*Rangel Alves da Costa
O que dizer de um templo católico, principal igreja de uma cidade, de percurso histórico de mais de um século, sempre reformada segundo o crescimento da população e o advento de fiéis, mas que de oito meses para cá é avistada sem teto, completamente destelhado, num só vão entre o piso, as paredes laterais e o que houver lá por cima?
Esta igreja existe e está localizada na sede do município de Poço Redondo, no sertão sergipano. Com efeito, após ameaças de desabamento do antigo teto, ocasionadas principalmente por cupins e falta de manutenção, a Matriz de Nossa Senhora da Conceição de Poço Redondo ficou inteiramente desprovida de qualquer cobertura, pois de canto a outro, desde a entrada à sacristia e outras dependências, tudo ficou à mercê do sol, da chuva, do vento e outras surpresas do clima sertanejo.
Muito difícil de acreditar que assim continue acontecendo, mas já são mais de oito meses que a Igreja Matriz de Poço Redondo está na triste e lamentável situação de não ter teto. Por mais esforços que Padre Mário César, pároco do município, venha fazendo, nada ainda foi conseguido que modifique a situação. Já foram feitos bingos, quermesses, festas beneficentes, arrecadações de porta a porta, mas ainda assim não foi obtida a quantia suficiente para a resolução do problema.
Além de ser uma igreja que sofre e que chora é também uma igreja que se inunda, se alaga e se destrói nas paredes, no piso, nas estruturas restantes. A continuar assim, daquele templo maior somente restará o chão vazio, nu, como angustiante recordação de tanta pujança de fé e abnegação religiosa. E com a festa da Padroeira Nossa Senhora da Conceição que se aproxima (06 a 15 de agosto), certamente que será uma comemoração religiosa mais triste, muito diferente do que a comunidade católica de Poço Redondo acostumou a ter.
Quem passa pela Praça da Matriz e avista a igreja de portas fechadas, sequer imagina a desolação por dentro, sequer imagina que o frio e a desproteção também adoecem o sentimento religioso de um povo. Após as portas da frente, apenas o imenso vão desolado, triste, como que abandonado. Mas não, pois mesmo “na barca nua”, como o Padre Mário sempre se refere à igreja sem teto, missas ainda são celebradas nas noites sem chuvas ou ameaças de chuvaradas.
Conforme afirmado, a Igreja Matriz de Poço Redondo, marco maior da religiosidade municipal, é de longo percurso histórico. Surgida como uma simples capela na antiga povoação sertaneja pertencente ao município de Porto da Folha, ao longo dos anos foi sendo ampliada e reformada para acolher fiéis em maior quantidade. Quando, a partir de 1953, a povoação foi desmembrada das terras buraqueiras, então a igrejinha passou a ter o status de matriz municipal e tendo como padroeira Nossa Senhora da Conceição. A situação em que hoje se apresenta confronta, pois, com toda a luta de um povo para a grandiosidade e beleza do templo.
A atual matriz sem teto foi a segunda igreja construída em Poço Redondo, pois a primeira foi a Capela de Santa Antônio do Poço de Cima, pelos idos do século XIX, através das mãos dos primeiros colonizadores, distando cerca de dois quilômetros da atual sede municipal e quando a localidade ainda era denominada Poço de Cima. Quando moradias e propriedades começaram a se espalhar mais abaixo, num local conhecido como Poço de Baixo, e onde está a atual cidade de Poço Redondo, os seus habitantes logo cuidaram de construir uma pequena igreja. E esta foi a raiz primeira da atual igreja matriz.
Igreja Matriz de Nossa Senhora da Conceição de Poço Redondo, já teve, no passado distante, até o Capitão Lampião e parte de seu bando ajoelhados perante o seu altar. Conta a história que nos idos do mês de abril de 1929, chegando de repente ao pequeno arruado sertanejo e logo se dirigindo à casa de China do Poço para repouso e regabofe, o capitão cangaceiro foi surpreendido com a presença do Padre Artur Passos, vigário municipal que duas vezes por ano se dirigia à povoação para celebração de missa. Foi o encontro entre a cruz e o mosquetão. E somente depois de dividir a mesa com o religioso foi que Lampião conseguiu permissão para assistir missa junto com o seu bando. A única condição imposta foi que o armamento pesado ficasse do lado de fora.
Mas esta matriz de tantas histórias e tantos percursos, agora é apenas uma igreja que sofre, que chora, que padece. Cada pingo d’água que cai sobre o seu interior é como se uma lágrima se derramasse sobre a fé de um povo. Algum dia uma nova cobertura será colocada, mas enquanto isso apenas uma igreja de aflitiva desproteção, entregue às intempéries e ao deus-dará da incompreensão de tantos. Não há que culpar ninguém. Mas há que culpar todo mundo. O templo é de todos, mas são poucos os que vão além do olhar de piedade em busca de meios eficazes para a resolução do problema.
Escritor
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