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terça-feira, 14 de novembro de 2023

DINDA E DELICADO: DE POÇO REDONDO AOS PASSOS DE LAMPIÃO, UM AMOR NO CANGAÇO.

Por Rangel Alves da Costa

Dinda, nascida na região do Poço de Cima (primeiro núcleo habitado de Poço Redondo), batizada como Idalina Alves, era filha de Presentino Alves e Dona Eutímia. Dinda era irmã de Dona Jovita e Mané de Tino, dentre outros, e sobrinha de Teotônio Alves China (o China do Poço, meu avô materno). Era, pois, uma legítima representante da família Alves. Já Delicado, nascido e crescido nos arredores do atual Alto de João Paulo, logo após a sede municipal, possuía como nome de batismo João Batista (ou João Braz de Souza), mas era mais conhecido como João Mulatinho. Filho de Antônio Mulatinho e irmão da cangaceira Adília, João, diferentemente de outros jovens sertanejos, nem pensava nem queria ser cangaceiro, mesmo já tendo uma irmã levada por Canário e servindo ao subgrupo de Zé Sereno, onde sua conterrânea Sila, por ser companheira do chefe, também tinha voz de mando. Aquele que mais tarde se tornaria o cangaceiro Delicado tinha uma só preocupação no seu dia a dia sertanejo: amar e cada vez mais amar uma bela mocinha moradora do Poço de Cima, sua meiga e querida Dinda. Aliás, os dois jovens planejavam ir muito além daquele namoro, pois desejavam mesmo a vida em comum e a colheita dos frutos que aquela abençoada união permitisse. Dizem que certa noite, sob o clarão da lua grande, João abraçou sua amada de modo diferente, pois um abraço mais caloroso, mais forte, mais apertado e que chegou acompanhado de palavras quase trêmulas: “Nada nem ninguém nunca vai separar nós dois”. Até que as curvas do caminho tentaram separar, mas não conseguiram. Seus destinos já estavam traçados. Os dois alimentavam cada vez mais seus planos futuros, quando um episódio quase destrói seus sonhos. Adília, irmã de João, já estava no cangaço, e por isso mesmo sua família passou a ser perseguida e ameaçada pelo sargento Deluz, com base de comando em Canindé de São Francisco, vizinho a Poço Redondo. Certa feita, andejando pelos matos e pelos beirais dos riachos, ao longe João avistou uma cena que lhe fez apressar o passo. Ora, logo adiante, na beira do riacho, alguém estava sendo espancado por Deluz, que tomava a frente de seus comandados na prática da violência. Foi se aproximando cada vez mais por dentro do mato, porém com o cuidado de não ser percebido, até que o espancamento se mostrou inteiro perante seus olhos. Quem estava sendo espancado era seu pai, também pai de Adília, o velho Antônio Mulatinho. E o pior: sabia que se corresse em sua defesa seriam mortos os dois. Tomado de fúria, prestes a explodir, reconheceu apenas o soldado Galdino (também de Poço Redondo) se aproximando do ensandecido sargento e exigindo que parasse com aquela brutalidade contra aquele velho senhor, pois este era homem sério e trabalhador. Foi o que salvou o pai de Adília. Mas o ódio se alastrou em seu filho, em João, o futuro Delicado. Ciente de que sozinho não poderia enfrentar aqueles perigosos algozes, que sozinho não poderia vingar toda a violência que se espalhava pelo sertão, então prontamente decidiu ir pro cangaço. Preocupou-se somente em mandar um recado pra sua bela Dinda e dizendo que se preparasse que logo ele retornaria para levá-la consigo. E assim foi feito. Não casaram em igreja, mas perante os braços abertos do mandacaru e do xiquexique. Servindo ao subgrupo de Zé Sereno, estavam em Angico quando o tronco maior do cangaço foi dizimado em julho de 38. Quando das “entregas”, ficaram temporariamente separados, mas depois se reencontraram e seguiram para uma nova vida no sul do país. E até a morte cumpriram seu juramento de amor: “Nada nem ninguém nunca vai separar nós dois”.

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