Por Geraldo Júnior
... Lampião e
seu bando chegam à cidade do Juazeiro do Norte/CE à convite do Padre Cicero
Romão Batista e do deputado Floro Bartholomeu.
Deputado Floro Bartolomeu
Lampião recebe
a polêmica e controversa patente de Capitão com o intuito de combater a coluna
de revoltosos militares liderada por Luiz Carlos Prestes e Miguel Costa, que
naquele momento marchava pelo país difundindo o comunismo.
Luiz Carlos Prestes
O texto abaixo
de autoria do Médico/Pesquisador e Escritor Magérbio Lucena explica com maiores
detalhes essa história.
http://cariricangaco.blogspot.com.br/2012/03/o-estado-maior-do-cangaco-porcicinato.html
No dia 2 de
janeiro de 1926, o deputado federal Floro Bartolomeu, eleito com os votos do
Padre Cícero, chegava de trem a Juazeiro do Norte, designado pelo presidente da
República, Arthur Bernardes, para impedir que a Coluna Prestes invadisse o Sul
do Ceará.
Vinha
acompanhado pelo major Polidoro Coelho que, no mesmo dia, partiu para Campos
Sales à frente de 360 soldados do Exército. Floro ficou no Juazeiro para
organizar os chamados Batalhões Patrióticos, exército particular com mais de
mil jagunços. No dia 9 de janeiro de 1926, a tropa irregular partiu para Campos
Sales. Chegando àquela cidade, muito cedo, Floro desentendeu-se com o major
Polidoro que retirou-se com sua tropa para Fortaleza, deixando os patriotas
sozinhos para lutarem contra os mais de 2.000 soldados invencíveis da Coluna.
Foi nesse momento de apreensão que o coronel Pedro Silvino, chefe do Estado
maior de Floro, trouxe à sua presença João Ferreira dos Santos e seu irmão
Ezequiel Ferreira. João era um dos contratados para transportar os
carregamentos de munição, mas o que era mais interessante é que ele era irmão
do mais célebre dentre todos os cangaceiros do sertão, Virgulino Ferreira da
Silva, vulgo Lampião. Chegou-se à conclusão que o cangaceiro, cujo nome era uma
legenda de valentia, deveria ser convocado. O posto seria de capitão
comissionado e, se bem sucedido na campanha, receberia do presidente da
República o indulto pelos seus crimes. O convite veio de Campos Sales para
Juazeiro, em mãos do rábula José Ferreira de Menezes. Lampião era muito sagaz e
se, além da assinatura de Floro, a carta não tivesse a do Padre Cícero, ele
jamais atenderia ao convite. Um dos empregados de João Ferreira, por nome Zé
Dandão, viajou então para a Fazenda Piçarra, em Macapá, hoje Jati, onde morava
Sebastião Paulo, primo legítimo de Lampião e juntos, com o convite a tiracolo,
foram para o Pernambuco à procura de Lampião. Ainda hoje, há quem afirme que
foi o tenente Francisco das Chagas o encarregado de procurar Lampião, o que não
é verdade. Esse senhor ficou em Campos Sales e no dia 22 de Janeiro de 1926,
quando a Coluna Prestes invadiu o Ceará pela região dos Inhamuns, participou da
perseguição aos revoltos através do Ceará, Paraíba e Pernambuco indo
encontrar-se com o célebre cangaceiro somente em fins de fevereiro daquele ano,
quando então falou com Lampião sobre o assunto. No dia seguinte, Floro
telegrafou para o rábula José Ferreira em Juazeiro:
“comunique ao nosso amigo,
que não é preciso mais Lampião, povo já seguiu perseguição revoltosos”.
No
mesmo dia, gravemente enfermo, empreendeu sua última viagem, de Campos Sales
para o Rio de Janeiro, aonde viria a falecer às 5 horas da tarde do dia 8 de
março de 1926, com 50 anos de idade.
Lampião
recebeu o convite ainda em Janeiro. Conversou sobre o assunto com o célebre
coronel Manoel Pereira Lins, vulgo Né da Carnaúba, líder da família Pereira do
Pajeú, seu amigo, que confirmou a autenticidade do documento. Por isso, quando
se encontrou, por acaso, com o tenente Chagas, que voltava com seus homens para
Juazeiro, resolveu acompanhá-lo. Seria mais seguro ir àquela cidade em
companhia de uma das tropas do Batalhão Patriótico. Por essa época, a Coluna
Prestes já estava atravessando o rio São Francisco em direção à Bahia. No dia 2
de março de 1926, Lampião, vindo de São José de Belmonte, entrou no Ceará pelo
distrito de Macapá, hoje Jati, aonde confraternizou com um destacamento da
polícia do Ceará, sob o comando de tenente Veríssimo, que o presenteou com um
Smith & Weston “novinho em folha”. No dia seguinte, amanheceram na Fazenda
Piçarra, de Antônio Teixeira Leite, onde almoçaram mais de 100 pessoas entre
cangaceiros e soldados do Tenente Francisco Chagas. Daí rumaram para o Sítio
Laranjeiras, de Antônio Pinheiro, onde todo o grupo pernoitou. No dia seguinte,
uma quinta-feira, ainda escuro, a tropa mista prosseguiu viagem para a
serra-do-mato, do coronel Antônio Joaquim de Santana, amigo e coiteiro de
Lampião. Ainda em Barbalha Lampião recebeu uma carta de Juazeiro do Norte
enviada por um certo Dr. Pedro de Albuquerque que dizia não ser mais necessária
a sua presença naquela cidade. O cangaceiro ignorou a mensagem e, à tardinha,
chegou aos arredores da Meca do Cariri ainda acompanhado do tenente Chagas, ao
todo 23 cangaceiros e mais de 70 patriotas. Acomodou-se, então, com seus
homens, na Fazenda Nova, pertencente a Floro. O delegado local, sargento José
Antônio da Coan, começou a reunir homens armados para atacá-lo, mas foi, de
imediato, repreendido pelo Padre Cícero que lhe disse que Lampião estava ali a
convite do Dr. Floro para prestar seus serviços ao governo federal. Na verdade,
já se havia preparado, com antecedência, um sobrado na rua da Boa Vista para
acomodar o bando. Na calçada em frente ficava a casa do seu irmão João
Ferreira, casado com dona Joaninha, quase vizinho às casas de dona Maria
Ferreira, sua irmã, casada com Pedro Queiroz, onde moravam também Ezequiel e
Anália, solteiros, e de Angélica Ferreira, casada com um rapaz do Rio Grande do
Norte chamado Virgílio Fortunato. Já tarde da noite, o bando veio hospedar-se
no hotel improvisado que pertencia ao poeta João Mendes. Na noite seguinte, o
Padre Cícero foi ao seu encontro, em um automóvel dirigido por Mestre Luiz, em
companhia do rábula José Ferreira e de José Gonçalves, chefe de sua segurança
pessoal. Depois de muito conversarem, o Padre mandou convidar o funcionário do
Ministério da Agricultura, Pedro de Albuquerque Uchoa, pessoa muito querida da
sociedade local, muito culto era, quase que o orador oficial de todas as
solenidades importantes da cidade, para participar da reunião.
Em uma folha
de papel almaço foi elaborado um documento que nomeava Virgulino Ferreira da
Silva capitão comissionado dos Batalhões Patrióticos. Tal patente seria
obviamente de caráter provisório e teria a duração da finalidade e da
existência dos referidos Batalhões. Na verdade, a patente era semelhante as que
haviam sido entregues aos demais oficiais comissionados na época assinadas por
Floro, mas como o deputado não estava presente, a mesma teve que ser assinada
por Pedro Uchoa, único funcionário federal presente. Redigida em 5 de março de
1926, foi datada de 12 de março do mesmo ano, assim só teria validade quando o
agora defensor da legalidade estivesse com seus homens longe do Juazeiro
cumprindo a missão assumida, eufórico, mostrando por onde passava o documento
que, para bem da verdade, esteve nas mãos de muitos homens de bem que
confirmariam depois a sua real existência. Louvável a atitude do Padre Cícero
sob todos os aspectos, senão vejamos: Como político, o referido sacerdote foi
prefeito do Juazeiro de 1911 a 1929, com breve período de ausência durante o
Governo Franco Rabelo. Correligionário do presidente Arthur Bernardes, e maior
líder político do Ceará, não poderia deixar de lançar mão de todo e qualquer
recurso necessário ao combate eficiente ao avanço da Coluna Prestes. Como amigo
não poderia deixar de colocar sua assinatura ao lado da de Floro, a pedido
deste, nem na sua ausência deixar de substituí-lo na recepção a Lampião, nem na
concessão da patente por ele prometida. Afinal Lampião nas estradas era uma
ameaça constante para milhares de romeiros que lhe faziam doações de centenas
de contos de réis todos os anos para suas obras de caridade cristã. Existem
estudiosos, no entanto que afirmam que um santo como o Padre Cícero seria
incapaz de tal atitude e afirmam que tudo foi uma brincadeira urdida por
Benjamim Abraão, secretário do Padre Cícero, e Pedro Uchoa para enganar
Lampião. Na verdade ninguém no Juazeiro, por medo de Floro, por respeito ao
Padre Cícero, enfim por termos de uma reação futura do Rei do Cangaço teria
coragem de fazer tal brincadeira de mau gosto. Mas, voltemos ao fio à meada, no
dia seguinte Lampião recebeu dezenas de fuzis do Exército e farta quantidade de
munição, além da indumentária necessária e demais equipamentos indispensáveis a
sua tropa. A tarde concebeu uma demorada entrevista ao médico cratense, Dr.
Otacílio Macedo, irmão do brigadeiro Macedo, e se deixou fotografar com seus
familiares e com seu bando pelo senhores Lauro Cabral de Barbalha e Pedro Maia
do Crato. No dia seguinte, um domingo, deixou a cidade do Padre Cícero rumo a
Pernambuco, passou pelo Caldas em Barbalha, por Jardim e, enfim, entrou na sua
terra natal pelo município de Serrita. Agora acompanhado por quase 100 homens
armados. Em pouco tempo desistiu de perseguir a Coluna Prestes, quando foi
informado que, por uma boca só, todos os oficiais da Polícia pernambucana
afirmava que o atacariam aonde quer que o encontrassem. Inconformado com a
situação, o capitão Virgulino Ferreira atravessou novamente a fronteira para o
Ceará para pedir o apoio do Padre Cícero, às 8 horas da noite do dia 8 de
abril, acompanhado por oito homens e, a cavalo, atravessou o município de
Barbalha em direção a Juazeiro do Norte e só na tarde do dia 10 de abril de
1926 estava de volta. Para a imprensa, o Padre Cícero, que vinha sendo muito
criticado pela recepção ao cangaceiro, afirmou que se recusara a recebê-lo
embora admitisse seus bons propósitos. Para Antônio da Piçarra, Lampião afirmou
que foi recebido pelo Padre Cícero na noite do dia 9 de março de 1926, noite de
muita chuva em que a água dos pequenos riachos encostava na barriga dos
cavalos. O padre que veio de automóvel dissera-lhe que não podia obrigar a
polícia de Pernambuco a aceitar a sua patente e que não podia fazer mais nada;
Floro morrera, os batalhões tinham sido desmobilizados e que a Coluna Prestes
se encontrava em Goiás, que ele deveria dissolver o bando e ir embora para bem
longe, recomeçar a vida e ser feliz e que, se assim não o fizesse, que pelo
menos não mais bulisse com seus romeiros nem com o estado do Ceará. A imprensa
da época noticiou que o bandido voltou furioso para o Pernambuco ameaçando
atacar Barbalha na sua passagem por aquele município, o que não passou de
alarme falso. Quando chegou à terra natal, já estava roubando e sequestrando por resgate.
Voltara a ser
o Rei do Cangaço no Sertão, embora durante o resto da sua vida tenha se
autodenominado Capitão Virgulino Ferreira da Silva. Em toda sua carreira de
cangaceiro, Lampião chegou ao Juazeiro com o Padre Cícero, ao ponto mais
próximo de sua reabilitação: a regeneração do cangaceiro, que teria sido uma
das estrelas mais brilhantes da coroa do venerado sacerdote.
Magérbio de
Lucena médico e escritor, autor do livro “Lampião e o Estado Maior do Cangaço”.
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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