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domingo, 13 de agosto de 2017

ZÉ SERENO – CANGACEIRO APOSENTADO.

Por Geraldo Júnior

Durante oito anos ele enfrentou chuva, frio, sol, fome e sede nas caatingas enquanto as balas dos policiais passavam perto.

Os motivos que levaram Zé Sereno ao cangaço continuaram criando-lhe problemas durante toda a vida. Lê e escreve mas só passou 29 dias na escola. É um homem que nunca abriu um livro mais sério, mas fala com tranquila profundidade sobre a necessidade de se “respeitar a dignidade humana”. E se enfurece quando a norma central de seu código é desrespeitada.

“Homem é homem, não é bicho. Tem que ser respeitado”.

Tudo para ele é simples. Não percebe que foi figura importante de um capítulo da nossa história. Para ele tudo “são coisas da vida”.

Conta como entrou para o cangaço, as injustiças que sofreu, com um misto de fatalismo e bom humor irônico. A amargura é rara, porém quando surge brota junto com a violência.


A CULPA DA POLÍCIA.

“Zé Sereno” explica que a única saída era o cangaço. Sua vida nunca foi fácil. “Lá no Nordeste a gente nasce e sobrevive sem perceber muito como e nem por que. Vai vivendo, brigando contra o clima, a falta d’água, quase tudo. Escola e médico não existem. Mas a gente tinha umas terrinhas dois primos e dois tios no cangaço. Sabe? Lá a polícia fazia o cangaceiro”.

Lembra que nasceu a 22 de agosto de 1913 e que, aos 17 anos, já era homem feito. 

“Lá a gente crescia e amadurecia logo porque a vida era curta e o trabalho excessivo. O sítio ia bem, pelo menos nos moldes de progresso de lá. Tinha 17 anos quando os soldados chegaram. Queriam informações sobre meus tios e primos cangaceiros. Não sabíamos nada, mas quebraram tudo que tínhamos em casa. Depois nos obrigaram a morar na cidade para evitar que déssemos guarida a eles”.

“Como diz o outro, lá não havia educação. Tudo era na base da ignorância e da estupidez. Ficamos na cidade pensando nas plantações e na criação porque iam morrer por falta de cuidado. Um dia eu disse pra Lídia, minha mãe:

- “Olha, pra morrer ou viver eu vou voltar para casa”.

Cheguei e fui agredido por um soldado. Disse que era a primeira e última agressão que na vida e me juntei ao cangaço exatamente quando a propriedade ia bem e parecia que a vida ia melhorar.

Partiu na caatinga e foi deixando recados. Era sobrinho de Antônio Ingraça (Ingrácia), Arceto e primo de Zé Bahiano e Antônio Dicenauro (Sionário). Estava procurando o cangaço. 

“Lá tudo anda depressa. A morte e os recados seguem a mesma trilha e a fome acelera tudo. Principalmente mensagem para Lampião”.

“ZÉ SERENO” NASCEU

Encontrou os parentes e “Lampeão”, ganhou fuzil e trocou de nome. “Zeca da Lídia” (Zé de Lídia) não era nome de quem vai viver matando até chegar seu dia. Virou “Zé Sereno” porque era tranquilo. Foi aprendendo rápido. Atirar e brigar de faca era mais fácil que andar de alpercatas pelas caatingas espinhentas sob o sol forte, as vezes dormindo no molhado da chuva e de um ou outro arroio, com pouca comida e água. Mais difícil ainda era saber em quem confiar.

O povo gostava dos cangaceiros. “Lampião” punia os fazendeiros que não pagavam os trabalhadores e eram numerosos. Até padres apoiavam.

“Também éramos todos católicos, graças a Deus”. Havia muitos fazendeiros que contribuíam com dinheiro. O armamento era caro, mas fácil e bom. Os próprios oficiais da polícia também vendiam fuzis modelo 22, Parabelluns 9 e 7,63 milímetros, por seiscentos mil réis cada arma e dois mil réis o cartucho.

Mas a polícia tinha seus aliados. De boa vontade eram poucos mas por medo não faltavam quem falasse.

“Havia gente que nos acolhia porque gostava e, depois informava a polícia porque tinha medo”.

Mas “o povo era muito bom, se não a gente teria sido derrotado”. Além das duas cartucheiras de parabellum, mais duas de fuzil, no embornal iam sempre mais 700 ou 800 cartuchos. “Agora saber em quem confiar era mais difícil”.

“Zé Sereno” foi se tornando especialista em descobrir amigos e inimigos. Conta que quando via Pedro de Cândida (Cândido) “sentia o coração palpitar. Sempre soube que ele iria traia”.

Avisou “Lampeão” mas o “Velho Cego” respondeu que Pedro era seu coiteiro há 8 anos. Só concordou em sair na manhã seguinte, depois que eu ameacei me retirar com meus homens, mesmo sem ele.

A traição de Pedro de Cândida (Cândido) custou a vida de “Lampeão”. Restou um grupo de 27 homens.

Texto: José Eduardo
Fotos: Narciso Santos
Fonte: Diários Associados
Transcrição/Adendo: Geraldo Antônio de Souza Júnior

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