Por: João de Sousa Lima
Um ano
depois da emboscada policial em Angicos (SE), em 1938, que resultou na morte de
Lampião, Maria Bonita e nove cangaceiros, um bebê com 30 dias foi entregue ao
padre Frederico Araújo, de Tacaratu, no sertão de Pernambuco, a cerca de 450
quilômetros a oeste de Recife. Um bilhete anônimo, ilustrado com garranchos que
imitavam letras, identificava os avós e a mãe, Durvalina Gomes de Sá. Durvalina
era Durvinha, cangaceira do bando de Lampião. Com a morte do chefe, caíra na
clandestinidade. Fugia da polícia rompendo a caatinga, ora na Bahia, ora em
Pernambuco, sempre ao lado do companheiro, Antonio Inácio da Silva, o
cangaceiro Moreno.
Durvinha e João de Sousa Lima, na residencia da cangaceira em Belo Horizonte.
O menino -
primeiro dos seis filhos do casal - foi registrado como Inácio Carvalho
Oliveira, sobrenome da família que o adotou quando estava com 6 anos, após a
morte do padre. Adulto, Inácio mudou-se para o Rio. Entrou para a Polícia
Militar.
Durvinha lançando com o autor sua biografia.
Tornou-se
segundo tenente. Em 2005, com 66 anos de idade e já reformado, soube enfim que
os pais estavam vivos e formavam o último casal sobrevivente do cangaço.
Moravam em Belo Horizonte e se chamavam Jovina Maria da Conceição e José
Antonio Souto, nomes registrados em carteiras de identidade e com os quais
buscaram afastar os fantasmas do passado.
Almoço na casa da cangaceira com os filhos Murilo e Nely
Toda esses
fatos foram contados ontem por parte dos protagonistas, no encerramento do 1º
Congresso Nacional do Cangaço: Cultura e Memória, realizado no Museu da
República, mais um prédio futurista projetado por Oscar Niemeyer na Esplanada
dos Ministérios, em Brasília.
Em Brasilia participando do 1° encontro do cangaço do Brasil
Durvinha, de
92 anos, estava lá, para narrar seus feitos; Moreno, de 96 anos, sofreu uma
queda pela manhã e teve de ser levado para o Hospital de Base. "Me sinto
tão culpada. Ele caiu porque foi pegar um sapato meu. Nós dois já não
enxergamos quase nada." A informação do hospital é de que Moreno está bem
e deve ser liberado hoje.
Durvinha sendo entrevistada por João e Kydelmir Dantas em Brasileira-DF
O crachá da
cangaceira registrava o nome da identidade, Jovina Maria da Conceição. Inácio,
porém, não a chama assim. Para ele, é Durvalina ou Durvinha. Do pai, nem
conseguiu se lembrar o nome todo na identidade. "Acho que é José Antonio,
e tem um sobrenome aí que não sei. Para mim, ele é o Antonio Inácio da Silva ou
o Moreno." Inácio disse ter por hábito visitar Tacaratu quase todo ano.
FUGA
Durvinha
nasceu em 1915 no povoado de Arrasta-pé, em Curral dos Bois, hoje Paulo Afonso
(BA). Ainda mocinha abandonou a casa dos pais para correr atrás do cangaceiro
Virgínio, cunhado de Lampião. Não sabe quantos anos tinha. "Não havia
registro. Era tudo na bruta. A gente se juntou. Não chegamos a ir ao
padre". Disse que teve dois filhos com Virgínio, dos quais nunca mais teve
notícias depois dos tempos do cangaço.
Mensagem de João de Sousa Lima na morte da amiga Durvinha.
Virgínio foi
morto em 1936. "No bando não podia haver viúvas. Pelas leis lá, ou elas se
casavam com outro cangaceiro ou eram mortas. Moreno se propôs a ficar comigo",
disse Durvinha. Com ele teve outros seis filhos: Inácio, que só conheceu há
dois anos, e outros cinco, todos morando em Belo Horizonte. Durante as fugas
pela caatinga, o jeito era pegar um pedaço de rapadura aqui, um punhado de
farinha ali, driblar a fome e a polícia. "Morria de medo de ser degolada,
como Lampião."
Em Fortaleza o recontro do casal Moreno e Durvinha com a amiga Aristeia.
No filme Baile
perfumado (1996), direção de Paulo Caldas e Lírio Ferreira, aparecem imagens do
bando de Lampião feitas entre 1935 e 1936 pelo libanês Benjamin Abrahão. Numa
delas, Durvinha dança com Moreno, embora estivesse na companhia de Virgínio.
Noutra, avança sobre a câmera com o revólver na mão. Durante os combates, ela
levou um tiro na coxa esquerda. "A carne rasgou de fora a fora. Os
cangaceiros me salvaram jogando um litro de pimenta." Durvinha disse que
só teve uma razão para aderir ao cangaço: a paixão por Virgínio.
Lançamento da biografia em Belo Horizonte
João de Sousa
Lima é escritor, pesquisador, autor de 09 livros. Membro da Academia de Letras
de Paulo Afonso e da SBEC- Sociedade Brasileira de estudos do Cangaço.
Telefones para contato: 75-8807-4138 9101-2501 email: joaoarquivo44@bol.com.br
joao.sousalima@bol.com.br
http://www.joaodesousalima.com/2013/04/cangaceira-durvinha-um-pouco-de-sua.html
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