Por Roberto Soares
Coronel
Cornélio Soares
A vida é cheia
de surpresas e quando menos se espera a verdade aparece repentinamente. No
dizer popular, “a mentira tem pernas curtas”. É prazeroso quando o bom
imprevisto bate à sua porta de forma súbita! Contudo, para facilitar o
entendimento desse caso que passo a narrar, preciso discorrer sobre fatos
pretéritos, nascidos a partir de falsas premissas, ou melhor, de uma “estória
mal contada”.
Devo
esclarecer que vários autores, transcreveram trechos
do equivocado livro de Rodrigues de Carvalho, “que alguns escritores
consideram um clássico” (?), assinalando na parte que cita o Cel. GN/PE
Cornélio Soares e o Cel. PM/PE Teofhanes Ferraz, verdadeiros exemplos no Sertão
de outrora, como prováveis responsáveis pelo envio de armas para cangaceiros
num certo dia de 1925.
Aliás, é bom
registrar que falar mal de policiais causa exultação, e afrontar os falecidos
coronéis de uma época em que as únicas referências sertanejas eram a seca e o
cangaço, afigura-se como provocação extasiante, quiçá sensação de turgescência.
Escritores por vezes omitem fatos positivos e exteriorizam vastamente os
negativos, ocultando ou distorcendo a verdade, almejando não se sabe bem o quê.
Pois bem,
depois que “Serrote Preto” apresentou essa versão esdrúxula, um dos que
transcreveram resolveu insinuar que esses dois coronéis eram “BANDIDOS” numa
entrevista ao repórter Francisco José na Rede Globo de Televisão, emissora de
larga divulgação, o que torna desmesurado o prejuízo à imagem desses íntegros
homens públicos.
Tem-se que a
palavra “BANDIDO” significa bandoleiro, quadrilheiro, salteador, ladrão,
criminoso, assassino, delinquente, homicida, pistoleiro, trapaceiro, facínora,
salafrário, malfeitor, mau-caráter, etc. Porquanto, advirta-se que o sujeito
para ser de fato assim considerado, precisa de culpa ou dolo formal, além de
uma condenação protocolar. Sem condenação na verdade não pode ser chamado de
“bandido”, mesmo que contra si tramite uma situação “sub judice”.
Interpelado, o
equivocado narrador fincou premissa em outros livros que incidiram na mesma
versão (de “Serrote Preto”), e proferiu que “não era crime naquela época vender
armas”, todavia, não sucumbiu qualquer condenação, mesmo administrativa,
imposta aos ilustres Cornélio e Teophanes sobre o aludido caso de 1925, embora
tenha sido instado. E, não apresentou alguma prova material do imaginável
“delito” que pudesse corroborar a escrita ou declaração à imprensa, já que
teceu acusação tão séria. Ora, seria adequado que tivesse anexado a cópia de um
inquérito, intimação, citação, recibo, nota fiscal, carta, bilhete, documento,
etc., porém, nada disso veio à tona, salvo cópias dos tais livros que na
verdade se constituíram em réplicas do saltério “Serrote Preto” de Rodrigues de
Carvalho.
Rodrigues de
Carvalho
Não bastasse,
a insensata e exasperada escrita de Rodrigues de Carvalho em Serrote Preto
(pág. 293), que demonstra simples e claramente “uma presunção”, porque na
verdade ele não prova o que diz com algum documento. Tão-somente, cinge-se
a repassar, de forma irresponsável, uma variante fantasiosa criada pelo
cangaceiro conhecido por “Cancão”, que o fez obviamente de forma maldosa
para se vingar de Teophanes, o qual, heroicamente jamais deu trégua a
bandoleiros. Por que Rodrigues não pesquisou um pouco mais antes de escrever?
É cediço que
com base no direito, quando se tem a presunção de um fato, aplica-se o
consagrado princípio jurídico “in dubio pro reo”. Na dúvida, o juiz é
compelido a absolver o réu. Mas, alguns escritores tendem a agir,
desfigurando princípios éticos e de Direito, talvez por não aceitarem os fatos
optam em repassar situações advindas da paixão, divorciadas da realidade
histórica. Só tendem a preocupar-se mesmo quando um caluniado, difamado ou
injuriado resolve ingressar com um processo criminal para saldar a inverdade,
ou uma ação cível para reparar os danos morais causados ao inocente da vez.
Escondem-se na sombra de terceiros. É uma lástima, mas é a mais pura verdade.
Geraldo Ferraz
Retornando ao
ponto essencial, aconteceu um lance espetacular que pode mudar o curso da
história, ou da “estória”, como queira designar o leitor. Confesso que devemos
isso ao GECC – Grupo de Estudos do Cangaço do Ceará, ao GPEC – Grupo Paraibano
de Estudo do Cangaço, ao ditoso “CARIRI CANGAÇO” e, por óbvio, em especial ao
escritor que revelou o fato, bem como à investigação realizada por Geraldo
Ferraz junto à PMPE. A pesquisa responsável e imparcial empreendida por
esses grupos compostos por homens de bem dedicados e estudiosos, vem produzindo
bons frutos e com isso a verdade começa a aparecer de forma cristalina.
O ápice da
questão é que um dos bons amigos de Rodrigues de Carvalho (autor de Serrote
Preto), o eminente escritor Antônio Amaury Correia de Araújo, de São
Paulo/SP, homem isento e de reconhecida responsabilidade, em texto muito claro
para o GECC/Cariri Cangaço (set./13), colocou em dúvida a versão de
1925 que eventualmente teria ocorrido na Serra do Saco em Serra
Talhada/PE, próximo da divisa com a Paraíba. Disse o estudioso Amaury que o
respeitável escritor e pesquisador Geraldo Ferraz, vasculhou os
arquivos da Polícia militar de Pernambuco e nada encontrou sobre o
sangrento episódio contado por Cancão, o cangaceiro cujo nome era José Firmino
e fora a fonte única de Rodrigues de Carvalho nesse episódio, que inclusive
acabou por envolver os Cels. Cornélio e Teophanes. Ressalte-se:
qualquer cidadão poderá fazer essa pesquisa no Comando da PM/PE. Finalmente,
Amaury fechou a questão revelando que a imprensa sempre atenta aos
acontecimentos relevantes, na época nada noticiara. Lamentavelmente, somente
agora tomei conhecimento desse relevante texto de Amaury.
Romero
Cardoso, Thiago Pereira, Manoel Severo, João de Sousa e Roberto Soares
Veja a lógica:
“Cancão” disse que fora ferido nessa ocorrência de altíssima
magnitude em que morreram vinte e cinco (25) soldados (pasme) nas
mãos dos cangaceiros. Como pode isso ter acontecido se não consta qualquer
registro nos arquivos da Polícia Militar de Pernambuco que, na época trabalhava
em conjunto com a Polícia da Paraíba? Onde estão essas viúvas? Do
mesmo modo, a imprensa dos dois Estados sempre alerta quanto aos casos
mais relevantes como esse, absolutamente nada noticiou. Na verdade, essa
ação nunca existiu nem produziu morto ou ferido.
A Polícia de
Pernambuco e da Paraíba faziam ações conjuntas contra o cangaço, especialmente
na divisa, mas nesse dia não houve nenhuma movimentação militar naquelas
imediações. Ora, se não consta na imprensa nem nos anais da Polícia Militar tal
episódio, com obviedade não aconteceu! Assim, não há como incriminar
pessoas em evento inexistente. Seria um imaginário transloucado. Além disso,
quando aferimos a biografia do Cel. Teophanes amparada em documentos oficiais
do Governo de Pernambuco, da própria Polícia e analisando os atos de nomeação e
designação, constatamos que nessa época esse ínclito oficial estava prestando
serviço muito longe.
Theophanes
Torres
Encontrava-se
em Petrolina, onde era delegado de polícia desde novembro de 1924 e de lá
informava ao Governador de PE e ao Comando da PM as andanças da Coluna Prestes.
Logo, como poderia esse oficial estar em dois lugares ao mesmo tempo, em época
tão complexa para deslocamentos? Por sua vez, Cornélio que era genro de um Juiz
de Direito da região, representava o Ministério Público Federal uma vez que
fora nomeado em 1920 pelo Ministro da Justiça de Epitácio Pessoa para a nobre e
honrosa função e agia repetidamente como mediador da luta entre Saturnino e
Lampião. Tudo como se comprova no livro de José Alves Sobrinho e Antônio
Neto (PEGADAS de um SERTANEJO – Vida e memórias de José Saturnino – Ed.
dos Autores, 2015). Amiúde, atuava em conjunto com o Juiz de Serra Talhada,
então Vila Bela.
Dessa forma,
essa variante esquisita sempre foi integralmente incompatível com a verdadeira
história de Teophanes e Cornélio. É quase como acusar Duque de Caxias de
traidor. Por isso, me senti na obrigação de escrever às pressas um livreto em
defesa do meu avô (“Coronel Cornélio Soares – Uma História de Vida em Serra
Talhada”), onde por óbvio, acastelei a conduta sempre ilibada dos dois
coronéis.
Indagações: é
peremptório que Lampião sempre foi heterossexual, pois se relacionou somente
com mulheres. Contudo, um Juiz de Direito de Sergipe disse no seu livro que
Lampião era homossexual. O citado livro foi suspenso pela Justiça e o autor
fora agredido verbalmente por escritores que não aceitaram essa variante. Mas,
homossexualidade é opção e não crime. Assim, como o seu livro foi liberado pela
Justiça em nome da liberdade de expressão, deduz-se que isso dá o direito a
outros escritores transcreverem essa versão absurda, evidentemente
citando a fonte. Se hipoteticamente o mesmo juiz tivesse contado essa versão a
Rodrigues de Carvalho, ele teria assentado isso no seu parcial livro?
Aproveitando o mesmo entendimento, faço a seguinte inquirição: por que
Cornélio e Teophanes jamais foram defendidos pelos escritores, salvo pelas suas
famílias? Observe que há uma total inversão de valores!
Após essas
fortíssimas comprovações e esclarecimentos, amplamente ratificados pelas
contestações exibidas pelas famílias dos mortos ofendidos, constata-se que o
falacioso episódio de 1925 não passa de uma grande falsidade. Pura fantasia. De
tal modo, depois de tantas ilações como reparar a honra desses dois
cidadãos injustamente aniquilada, quando certamente o direito de ação já se
encontra prescrito?
Roberto Soares
Serra Talhada, Pernambuco
http://cariricangaco.blogspot.com.br/2015/07/a-justica-tarde-mas-nao-falta.html
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