Quem não
conhece a História, acha, com certeza, que naqueles idos tempos as crianças e
adolescentes já nasciam e cresciam de arma em punho, sem seus pais nunca
tomarem providências para que a violência não existisse. Puro engano, tanto de
um lado como do outro, houve tentativas da ‘coisa’ não ir ao extremo que foi.
Tanto o pai de Zé Saturnino como o de Virgolino, principalmente o último, fez
várias e várias tentativas para que a paz reinasse naqueles rincões sertanejos.
José Ferreira e Maria Sulena pais de Lampião
Quem nos conta essa parte da História, é nada menos nada mais, que o valoroso em volante João Gomes de Lira, através das páginas do seu belíssimo livro.
“(...) Por não querer barulho, no ano de 1917, para não ver seus filhos em desmantelo, José Ferreira resolveu se retirar do seu lugar, sítio Passagem de Pedras.
Escombros da casa dos pais de Zé Saturnino
Para isto, falou com o professor Domingos Soriano, para procurar um lugar no distrito de Nazaré para comprar(...) Tendo o Professor apalavrado no lugar Poço do Negro, (distando) três quilômetros para o povoado de Nazaré, um terreno pertencente ao Sr. Antônio Freire. Feito o negócio, José Ferreira vende a sua terra em Passagem de Pedras aos Senhores Venacinho Nogueira e Néo das Barrocas, ambos residiam na ribeira do Riacho de São Domingos. Concluído o negócio, foi feito um acordo: os Ferreira não deveriam ir ao Riacho São Domingos, como também José Saturnino com os Nogueira não deveriam ir a Nazaré. Desse modo, José Ferreira deixou a sua querida morada.
Os Ferreiras
chegaram a Nazaré, com o seguinte aspecto: chapéu de couro quebrado na frente e
atrás, barbicacho passado no queixo, roupas de mescla, blusa tipo as usadas
pelos cangaceiros do Sertão, montados em possantes cavalos galopando com os
rifles enganchados aos ombros. Viajavam demonstrando uma verdadeira posição de
combate, distante um do outro, tática usada pelos veteranos cangaceiros do
Sertão. Tudo isso foi observado pelos nazarenos, principalmente pelo jovem
Aureliano Francisco de Souza (Lero Chico), que se encontrava no lugar José
dias, próximo a Nazaré, onde presenciou tudo minuciosamente, inclusive viu que,
quem viajava na frente, era o Inspetor Manoel Lopes.
Zé Saturnino primeiro inimigo dos Ferreira
Um dia, José
Saturnino foi avisado que os Ferreira tinham ido visitar sua tia, Joaninha
Ferreira, na Serra Vermelha. Não satisfeito com a desobediência dos inimigos,
José Saturnino manda Tibúrcio dos Santos, ‘cabra’ de confiança dele,
emboscá-los nas proximidades da casa da tia deles, Joaninha Ferreira. Porém,
como os Ferreira não vieram, nada aconteceu naquele dia. José Saturnino, tinha
vendido um animal ao Sr. Agripe de Manoela, que mora em Nazaré, e o mesmo achou
por bem ir receber o pagamento do animal vendido, em Nazaré. Assim, entre os
meses de fevereiro a março de 1918, José Saturnino com o companheiro José
Cipriano foram para Nazaré, desobedecendo Saturnino, ao acordo que haviam
firmado.
Escombros da casa dos pais de Lampião
Em Nazaré, o
Major João Gregório Ferraz Nogueira, notando Virgolino Ferreira num movimento
completamente estranho e desusado, pediu a José Saturnino que tivesse muito
cuidado. Este agradeceu, porém dizendo que não os temia, que podiam vir da modo
que entendessem, pois estava pronto para recebê-los do jeito que quisessem.
Adiantou que não estava ali por afronta a ninguém, porque a finalidade de sua
presença em Nazaré era a de receber o dinheiro de seu negócio. A tarde, ao
regressarem, José Saturnino e seu companheiro José Cipriano foram emboscados
por Virgolino e seu primo Domingos Paulo. No dia seguinte, a frente de
dezesseis ‘cabras’, José Saturnino cerca e ataca os Ferreiras na casa onde
estavam, que era de sua tia Chica Jacoza, em Poço do Negro. Naquele dia,
Virgolino enfrentou José Saturnino, com o tio Manoel Lopes e os primos
Sebastião, Francisco e Domingos Paulo e o ‘cabra’ Luiz Gameleira. Notava-se
naquele dia a ausência dos irmãos de Virgolino, Antônio e Livino Ferreira, por
se encontrarem em viagem para Triunfo - PE. Por aqui já se tinha uma noção de
quem era Virgolino Ferreira nas armas. Ficou naquele dia, definida a questão
entre os Ferreira, José Saturnino e os Nogueiras (...)”.(Transcrito).
Daí para
frente, o Sr. José Ferreira, submete-se a outras tentavas... Vendendo seus
bens, destruindo aquilo que passou a vida para ‘arrumar’... nas quebradas do
Sertão.
Fonte livro
"LAMPIÃO - Memórias de um Soldado de Volante", LIRA, João Gomes de.
LIRA. FUNDARPE, Recife, Impresso Brasil 1990, pgs 33 à 35.
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