Por Marcos Araújo
Em
meio a essa débâgle social, econômica, politica, moral e educacional
que o Estado do RN atravessa, uma voz ecoou nas redes sociais com a força de
uma bomba Tsar (a superbomba atômica) em defesa da UERN. Com 87 anos de idade e
a autoridade de quem faz da educação o seu sacerdócio diário há mais de 60
anos, Padre Sátiro “gritou” com toda virulência que pode significar letras
em CAIXA ALTA e NEGRITO na internet: “- RESPEITEM A
UERN, AUTORIDADES INSTITUÍDAS!”. Seu “grito” deve ter doído nos ouvidos de
muita gente...
Padre Sátiro Cavalcante Dantas
Em outro momento, acompanhando o desdém da administração estadual para com os
servidores, Pe. Sátiro lastimou “a falta de força física”, por não está “AO
LADO DOS COLEGAS PROFESSORES SOFRENDO ESSA HUMILHAÇÃO”, apelando aos
ex-alunos do Diocesano para exigirem “JUSTIÇA PARA CAUSA DOS SERVIDORES
PÚBLICOS”.
Sendo hoje um dia de domingo, propício para uma reflexão espiritual, a liturgia
bíblica dos cristãos traz uma passagem do Profeta Ezequiel. Em sua profecia,
diz Ezequiel que Deus vai tomar conta das suas “ovelhas” e “resgatá-las de
todos os lugares em que foram dispersadas, num dia de nuvens e escuridão.” E
mais ainda, diz o Senhor Deus: “eu farei justiça entre uma ovelha e outra,
entre carneiros e bodes”. (Ez 34, 11-12, 15-17)
Ezequiel era um Profeta da esperança. Na sua época, ele exortou os israelitas
para saírem do cativeiro babilônico, mesmo sabendo que parte do povo já estava
ambientado com o exílio, admitindo a exploração e o jugo dos tiranos. Ezequiel
se contrapõe e constrói naquela comunidade uma mensagem de revolta (revolução).
Apenas para pontuar historicamente, a Babilônia do tempo de Ezequiel era
marcada pela grave crise social, reinando a violência e a injustiça. Nada
estranho aos dias de hoje.
Se a palavra “profeta” vem do grego “prophetes”, e significa “falar antes”,
Padre Sátiro também é um profeta. E tem sido verazmente um Profeta na
história da UERN e na revolução educacional que ela desencadeou ao longo dos
tempos. Quando eu estava na graduação em Direito, meados dos anos 80, a então
FURRN estava sombreada pela incerteza, ameaçada de extinção. Foi o seu agir
profético, seu protagonismo corajoso que conduziu a extinta Fundação municipal
(idealizada como um redil para uso politico) para a liberdade de uma autarquia
estadual (UERN) fomentadora do saber e agente ativa de transformação social.
Seu prestigio intelectual, sua inatacável condição moral, sua insuspeição de
intenções, sua voz altíssona em defesa da educação, obrigaram ao Parlamento e
ao Poder Executivo do RN em reconhecer a UERN como patrimônio do Estado, isto
em 08 de janeiro de 1987. Para demonstrar que estava ali temporariamente apenas
cumprindo uma missão, no dia seguinte à assinatura da lei, renunciou ao cargo
de Reitor para que o vice, Antonio Capistrano, assumisse.
No ano em que comemoramos os 30 anos de sua estadualização, a história se
repete... As sombras negras da ignorância e do desserviço à educação querem
destruir a UERN. Escaladamente, a instituição vem sofrendo os mais duros e
insensíveis ataques de toda a sua história, oriundos da gestão do Estado, de
forma direta pelo descaso e ignoração na falta de assistência financeira, ou
indiretamente por áulicos desinformados que pregam a sua privatização ou
extinção. Até uma educadora (tsc, tsc, tsc...) natalense pôs-se contra a
instituição.
Não têm a menor noção essa caterva de néscios sobre a importância da educação como
fator de influência para o crescimento econômico e o desenvolvimento humano.
Desconhecem as análises e teorias econômicas de Amartya Kumar Sen e Mahbub ul
Haq, criadores do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), a unidade de medida
desenvolvida para avaliar os países, considerando não apenas os fatores
econômicos, mas também os sociais. Amartya Sen foi professor e Reitor na
Universidade de Cambridge, e professor em Oxford e Harvard. Fundador do
Instituto Mundial de Pesquisa em Economia do Desenvolvimento, provou ele que a
Educação é a maior riqueza de uma nação. Mas, quem é Amartya Sen na frente de
um desses “iluminados” defensores da extinção ou privatização da UERN?
“Formados” exclusivamente no conhecimento rasteiro dos “Gulags” das redes
sociais, não sabem esses “intelectuais da banalidade” que é papel do Estado
conter as desigualdades sociais. E que, os serviços prestados pelo Estado
deveriam garantir a construção de uma boa sociedade por meio da educação, saúde
e proteção das minorias. Ah, esclarecendo: foi exatamente por essa afirmação
que Amartya Sen ganhou o Prêmio Nobel de Economia, em 1998, tendo sido o
primeiro – e até o momento, único – acadêmico de um dos países não
desenvolvidos a ganhar o Prêmio Nobel de Economia.
Para as mulheres (recadinho para a “educadora” natalense), Amartya Sen relata
que a “expectativa de vida ao nascer de mulheres” foi mais influenciada pela
educação do que a “expectativa de vida ao nascer média”, o que indica que a
educação pode ser um importante aliado contra a desigualdade de gêneros. Que
gritem as mulheres: Viva a educação!
A esses “sabe-tudo” das redes sociais que pregam a desoneração financeira do
Estado pela extinção da UERN; aos profusores da ideia da privatização; aos que
entendem a educação como despesa, e não como investimento (até tu, então
Governadora Rosalba?); aos “liberais” defensores do Estado mínimo, e a todos os
demais gênios do pensamento humano que miram a UERN como uma “praga”
devastadora ao orçamento estatal, um conselho: busquem à sua volta os que por
ela foram formados e escutem suas histórias de vida e suas ações em prol da
sociedade.
Já dizia Rui Barbosa que todos os melhoramentos materiais são incapazes de
determinar a riqueza se não partirem da educação, a mais criadora de todas as
forças econômicas, a mais fecunda de todas as medidas financeiras.
Quem foi educado pela UERN - e aqueles que ainda estão em formação - sabe do
seu inestimável valor. O conhecimento adquirido por intermédio do seu
qualificado quadro docente é o “elmo de Mambrino” que os protege na esganiçada
luta da vida profissional. Apenas relembrando, D. Quixote, o cavaleiro andante
de Cervantes, tinha no “elmo de Mambrino” que cobria a sua cabeça a proteção
necessária para as suas batalhas. Sancho Pança, do alto de sua ignorância,
confundiu o elmo com uma “bacia toda amolgada, para fazer sua barba”.
Diante de uma visão tão distorcida, D. Quixote queda-se surpreso com tal
desconcerto, creditando ao fato de que Sancho “vem de andar sempre entre
nós outros uma caterva de encantadores, que todas as nossas coisas invertem, e
as transformam, segundo o seu gosto e a vontade que têm de nos favorecer ou
destruir-nos”.
A UERN tem sido um “ELMO DE MAMBRINO” para as longas caminhadas cientificas,
intelectuais e de conhecimento de muitas gerações de “cavaleiros”. Muitos “D.
Quixotes” têm vestido a carapuça do seu “ELMO” para os diversos combates
sociais. Os de visão distorcidas, os Sanchos Panças da vida, enxergam-na apenas
como uma “bacia”.
Nesses tempos de intolerância, inversão de valores e também de ignorância,
a esperança é necessária. Como ela é vital! Vejam a vitalidade de
Padre Sátiro, aos 87 anos, e o entusiasmo com que ele nos inspira à luta. A
forma altiva com que ele conclama a todos nós a termos uma tomada de posição
contra a injustiça. Poderia nem se manifestar. Seu legado histórico admite
fugir de polêmicas, para não atrair desafetos. Como um bom Profeta,
porém, ele não descansa, nem foge da luta. Talvez tenha por sentimento a frase
do historiador francês Paul Veyne: “Éternité Je Ne m’Ennuierai Pas” (E
na eternidade não me entediarei).
Durante a missa, na homilia de hoje, Padre Charles Lamartine (também educado
pela UERN, a exemplo de Padre Flávio – Vigário-Geral de nossa Diocese),
lembrava o educador Paulo Freire e a sua fala sobre a esperança. Dizia Paulo
Freire que é preciso ter esperança, "mas ter esperança do verbo
esperançar; porque tem gente que tem esperança do verbo esperar. E esperança do
verbo esperar não é esperança, é espera. Esperançar é se levantar, esperançar é
ir atrás, esperançar é construir, esperançar é não desistir! Esperançar é
levar adiante, esperançar é juntar-se com outros para fazer de outro
modo...”.
Alinho-me às fileiras do Profeta Padre Sátiro. Tal como os revolucionários
franceses foram convocados no passado, açulo a todos, em defesa da UERN, “Às
armas, cidadãos!”
VIVA À UERN!
VIVA À EDUCAÇÃO! VIVAS A PADRE SÁTIRO!
MARCOS ARÁUJO,
eterno aluno da UERN, provisoriamente advogado e professor.
Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzaguiano José Romero de Araújo Cardoso
http://blogdomendesemendes.blogspot.com
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