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terça-feira, 23 de janeiro de 2018

A IMPORTÂNCIA DA AGRICULTURA URBANA NA SUPERAÇÃO DA DICOTOMIA RURAL -URBANO

Por Saul Ramos* 

Alexander Vassilievitch Chayanov, Engenheiro Agrônomo, Economista e Sociólogo Russo, em 1920, escreveu um texto de caráter utópico futurista denominado ‘’ Viagem do meu irmão Alexei ao país da utopia camponesa’’. De um modo geral, a história se passa em uma realidade onde a dicotomia urbana x rural não mais existe. Chaynov era um esperançoso do estreitamento dos laços rurais e urbanos, já nessa época, ele detectava indiferenças nessas relações e sonhava com suas superações.

A dicotomia urbano-rural teve origem na divisão social do trabalho que determinou atividades econômicas e formas de análises distintas para esses espaços. Essa separação foi difundida pela Geografia e Sociologia, formando uma análise teórica clássica sobre os espaços. No entanto, essa concepção é obsoleta e falsa. Do ponto de vista das características do território, existe uma diferença, mas isso não significa uma oposição em relação a seus funcionamentos.

Os espaços rurais e urbanos se fundem de forma cada vez mais intensa, formando um novo arranjo social, político e econômico. Isso é percebido no avanço da malha urbana sobre os perímetros rurais e dos novos paradigmas de lazer e descanso. Várias pessoas das cidades procuram cada vez mais áreas rurais para passarem finais de semana ou para realizarem turismo rural, trilhas ecológicas e etc.

Várias pessoas, em inúmeros pequenos municípios, moram em zonas rurais e trabalham na zona urbana, o fenômeno também ocorre ao contrário, várias pessoas moram em cidades, mas trabalham e desenvolvem várias atividades econômicas no campo. Esse fenômeno vem cristalizando um complexo sistema que funciona de forma orgânica e interdependente entre os dois espaços.

Se partirmos do princípio que os dois espaços não se separam apenas se completam, essa dicotomia nociva não faz sentido algum. As cidades necessitam do campo para se alimentar, se vestir, entre outras inúmeras coisas, do mesmo jeito, o campo necessita da cidade para consumir e utilizar diversos produtos produzidos lá. O campo e a cidade se misturam realizando um sistema de trocas, dependência e equilíbrio.

Em meio desse problema, a agricultura urbana (AU) é um exemplo clássico de apoio para a superação dessa dicotomia e do pleno funcionamento do sistema campo/cidade. A prática vem avançando na malha urbana, seja em terrenos ociosos, seja em coberturas de prédios ou até mesmo em pequenas varandas de apartamentos e principalmente nas áreas periurbanas das cidades.

A AU surge como um enorme potencial não só para estreitar esses laços, mas também para transformar as cidades em produtoras de alimentos, gerando mais empregos, renda e sustentabilidade. Nada mais é que a exploração agrícola em pequenas áreas urbanas ou periurbanas com o intuito de superar a carência alimentar e também gerar lucros com a venda dos excedentes.

Essa atividade também traz uma maior sustentabilidade para as cidades deixando-as mais verdes, reaproveitando resíduos urbanos e melhorando o clima. Do ponto de vista econômico, a atividade gera empregos e rendas,se tornando algo importante nos dias de hoje, uma vez que o desemprego cresce cada vez mais nas cidades.

De acordo com os dados da Organização das Nações Unidas (ONU), cerca de 54% da população mundial vivem nas cidades. Essa porcentagem tende a aumentar para 66% até 2050, totalizando 2,5 mil milhões de pessoas(1). Diante desse quadro, novas alternativas precisam ser elaboradas para alcançar sustentabilidade ambiental, empregos e renda nas cidades. Já está mais que claro que as cidades também terão que produzir alimentos para alimentar seus moradores.

A agricultura urbana já é uma realidade em várias cidades importantes em muitos países, contribuindo em diversos aspectos para suas populações. Existem estudos que estimam que a agricultura urbana vem empregando cerca de 800 milhões de pessoas em todo o mundo. Na Ásia, cidades importantes desse continente ganham destaques, Shangai, na China, na capital Vietnamita, Ho Chi Minh, eem Cagayan de Oro nas Filipinas (2).Na África, destacamos países como: Lomé, Tanzânia e Senegal, Namíbia, África do Sul entre outras. Na América Latina, temos  México, Cuba. Argentina e Haiti. A AU vem modificando a vida de milhares de pessoas nestes países, desde o combate a fome ao desemprego, além de promover uma maior integração entre campo e cidade.

O Brasil também tem grande destaque. Cidades como Rio de Janeiro, Belém e Minas Gerais  possuem excelentes iniciativas por parte dos governos municipais e de suas populações. No entanto, um estudo feito em 2006 por uma parceria da FAO, Rede de Intercâmbio de Tecnologias Alternativas (REDE), o Promoção do Desenvolvimento Sostenible, (IPES) e o Ministério do desenvolvimento social (MDS), verificou a presença da AU em 11 regiões metropolitanas; (Belo Horizonte (MG), Curitiba (PR), Porto Alegre (RS), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP), Brasília (DF) e Goiânia (GO),Belém (PA), Fortaleza (CE), Recife (PE) e Salvador (BA). Concluindo assim, que a AU é praticada em todas as regiões do Brasil (3).

A AU é um exemplo mais que concreto da integração campo/cidade, seu avanço vem apenas confirmando ainda mais isso. A produção de alimentos nas cidades não traz apenas uma integração do ponto de vista econômico, também traz um forte laço dos aspectos sociais e culturais do campo e da cidade. A falsa dicotomia entre os dois espaços também gerou estigmas negativos entre seus moradores, muitas pessoas das cidades consideram os camponeses como ‘’atrasados’’, já os camponeses, muitas vezes, costumam tratar as pessoas das cidades com desconfiança. A entrada da agricultura na cidade ajuda a acabar com essas concepções.

Uma quebra do reducionismo clássico da dicotomia urbano/rural é demonstrada em vários fatos publicados em estudos atuais, seriam muitos para descrevê-los aqui. Enfatizamos a AU por ser cada vez mais crescente e por trazer de forma direta a principal atividade econômica do campo que é a agricultura. Com ela, também são apresentados aspectos culturais dos camponeses e suas formas de trabalho, isso vem contribuindo para a quebra dos preconceitos.

É necessário entender  que estamos diante de um novo arranjo social entre campo e cidade, que embora esses espaços preservem suas características próprias, não significa que sejam antagônicos ou um submisso ao outro. Esses espaços se complementam em seus funcionamentos, as novas tendências provam cada vez mais esse fato. A AU é um bom exemplo disso e suas contribuições para a quebra desse reducionismo é enorme.

*Saul Ramos de Oliveira é Engenheiro Agrônomo, e Mestrando em Horticultura Tropical, Ambos pela UFCG.

REFERÊNCIAS

[1] Centro Regional de Informações das Nações Unidas (UNRIC). Relatório da ONU mostra população mundial cada vez mais urbanizada, mais de metade vive em zonas urbanizadas ao que se podem juntar 2,5 mil milhões em 2050. Disponível em:http://www.unric.org/pt/actualidade/31537-relatorio-da-onu-mostra-populacao-mundial-cada-vez-mais-urbanizada-mais-de-metade-vive-em-zonas-urbanizadas-ao-que-se-podem-juntar-25-mil-milhoes-em-2050.

[2] CRIBB, A. Y.
SANDRA LUCIA DE SOUZA PINTO CRIBB, UNIPLI; ANDRE YVES CRIBB, CTAA.Agricultura urbana: alternativa para aliviar a fome e para a educação ambiental.In: CONGRESSO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E SOCIOLOGIA RURAL, 47., 2009, Porto Alegre. Desenvolvimento rural e sistemas agroalimentares: os agronegócios no contexto de integração das nações: anais. Brasília, DF: SOBER, 2009. 1 CD-ROM. Ref. trabalho 359. 2010 

[3] SANTANDREU, Alain ; LOVO, Ivana Cristina. Panorama da agricultura urbana e periurbana no Brasil e diretrizes políticas para sua promoção. Belo Horizonte: FAO/MDS/SESAN/DPSD, 2007.

Enviado pelo professor, escritor, pesquisador do cangaço e gonzagueano José Romero de Araújo Cardoso

http://blogodmendesemendes.blogspot.com

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