esperam apenas o sopro do tempo. E sem o devido cuidado, toda pedra se transforma em pó. Infelizmente.

Escritor
blograngel-sertao.blogspot.com

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